Despertares Tardios

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"Amo os que sorriem perante as dificuldades, que arranjam forças no desespero e se tornam mais fortes com a reflexão. É próprio das mentes pequenas encolher mas aqueles cujo coração é forte e cuja consciência se mantém limpa, manterão os seus princípios até à morte."

Leonardo da Vinci 


-   Por favor Teresa, deixe-se de dramas! Por acaso pensa ir trabalhar nesta altura da sua vida?

- Por que razão teria que ir trabalhar? - o olhar horrorizado de Teresa provoca um riso abafado em Alice que a olha com desdém.

 - Bem me parecia que a menina não iria querer ter essa estafa. - com uma mão escanzelada, Alice afasta as recusas de Teresa como se fossem insectos invisíveis.

- Francamente mãe...

 - Não me chame mãe, por tudo quanto é sagrado! - o tom de voz de Alice nunca se eleva ou agudiza, a não ser quando Teresa lhe chama mãe. - Já chega de lamúrias Teresa. A menina tem de ir a esta reunião sem mais reclamações. Vamos ambas e resolvemos este assunto de uma vez por todas!

 - De uma vez por todas como? Diga-me? Ele nunca vai ficar satisfeito! Nunca! - o tom de voz de Teresa vai-se erguendo à medida que o desespero toma conta dela. Leva os dedos indicadores às fontes, numa tentativa desesperada de acalmar os nervos, sem qualquer efeito. Alice esboça um sorriso amarelo, quase um esgar de desprezo - 

 - A menina sempre foi muito fraca... - o tom destila um veneno que corrói os nervos de Teresa. - Vê-se bem que sai ao seu pai... - o olhar acusatório atravessa Teresa como uma lâmina afiada e rasga-lhe a alma até ao nó na garganta que traz sempre que fala com a mãe.

 - Nunca fui o suficiente para si, não é?

 - Que quer que lhe diga? - o meio sorriso deixa adivinhar o tamanho do desprezo de Alice pela filha. - que esperava uma filha a quem tenho de acudir como a uma criança, a vida toda? Uma filha que não sabe valer-se sozinha? Sabe quem tomou conta de mim? EU! - os olhos escancarados revelam bem o tamanho da fúria de Alice e a incapacidade em controlar-se provocam nela uma fúria maior ainda. - Não suporto pessoas fracas, ainda menos quando são sangue do meu sangue - cospe as palavras como se todo o seu corpo as rejeitasse e o facto de as sentir a deixasse doente.

 - Por favor... nunca ganho consigo, pois não? - o nó na garganta não deixa a voz sair com clareza o que lhe dá um ar ainda mais fraco.

 - Saia da minha casa. Agora Teresa, saia! Nem sequer consigo olhar para si - Alice vira costas e deixa-a sozinha no salão onde tantas vezes o pai lhe tinha mostrado os retratos da família pendurados nas paredes agora despidas. Teresa mal consegue controlar o sentimento misto de raiva e perda... se ao menos tivesse ali o pai.

 - Ah e Teresa... - Alice volta atrás evitando olhá-la - não se esqueça do nosso compromisso amanhã. Não admito atrasos ou falhas. Tente mostrar a sua melhor cara sim? - bufando um riso de escárnio, Alice vira costas novamente e sai fechando a porta.

   Uma lágrima corre lenta pelo rosto de Teresa e ela nem tenta limpá-la. O caudal corre solto no seu peito e ela apressa-se a sair da mansão onde cresceu para que nem as paredes a vejam chorar.

                                                                                   ****


       - Não entendo a mania da mãe em querer que eu me entenda com aquele homem Beatriz, juro que me ultrapassa. Se não fosse minha mãe acreditaria que o faz apenas para me torturar.

Uma vida a tintaOnde histórias criam vida. Descubra agora