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Diz o ditado que quando algo começa errado, continua dando errado até o fim.

Bem... essa é a definição da minha vida!

Uma sucessão interminável de erros.

Filha caçula de uma família com quatro filhos, indesejada e maltratada a vida toda. Não o tipo de abuso físico, mas o descaso e o desamor era algo comum em minha infância. Assim que alcancei uma idade mínima para me manter por conta própria, sai de casa e arrumei emprego como babá. Terminei os estudos aos trancos, pois mal sobrava tempo para estudar. Consegui outros empregos, sempre no mesmo nível subserviente e invisível aos olhos da sociedade. Em um desses empregos fui assediada pelo patrão e escapei por pouco de um estupro, perdi no entanto o emprego e a moradia. Passei momentos bem ruins nessa época, tendo de escolher entre comer ou pagar aluguel em um barraco deplorável.

Isso aos dezenove anos.

Meus pais deram as costas e lavaram as mãos no momento em que me consideraram "grande o suficiente" para me virar, meus irmãos mais velhos não se importavam com nada além de si mesmos. O apuro com o ex patrão me deixou desconfiada e assustada com relação ao sexo oposto, assim mantive longe dos garotos até bem mais tarde.

Quisera eu ter permanecido assim!

Tive dois namorados e tudo o'que trago desses relacionamentos é dor e mágoa. O primeiro insistiu até conseguir me levar para cama, com palavras bonitas e promessas de amor. O'Que não percebi na época, foi o fato de nunca sairmos juntos com outras pessoas, ou ser apresentada como namorada ou conhecer seus pais e amigos. Foi somente depois de ter cedido aos apelos dele e ao meu próprio desejo e curiosidade, que me mostrou a verdadeira face. Foi horrível em todos os sentidos, eu não estava pronta, ele não teve paciência e acabou sendo doloroso e humilhante. Por fim tive de ouvi-lo dizer que eu era a pior "foda" da vida dele e que não se arrependia por ter me mantido em segredo de todos pois além de ruim de cama, era uma gorda carente e ridícula louca por um pau.

Muitos anos se passaram depois disso e então o desastre número dois surgiu. Trabalhamos juntos e nos tornamos amigos, tudo aconteceu naturalmente e foi bom no início. Me apaixonei perdidamente por ele e decidimos morar juntos. Estávamos juntos a quase um ano quando o flagrei com outra em nosso apartamento. E mais uma vez ouvi palavras duras e cruéis de alguém em quem confiei. "Estou te fazendo um favor! Quem vai querer uma gorda desleixada como você?"

Decidi permanecer sozinha desde então, e tem sido assim nos últimos oito anos. Mesmo me sentindo solitária as vezes, prefiro não me arriscar novamente. Não levei a sério as palavras terríveis que ouvi, embora tenham me magoado profundamente. Sei quem e oque sou, e sou mais do que apenas um corpo!

Se as pessoas não são capazes de enxergar além do aspecto físico, sinto por elas. Mas não posso mutilar meu corpo e alma tentando caber em um molde imposto pela indústria da moda e pela sociedade alienada, que só enxerga o preto e o branco. Eu, como acontece com a maioria das pessoas, estou nos tons de cinza!

Ao longo da minha vida simples, aprendi a me virar e a me amar em primeiro lugar. Me cuidei, faço academia e me alimento bem, encontrei um nicho na moda onde encontro roupas de bom gosto e caimento perfeito, assim não preciso me vestir em sacos de batata disforme ou que salientam atributos dispensáveis. Com trinta e oito anos, um metro e sessenta e um corpo voluptuoso, considerado por alguns excessivo, estou de bem comigo e com o mundo. Trabalho com o'que gosto e tenho poucos mais fiéis amigos.

Oque uma garota como eu pode querer da vida?

No momento o'que mais quero é que a empresa de turismo com a qual estou tentando fechar um contrato, colabore e resolva os pepinos que parece brotar a cada nova etapa!

LUZ E ESCURIDÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora