Das despedidas

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              A minha chegada ao palacete foi preparada ao pormenor. Pelos visto Artur tinha planeado tudo com antecedência. Provavelmente não esperava encontrar Bones na minha casa, deve ter sido um bónus. A ideia de ter sido a responsável pela morte do homem que tinha salvo a minha vida dá-me vómitos e corro para a casa de banho do quarto que tinha sido sempre o meu.

          Mal consigo levantar a tampa  e vomito tudo o que Bones me tinha obrigado a comer. A memória dele faz-me deitar fora todo o resto e não consigo travar os soluços e a dor que me envolve como um cobertor pesado. Devia ter aproveitado mais, aproveitado melhor. O meu pai... abandonei-o, sim, essa é a palavra certa. Deixei-o sozinho tanto tempo para agradar... a quem? 

        E o Bones? Oh meu Deus, todo o tempo desperdiçado porque me sentia ridícula ao lado dele. Mais velha... mais... Pensava só nas mulheres que deviam querer estar com ele, muito mais novas, mais bonitas, mais... tudo mais. E ele só queria estar comigo e tratar-me por princesa e fazer-me sentir todas as coisas que nunca senti antes...

       -   Menina, está bem?

A voz faz-me sobressaltar. Não me podem ver assim, não aqui.

       -   Estou bem Maria, obrigada - tento que a voz soe o mais normal possível.

      -   Lamento pela sua mãe menina e... pelo seu paizinho. Tinha tanto apreço por ele, pobre senhor. Sempre tão atencioso com todos, tão educado e...

      -    Maria, por favor - estou no limite, não consigo manter a voz firme por muito mais tempo se ela continuar a falar do meu pai - vá descansar, já é tarde.

      -  A menina devia ir também. O sr. Artur mandou que tomássemos conta da menina. Ali está um bom home...

       -   Maria! - não consigo evitar o tom irritado - vá-se deitar, já lhe disse. - respiro fundo fechando os olhos. Depois num tom mais calmo - por favor. Preciso ficar só.

       -   Claro menina, compreendo. Desculpe incomodar mas sabe bem o apreço que tenho por si.

       -   Sei Maria, sei sim. Obrigada e até amanhã.

Sei que a minha voz está a sair quebrada e a última coisa que quero é que nesta casa tenham o mínimo de informação a dar à minha mãe ou ao Artur. Mas o meu pai ensinou-me a ser gentil com todos e agora, neste preciso momento, em que preciso fazer-lhe uma última homenagem, vou fazer isso mesmo.

       -   Até amanhã menina. Por favor vá descansar. Amanhã será outro dia, vai ver que tudo lhe vai parecer melhor de manhã.

Não não vai Maria... não, não vai.

******

      -    Teresa? Hello?

      -   Sim Robert... como está? - não sei porque atendi o telemóvel... apetece-me tudo menos falar com seja quem for.

       -   Yes, are you alright? I never heard from you again since that day...

       -   Eu sei, desculpe Robert... eu...

       -   Do you mind... posso ir ver-te?

       -  Não Robert, hoje não... - não consigo impedir as lágrimas de cair e a voz quebrada trai-me.

      -   What happened? I'm going over...

      -   Não Robert, não pode. Não estou em casa.

Uma vida a tintaOnde histórias criam vida. Descubra agora