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— Meio dia. Acha que o Junior está lembrando de fazer o bife do Eddie mal passado na manteiga como ele gosta? — Steve volta a encarar o relógio, como se durante sua frase a hora pudesse ter mudado. — Devíamos ter trazido ele.
— O Junior? — Repouso a cabeça no encosto da poltrona e o encaro.
— O Eddie! — Suas costas se desprendem da cadeira, ele escancara os olhos e balança as palmas das mãos no ar. — Você tá ouvindo o que eu tô dizendo?!
Me parece um excelente momento para pausar o filme e retirar os fones.
— Meu amor. — Seguro sua mão dentro das minhas, compreensivamente, como um hambúrguer envolvido por duas fatias de pão. Olho dentro dos seus olhos. — Como eu posso te dizer isso... foi você quem decidiu não trazer o Eddie!
Ele recua o tronco, jogando as espáduas para trás. Os olhos me examinam cerrados, um semblante de quem foi insultado. Não deixo de reparar como fica lindo com as nuvens da janela do avião lhe servindo de plano de fundo.
Ele levanta o indicador livre na altura dos ombros. E lá vamos nós...
— Não disse que não queria trazê-lo. Eu disse que não queria trazer ele no compartimento de cargas, como se ele fosse uma mala, nesse avião.
— Nesse avião?! — A conversa se torna um pouco hilária. — E em que outro meio de transporte chegaríamos em Los Angeles? No Camaro?!
— Podíamos... ter pego um avião particular? Eu posso pilotar um avião!
Preciso reiterar. A conversa se torna um pouco hilária.
— Onde? No hangar cheio de aeronaves no quintal de casa?!
— Frank... — Ele dá de ombros. — Talvez...
Eu estava errado. A conversa havia se tornado excepcionalmente hilária.
— Acha que eu ia botar os meus filhos numa Tangerina?!
Ele morde a língua e revira os globos oculares ponderando.
— Okay... eu também não concordaria com isso. Só estou...
— Surtando por que o avião está no ar e você não tem o volante nas mãos?!
— O nome correto é manche. Saberia disso se estivéssemos na cabine.
Faço minha bela carinha de obrigado por confirmar o que eu disse.
— Não estou surtando com isso. Só estou... preocupado com o Eddie.
— Você é encantador, mas o Eddie está bem. Eu pedi à Tani que ficasse de olho em todos os post-its que você colou na geladeira.
— Oh, você pediu?! — Steve me olhou com as sobrancelhas caídas e um biquinho comovido. — Será que... você quer se casar comigo?
— Estou tendo um pequeno deja-vu por aqui. — Exibo minha aliança.
Ele rouba minha mão no ar, segura dentro da sua, apoiada no braço da poltrona e beija meu anelar direito, bem acima da prata da aliança de noivado.
— Eu te amo, Danno. Mesmo há onze mil metros do chão eu te amo.
Sei que estou sorrindo feito um idiota, e preciso mudar de assunto antes que resolva agarrá-lo há onze mil metros de qualquer lugar onde haja privacidade.
— Eu te amo também. — Quebro a conexão visual para verificar as crianças nas poltronas paralelas a nossa, do outro lado do corredor. Charlie está na cadeira mais próxima e Grace, ao seu lado, debruçada na janela. Ambos submersos em algo virtual, polegares nas telas e fones nos ouvidos. — Eles estavam exatamente assim há uma hora atrás. O que deve ser tão interessante?
Steve suspende a cabeça para enxergá-los, depois de mim e do corredor. Ele dá um sorrisinho amável e limpa a garganta como um diplomata.
— Charlie está jogando Super Mario Odyssey no seu novo Nintendo Switch, ele está tentando passar para um novo reino desde ontem. Grace está ouvindo, de novo, a trilha sonora de Hamilton. Você sabe, aquele musical que ela adora.
Por um segundo acho que Steve está supondo. Então... Uau! Ele não está.
— Como sabe de tudo isso? — Tento não parecer tão impressionado.
Ele dá de ombros.
— Sabe por que eu não queria pilotar o avião?
— Pra assistir Pitch Perfect 3 comigo?!
Arranco um sorriso estonteante e uma negativa com a cabeça. Sua mão viaja até o meu rosto, seus dedos alcançam meu pescoço, ele esfrega o polegar na minha bochecha.
— Porque eu não poderia fazer isso.
Seus lábios se entrelaçam aos meus carinhosamente.
...
— Ô... Steve?! — Me encolho no banco de trás do carro amarelo e dou um leve puxão no ombro de sua camisa, bem na junta de costura em relevo.
— Oi, Amor. — Ele torce o pescoço, sentado no banco do carona e vejo seu rosto em perfil, o olhar se esticando até mim no cantinho do táxi.
— Não acha que a gente deveria ter avisado que vinha?
Grace me olha de soslaio da outra ponta do banco de trás. Um olhar bem claro que diz vocês juram que não fizeram isso antes? Mas ela não fala nada. Charlie está debruçado em seu colo, e ela não acordaria o irmão sem motivo.
— Danny. — Responde Steve no seu tom de controle absoluto da situação. — Ela vai estar em casa.
Espalmo as pontas dos dedos e acato, repousando o corpo no banco. Às vezes, Steve é otimista até demais, como “tudo bem, a chuva vai parar exatamente quando a gente precisar do céu limpo” e eu só digo Uhum.
Mas ai a chuva não para. E o “a chuva vai parar” se transforma em “vai ser bom ficar em casa debaixo das cobertas”. Eu não nego que durante esse processo de aceitação constante penso em esganá-lo, mas no fim amo a forma como ele não quer perder tempo criando rugas desnecessárias no rosto.
Acho que oito horas naquele brinquedo de metal gigante mexeram com minha cabeça, porque não consigo simplesmente deixar aquilo pra lá. Desgrudo as costas do banco, de novo. O taxista, um homem de bigode espesso daqueles que devem ser penteados toda manhã e olhar de peixe morto, me encara pelo retrovisor. Um dos lados da boca pinçado para cima.
Puxo a camisa de Steve de novo. Ouço o ar escapando por sua boca.
— Como você pode ter certeza? E se ela foi ao mercado ou cinema?!
— Meu amor. — Ele junta as mãos num suplício exagerado. — Dá pra confiar em mim? — Pergunta entre dentes com o rosto contra o vidro.
— Mas como você pode ter certeza? O nosso airbnb fica pro outro lado!
— Eu... — Sua língua força a bochecha pra fora. Steve coça a barba.
Não preciso de mais nada.
— Eu não acredito nisso. — Cruzo os braços e recebo outra olhada feia do motorista. — Você... rastreou a sua irmã? Ela é sua irmã, meu Deus do céu!
Charlie resmunga dormindo e mexe a cabeça para os lados. Grace me olha em reprovação. O taxista me olha em reprovação. Steve nem sequer me olha.
— Eu disse pra confiar em mim. — Ele fecha os olhos e deita a cabeça.
O silêncio se esparrama como um gato entediado com pernas pra todo lado.
Limpo a garganta. Desgrudo as costas do banco outra vez e sussurro:
— E se ela estiver... acompanhada?
Steve se vira pela primeira vez, como se eu tivesse cometido um crime.
— É a Mary! Ela vai estar sozinha.
Vejo ele balançar a cabeça, ainda desaprovando o que eu disse. Grace coloca o segundo fone no ouvido e fecha os olhos, recostando na cabeça de Charlie.
Quando estou encarando Los Angeles e o sol que se transforma de ardente para rebaixado, como uma esfera se desmanchado contra a linha do horizonte, ouço o homem cochichar sob seu bigode peludo:
— A minha esposa é igualzinha!
Steve tamborila os dedos no banco do carro, e sorri realizado contra o vidro.
...
Era literalmente uma casinha de cerca branca até a altura da cintura. Uma trilha de seixo natural de três metros de chão até a porta cinza níquel da entrada, esquadrias brancas assim como nas duas janelas simétricas e na moldura da claraboia do sótão, exatamente alguns palmos acima do pequeno alpendre da entrada, e abaixo do cume do telhado em forma de ponta de seta. A tinta da parede era de um tom de azul que tendia pro violeta, havia duas cadeiras de praia ao lado do caminho de pedras e muitas folhas e flores.
Se me mostrassem todas as entradas de casas de Los Angeles, eu juro que escolheria exatamente essa e diria “okay, a Mary McGarrett mora nessa casa!”. Se a Allie Hamilton tinha uma casa feita pra ela, Mary também haveria de ter.
O taxista soprou “boa sorte” para Steve e arrancou o carro, como se eu fosse um monstro, que estava esperando ele partir para devorar meu noivo. Steve acomodou as malas escoradas nas cadeiras de praia. Eu achei que deveria enrolar um pouco o passo e lhes dar privacidade, então fiquei olhando tudo acontecer de longe, escorado nas madeiras brancas da cerca ao lado de Grace, que ainda ouvia a trilha do tal musical que Steve mencionou, e Charlie, havia despertado no mesmo momento em que viu um balanço de pneu no quintal. Eu o segurei perto de mim, e ficamos os três amontoados. Steve bateu na porta.
Mary é exatamente o tipo de pessoa que pensa que as batidas são da casa ao lado e não vai até lá conferir. Por isso, meu estômago teve bastante tempo para se revirar, assim como meus olhos. Na terceira tentativa, ela abriu a porta.
— Oh meu Deus! — Vi um sorriso passar voando pelo rosto dela, que logo deu espaço para uma expressão de quem viu um fantasma. — Quem morreu?
Enfiei o rosto na palma da minha mão. Só podia ver as costas de Steve, mas sabia exatamente a cara pateta e desapontada que ele estava fazendo. Vi ele trocar o pé de apoio e tentar uma segunda vez.
— Ninguém morreu! Não vai me dar um abraço? — Ele separa os braços e vejo as bochechas sendo empurradas por covinhas, então ele está sorrindo, e eu acabo sorrindo junto como se não fosse uma decisão.
— Oh... — Ela reflete. — Oi Maninho! Oi ruguinhas novas, oi cabelos brancos! — Mary toca o rosto de Steve com a ponta do dedo, como se quisesse saber se ele é de verdade. Então se joga em seus braços. — Você tá morrendo?
Sorrio outra vez e é aí que ela estreita os olhos e percebe que estou ali.
— Ninguém tá morrendo, Mary. — Steve a abraça de uma vez.
— Hey, Danny?! — Ela grita, e vejo Steve se encolher pelo grito.
— Oi, Mary! — É minha chance de me aproximar no tempo certo.
Caminho até a porta como se estivesse indo até a entrevista do meu primeiro emprego. De repente quero que Mary me ame e preciso de sua aprovação. Bom, talvez eu esteja mesmo contratado porque ela se joga em meus braços sem nem mesmo contar todas as minhas novas rugas. Gosto do abraço de Mary. Gosto de Mary em si. Ela é autenticamente Mary. Ela sorri quando quer sorrir, e se precisar virar o rosto, ela também vira. É o tipo de pessoa que parece ter sua própria lua pairando sobre sua cabeça, e eu gosto da luz daquele luar.
Ela me abraça, então percebe as crianças e as abraça com mesmo afinco.
— Meu Deus! Vocês estão mais altos que eu, isso não é nada justo! — Eles a abraçam também, porque é impossível não querer um pouco daquela lua.
Quando a distribuição de abraços acaba e Mary nos encara pronta para entender o que está acontecendo, uma sexta voz surge de dentro da casa.
— Mary? Eram os livros que você encomendou?
No meio da frase ele já havia nos visto e percebido que dois homens adultos com crianças e malas não fazem entregas de livros. Mas a frase saiu mesmo assim. Da voz mansa de um homem cujos traços me faziam pensar na Índia. Ele era charmoso, moreno claro, cabelos medianos que faziam ondulações breves no caminho e seu nariz de ponte reta era levemente empinado. Talvez ele fosse um pouquinho estrábico, ou talvez fosse só a intensidade de seu olhar.
De toda forma, troquei um olhar com Steve e sibilei baixo: — Eu disse.
— Jordan, esse é o meu irmão, Steve. E esse é o Danny. Aqueles são os filhos do Danny, que até ontem eram desse tamanho aqui. — Ela traça uma reta no alto da cintura. — Essa é a Grace, e esse, o Charlie.
Tem algo no “Jordan, esse é o meu irmão, Steve” que deixa o ar meio denso. Como se Mary precisasse da aprovação do Steve sobre o Jordan também.
— Oi! — Ele responde meio desesperado. — Que bom conhecer vocês! Já ouvi falar muito sobre todos! Tudo bem? Seus filhos são encantadores.
Oh! Eu gosto do Jordan. Ele tem cheiro de incenso e parece que o cabelo não vê um pente há um bom tempo, mas é gentil e seu abraço é apertado.
— Quem você disse que ele é mesmo? — Steve pergunta e então sorri, tentando não parecer um total desastre. Eu o dou uma leve cotovelada.
— Ah, o Jordan é o... babá da Joan e... também meu amigo. Vamos entrar?
— Mary. — Steve a chama e eu sei bem pra quê. Combinamos de dar logo a notícia assim que chegássemos. Talvez entrar rapidinho e ir para o airbnb.
— Vocês vão entrar, não vão?!
Steve me olha e eu assinto com a cabeça.
— Sim, mas primeiro... Eu vim até aqui pra te dar uma notícia. — A voz de Steve sai aos tropeços, e percebo o quanto esse momento é importante pra ele.
— O que houve, Maninho? — Ela também percebe.
— Bom... a família McGarrett... vai aumentar! — Ele vibra com os braços.
Mary estreita os olhos.
— Quem foi a pobre coitada que você engravidou?! — Ela pergunta brava.
Eu engulo um risinho seco, tenho que tapar a boca para não gargalhar.
— O quê?! Por que acha que engravidei alguém?!!
— Ué... você disse que a família ia aumentar!
— Porque eu vou me casar.
— A gente vai casar. — Sinto que preciso acrescentar isso.
— Todo mundo vai casar?!!! Tipo... uma cerimônia dupla?
Engulo em seco. Ela deu a deixa pro Steve sair do armário a vida toda, mas quando ele tentar sair, ela fica tão perplexa que não consegue entender.
Mas Jordan entendeu. E ele deixa uma breve cutucada no braço dela.
Seguro a mão de Steve. A dele na frente, a minha atrás. Dedos entrelaçados.
— Nós vamos nos casar. Um casamento só. Um com o outro. — Diz Steve.
— Oh. Meu. Deus. — Ela fica surpresa, mas tudo se transforma num sorriso tão gigante que seus olhos parecem que vão saltar do rosto e ela nos abraça. Um braço em torno de Steve e o outro ao meu redor. Um abraço triplo. — Oh meu Deus! Vocês demoraram tanto pra se assumir que eu já havia desistido!
— Não podem julgar a tia Mary! — Diz Grace, dando de ombros.
Charlie dá uma risadinha fofa, que faz Steve bagunçar seus cabelos.
— Ai meu Deus, isso é tão fofo que eu acho que estão me gozando!
Steve me olha daquele jeito lento, o olhar caindo dos meus olhos até a minha boca. E por Deus! Ele me puxa pelo rosto e me beija bem ali. De boca aberta.
— Agora podemos entrar? — Ele pergunta. Eu cambaleio sem fôlego.
Mary tem duas amêndoas brilhantes imensas no lugar dos olhos.
— Podem! Vocês nunca foram tão bem vindos na minha casa. Entrem, casal!
...
— Joan! Meu Deus! Você cresceu muito... vem dar um abraço no seu tio!
Joan está para completar sete anos. Seu rosto ainda me parece o de um bebê. Olhos azuis escuros bem redondos, o mesmo narizinho achatado, um sorriso bondoso nos lábios, bochechas salientes e cabelos loiros partidos no meio, separados por duas chuquinhas que caem sobre seus ombros.
— Tio Steve! Eu estava com saudades! Tio Danny! Você também veio!
— Eu vim, Princesa! — Ela me dá um abraço apertado bem McGarrett. — E trouxe algumas pessoas muito especiais pra você conhecer!
— Gente, sinto muito interromper, mas está na minha hora! — Diz Jordan.
Ele e Mary se abraçam, ela lhe dá um beijo “social” na bochecha. Steve me olha com sua expressão intrigada de “você também viu isso?” e sim, eu vi. Mary o leva até a porta, enquanto Steve e eu apresentamos as crianças.
— Joan. — Diz Mary nos guiando até a mesa. — Por que não mostra ao Charlie os vagalumes que moram na sua janela, hein?
Joan adora aquela ideia e assim as crianças saem da sala.
— Grace, vá ver os vagalumes também. — Peço com um sorriso, porque sei que ela quer me matar nesse momento. Mas ela os segue mesmo assim.
— Então! — Mary parece que engoliu uma garrafa inteirinha de café. — Me contem tudo. Como aconteceu? Meu Deus... ainda não acredito nisso.
Mary coloca os cotovelos sobre a mesa e segura o rosto, sonhadora.
— A versão resumida é que eu sou um idiota por demorar tanto tempo. — Diz Steve segurando minha mão sobre a mesa.
— Eu tenho que concordar com ele. — Faço carinho nas costas de sua mão com meu polegar. Mary suspira. — Mas e o Jordan, hein?
Os olhos de Mary brilham. Ela cruza os dedos e fica repentinamente, séria.
— O Jordan é o ponto. O motivo que pedi para as crianças saírem.
O tom de mistério é tamanho que Mary nos guia até o sofá da sala, mais reservada e intimista que a mesa larga da cozinha.
— E eu achei que ela ia responder um “o que tem o Jordan?”. — Respondo.
— Ela não, mas eu sim. O que tem o Jordan? — Pergunta Steve.
— Tem algo de errado com ele. Vocês precisam investigar.
— Defina “algo errado”.
Mary parece concentrada, seus olhos viajam pela sala. Ela nos encara como se fosse uma reunião corporativa com café e papéis separados em blocos.
— Então... Eu o conheci no lar de idosos onde estou trabalhando. Eu devia ser apenas uma secretária, mas as pessoas ali... elas são tão solitárias que eu me envolvo, sabe? E ele aparece a cada quinze dias para uma terapia ocupacional com telas para pintura e materiais de artesanato. Ele nem mesmo pode usar tinta a óleo, diz que alguns elementos da composição podem desencadear problemas respiratórios. E o salário é uma miséria, mas ele faz do mesmo jeito. Se importa com eles! — Um sorriso surge em seu rosto. — E ele é gentil. Oh meu Deus, como ele é gentil! Atencioso. Ele sabe cozinhar, eu já mencionei isso? E que ele é artista plástico? É claro que são quadros e ninguém nesse século compra quadros, mas ele pinta e isso é muito legal. Eu até comprei um. Enfim, ele precisa de grana, então eu o contratei como babá e a Joan adora ele!
Steve me envia outro daqueles olhares sugestivos. Eu tomo a frente.
— Então, basicamente, você quer que nós o investiguemos porque ele é muito gentil, charmoso e se importa com os velhinhos?!
— Hey! Ela nunca disse charmoso! — O olhar de Steve se torna acusador.
— Tem razão. Mas convenhamos, ele é charmoso. — Respondo sem pensar.
— Ele só está sendo realista, Maninho. — Mary concorda comigo, mas Steve insiste com os olhos acusadores. — Danny, você está encrencado.
— Bom. — Steve limpa a garganta. — Ele pode ser o que vocês dois acham, mas não é um suspeito. Não podemos investigar um cara por ser gentil.
Mary recorre o olhar suplicante a mim.
— Danny... você não pode nem mesmo... rastrear o telefone dele?!
— Por que querem rastrear todo mundo?! Vocês são irmãos mesmo, sabia? — Comento, me levantando para ir adular meu noivo antes que ele cancele o casamento. — Por que faríamos isso? Você acha que ele... tem outra?
— Não. Nós nem... estamos juntos. — Ela desvia os olhos para longe.
— Mas estiveram? — Pergunta Steve, enquanto paro de pé atrás do sofá onde ele está, curvo meu corpo e deixo os braços se enrolarem em seu ombro.
— Uma vez. — Mary responde. — Talvez duas, ou três. Isso importa?
— Não vamos investigar seu namorado, Mary. — Conclui Steve.
— Desculpa, cunhada. Eu amo você, mas não posso investigar um civil sem causa provável ou motivo ou qualquer indício de comportamento ilícito.
— Agora sim você falou como um profissional. “Charmoso” não é algo que deve ser estudado na academia de polícia. — Resmunga Steve.
Mary revira os olhos. — Maninho, não faça isso.
— É, meu amor, você está se preocupando à toa. — Encaixo meu rosto em seu ombro, ele tenta me ignorar. Deixo um beijo em seu rosto, ele hesita, deixo outro em seu pescoço e espero sua boca vir até mim.
— Ou faça isso. — Comenta Mary, percebendo que caí na chantagem barata dele. Eu sempre caio, Mary. Sempre.
— Estou? Por que? — Ele me pergunta, os lábios cercam os meus.
— Porque sou louco por você. — Digo, e ele sorri contra minha boca.
— Então. — Mary limpa a garganta. — E o Jordan? Vamos rastreá-lo?
— Não, Mary. Mas eu quero um copo d’água. Por favor, Maninha?  — Responde Steve, me mantendo pendurado em seu pescoço.
— Uhun, eu sei bem o que você quer.
Mas ela sai para buscar o tal copo d’água. E Steve inclina a cabeça para trás e envolve os lábios entre os meus, a língua toca minha boca e eu me desmonto.
— Não faz isso comigo aqui... — Sussurro.
— O quê? Eu não fiz nada. — Ele me devolve. E eu sei que mereço.
Steve se levanta e me beija pra valer, seus dedos em meu pescoço.
— Steven! Aqui não... — Digo, mas deixo e quero tudo o que ele quer.
— Aqui a sua água. — Mary nos interrompe com um sorrisinho no rosto.
Steve recebe o copo, e me abraça por trás, mantendo meu corpo na frente do seu por motivos que eu conheço bem.
— Obrigado, Mary. Vamos? — Ele me pergunta, sendo indiscreto.
— Sim... — Sorrio, enxugando o contorno do meu lábio.
— Maninha, o voo foi longo e cansativo. Mas temos a semana inteira pra você. Vamos pro airbnb e amanhã marcamos algo, pode ser?
— Okay, casal. Feliz lua de mel! — Ela nos encara com o olhar pretensioso.
— O quê? — Pergunto entre risos, com Steve me laçando pela cintura.
— Sempre soube que vocês eram colegas de surfe.
...
— Certo. Isso é uma democracia. Então vamos votar. Pizza ou... outra coisa.
— Que outra coisa, Danno? — Pergunta Grace, afundada no sofá da sala.
— Se a maioria não quiser pizza, a gente pensa nisso. — Respondo.
— Vejam, crianças. Isso é um homem que leva a sério sua comida.
— É verdade, Amor. É bom você saber disso antes de se casar comigo.
— Esperem! Eu volto agora. — Gritou Charlie correndo até o quarto.
— Como se eu tivesse te conhecido ontem. Sei até no que vai votar.
— No que eu vou votar?
— Pizza.
— Não ia votar em pizza. — Dou de ombros. Steve revira os olhos.
Charlie volta derrapando o all star pela sala, Steve o apara no sofá e o coloca em seu colo. Charlie tem uma prancheta e uma caneta em mãos.
— Vamos começar. O meu voto vai pra pizza. — Diz Charlie. Ele desenha uma tabela dupla no papel. Pizza x Outra Coisa. Pizza ganha um tracinho.
— Pizza. — Diz Grace com um semblante adolescente. — Já sabemos onde isso vai dar. — Ela resmunga e joga as pernas no braço do largo sofá.
— Bom, são três votos para Pizza. E então, meu amor? Pronto pra não votar em pizza? — Steve estica o braço em minha direção e belisca minha bochecha.
Charlie e Grace soltam risadinhas.
— Três votos unânimes. Não preciso votar. — Replico irresoluto.
— Eu vou tomar um banho, peçam logo a pizza. Amo vocês. — Diz Grace.
— Tá bom, Amor. — Responde Steve.
— Não acabe com toda a água do planeta, querida!
— O meu banho é mais rápido que o seu. — Ela responde já a caminho.
— Danno, tio Steve, posso tomar banho no quarto de vocês?
Steve me olha, aguardando uma resposta. Assinto com a cabeça.
— Pode, Campeão. Quer ajuda pra encontrar tudo naquela super mala?
— Nah, tudo bem. se eu não encontrar chamo você. Obrigado, tio Steve!
Charlie sai da sala na direção do nosso quarto. Salto para o lugar de Charlie, grudado em Steve. O airbnb faz a gente se sentir dentro de um filme. As janelas são imensas, os sofás parecem camas, a água das torneiras é aquecida, os quartos são espaçosos e confortáveis e a varanda tem uma linda vista pro mar.
Me sento entre o braço do sofá e Steve, de lado deito as pernas em seu colo. Ele debruça o corpo em minha direção, meus braços se penduram em seu pescoço como um bicho preguiça se agarra no tronco de uma árvore.
— Não precisa olhar pra mim.
Ele cerra os olhos.
— Não olhar pra você?! Olhar pra você é a melhor parte da minha vida.
Eu tenho que selar nossos lábios quando ele faz isso.
— Você entendeu. O Charlie fez uma pergunta, você olhou pra mim.
— Tem razão, eu entendi. Mas... você é o pai, e eu respeito você.
— Eu sei, mas você não é só o tio preferido. Você vai ser o... padrasto deles.
— Oh... essa palavra é um pouco assustadora.
— Tem razão. — Solto uma risada breve, ele se espicha e beija minha boca. — Quando a Grace era pequena, comprei um livro enorme pra ela. Contos de fadas e histórias pra dormir. Não tive coragem de ler o livro pra ela, Steve. Quando cheguei em casa e folheei, até eu teria pesadelos com ele.
— Você é um bom pai, Danno. Isso faz mais diferença do que parece.
— É? — Pondero com a cabeça e meus olhos encontram seus lábios. Eu faço isso há tanto tempo que nem percebia o quanto ficava tentado a beijá-lo, o quanto ficar encarando as rugas verticais do seu lábio não era coisa de amigos.
Steve roça o nariz no meu e me entrega o beijo que pedi com os olhos.
— É sim. Mas essa sua boquinha é tão gostosa que me fez esquecer a pizza.
— Oh! A pizza!
— Sim. Aquela que você ia votar. — Ele sorri curioso. — Não ia?
Dou um sorriso gradativo e Steve dá de ombros sendo metido.
— Eu peço a pizza, você liga pra casa, tá? E se lembra, se o Junior não atender de primeira, é porque a Tani está lá e ele está... ocupado. Não porque está acontecendo um incêndio ou tsunami.
— Isso é inédito. Danny Williams está me mandando ser positivo?!
— Estou. E mandando você me beijar antes de ser positivo.
— Seu desejo é uma ordem, meu amor.
...
Pedimos pizza no modo clássico, tamanho família, muito queijo, molho pra todo lado. Escolhemos a pizzaria que leva o nome do bairro em que estamos, Santa Mônica, porque o Google a avalia com cinco estrelas e a ideia de ter o mesmo nome causa credulidade em nossas cabeças de turistas.
P.S.: A pizza daqui é maravilhosa. E Steve lembrou de dobrá-la no meio.
Não precisei mandar as crianças pra cama, porque todos estavam exaustos da viagem. Disse pra Steve que eu conferiria as fechaduras da casa e o mandei pro chuveiro. Quando cheguei na porta do quarto das crianças, lá estava ele.
Retirando os fones de ouvido de Grace, conectados no celular descarregado, e cobrindo Charlie com o edredom. Ele apagou o abajur, e deu um beijo em cada um deles, bem na testa, acariciou seus cabelos e me viu escorado na porta.
— Parecem dois anjos. — Ele puxou três quartos da porta pelo lado de fora.
— E você é um garoto muito desobediente.
Entramos em nosso quarto de cinema, e Steve fecha a porta.
— Não fazia sentido o meu corpo nu sozinho naquela banheira enorme.
— Eu acho que prefiro o chuveiro bem quente...
Steve estreita os olhos e passa a língua entre os lábios.
— Eu entendi errado ou meu noivo acabou de me rejeitar?
— Como eu estava dizendo, ver as gotas d’água caindo no seu corpo perfeito é uma das cenas mais sexys que já vi.
Steve recebe minhas palavras ciente de que há algo mais, mas se sensibiliza com meu bocejar cansado e com meus olhos fundos.
— Okay... coloquei as crianças na cama, é sua vez. Você parece cansado.
— Eu tô cansado, mas... acho que fiquei um pouco preocupado com o que a Mary falou... sobre o Jordan.
— Preocupado com o indiano charmoso?
Steve me faz sorrir numa frequência absurda. Volto a pensar na Mary.
— É que... ele cuida da Joan. Fiquei pensando... e se ela tiver razão?
— Amor, eu entendo. — Vejo quando seus olhos buscam uma lembrança e ele a revive em sua mente. — E sei que da última vez que a Mary desconfiou de alguém, o cara tinha uma pequena fábrica de drogas no porão. Então eu entendo. Mas o Jordan não fez nada e acho que ele vai entrar pra família. Viu como eles se olham. Eu não quero ser o cara que invadiu a privacidade dele como um favor pra irmã. Não acho mesmo que elas estejam em perigo.
— Você tem razão. A altitude deve estar me deixando paranoico.
— Vou cuidar de você, meu amor. Vou tirar sua roupa, te dar um banho de chuveiro, vou te fazer uma massagem bem gostosa e te por pra dormir.
— Eu sabia que você era carinhoso. Quer dizer, quando éramos só amigos... você esbarrava em mim mais do que o aceitável pra ser acidental, mas não sabia que você era tão carinhoso assim. — Mordo o lábio quando ele fica corado.
— Eu também não sabia. Mas isso é bom ou você já enjoou desse cara aqui?
— Enjoar de você?! Eu nunca enjoei de pizza, e eu amo você muito mais.
— Uau! Isso é o que eu chamo de uma declaração de amor!
— E você? Me ama mais que um campeonato inteiro de airsoft?
— Bom... isso depende. Um campeonato de quantas partidas?
— Bobo! — Espalmo a mão em seu peito. Ele desabotoa minha camisa.
— Não tem nada que eu ame mais do que você, do que tirar sua roupa, do que beijar seu corpo todo e fazer você chamar meu nome até sua voz falhar...
— Oh, Steve... — Não percebo que faço exatamente o que ele queria.
...
— Charlie, como nós estamos?
Charlie era o grande CEO da nossa empresa. Por isso, enquanto eu e Steve trocávamos olhares apaixonados por cima da mesa de pinho da varanda do airbnb, e Grace levantava ideias como ir até a Melrose Avenue comprar coisas, era Charlie quem anotava todos os planos e os dias disponíveis que teríamos.
— Temos seis coisas pra fazer e cinco dias. — Ele encara a prancheta com tamanha seriedade.
— Os ingressos da Disney são antecipados e tem data marcada pra sexta, então pode riscar Disney e sexta. — Comenta Steve colocando um pedaço de croissant na boca.
— Ainda bem que temos o tio Steve. — Diz Charlie apontando o indicador para seu funcionário do mês. — Agora são cinco coisas e quatro dias.
— Ainda bem que temos o tio Steve?! Viu o que fez? Comprou ingressos pros Ratos Gigantes e agora eles te amam!
— Na verdade, a gente já amava o tio Steve muito antes da Disney. — Grace rebate, enquanto espeta uma rodela de banana com calda da sua panqueca.
— É verdade. — Charlie concorda, e esconde o rosto na sua tigela de cereal.
— Essa é a minha garota. E esse o meu campeão. — Steve estica os braços e bagunça o cabelo de Grace, enquanto troca um soquinho no ar com Charlie.
Dou um sorriso furtivo e assumo um tom de despeito.
— Oh, eu estou sobrando aqui. Tudo por causa dos Ratos Gigantes!
Por trás da onda ranzinza, me sinto bestificado pelo modo como Steve faz parte do cotidiano dos meus filhos tão naturalmente, como se sempre estivesse estado ali. Não conheço sensação melhor que ver todos eles juntos sorrindo.
— Ah, vocês sabem o que isso significa, certo? — Pergunta Steve. — O Danno precisa de um abraço coletivo. Agora!
Charlie correu e se jogou sobre mim até esmagar minhas costelas, Grace veio preguiçosamente e se amontoou do outro lado com os braços envolvendo meus ombros e Steve se enfiou entre eles, atrás da minha cadeira, envolvendo todos de uma só vez em seus braços compridos.
— O Danno mal consegue respirar... mas ama vocês. — Digo com a cabeça pendendo para trás, até receber os lábios dele contra os meus, um selo rápido.
— Eu te amo. — Ele sussurra contra minha boca.
Achava que quanto mais ouvisse essas três palavras naquela mesma sequência, elas perderiam a cor, mas eu estava errado. Quanto mais Steve diz que me ama com a boca e com os olhos, mais colorido o meu mundo se torna.
— Devíamos fazer uma dessas coisas hoje à tarde, e ir jantar na Mary. Mal vimos ela ontem. — Sugiro.
— E vamos ver a Joan!!! — Concorda Charlie imediatamente.
— O que acha Grace? — Pergunta Steve.
— Pode ser. — Ela brinca com um pedaço de panqueca no garfo.
— Hun... vou mandar uma mensagem pra Mary. Podíamos ir ao Pier à tarde, já estamos do lado e vai ser um bom lugar pra começar nosso tour. Topam?
— Eu topo! — Responde Charlie. Grace solta um joinha de boca cheia.
— Pier? Vocês ainda não enjoaram de praia e... mar na vida de vocês? — Bom, dessa vez eu não estava realmente implicando da boca pra fora.
— Danno, eu não moro mais no Hawaii. Quero ir ao Píer. — Grace faz um biquinho e concordo no mesmo minuto.
— Jantar marcado com a Mary... Oh, um minuto! — O celular de Steve chama, ele se levanta tropeçando na cadeira, o que me deixa um pouco tenso.
Grace também observa Steve, interrogativa, e recaí os olhos em mim.
— O Danno volta em um minuto. Sintam minha falta. — Eles sorriem.
— Certo. Tudo bem. Muito obrigado! Certo. — Ele desliga o telefone.
— Meu amor, tudo bem? — Puxo a barra de sua camisa de leve, até ele se virar pra mim.
— Vamos ter que desmarcar o jantar.
— A Mary está bem?
— Sim! Não era ela. Não vai acreditar no que aconteceu!
Ele sorriu e eu finalmente entendi que não era um incêndio nem tsunami.
— VOCÊ GANHOU O SORTEIO PRA PRIMEIRA FILA DE INGRESSOS DE HAMILTON HOJE A NOITE NO PANTAGE??!!
Grace foi de zero à quinhentos em dois segundos. Ela se levantou tão rápido quanto uma atleta profissional e esmagou as costelas de Steve.
— Sim... eu achei melhor não contar que entrei no sorteio pro caso de não ganharmos. Mas ganhamos! — Ele diz e ela o abraça outra vez.
— Obrigada! Obrigada! Obrigada! Eu te amo! Eu te amo! Eu te amo!
— Eu também te amo, Princesa. — Ele beija sua testa. — Mas, só temos dois ingressos. E de toda forma, a indicação é pra acima de dez anos...
Grace se vira pra mim, os olhos ressabiados, analisando minha reação.
— Não vamos mais ver a Joan? — Pergunta Charlie cabisbaixo.
— Que tal eu e o Charlie irmos até o jantar, e vocês irem ver o musical?
O sorriso se alastrou no rosto de Grace e ela correu para me abraçar.
— Tem certeza, Amor? — Steve se assegura de minha posição.
— Claro! Se a Grace concordar...
— Concordo! Você é o melhor, Danno! — Grace se amontoa no meu colo. Charlie entende o recado como “vamos sufocá-lo de novo”. E Steve, bom. Steve não precisa de mais pra vir até mim e deixar outro beijo curto em minha boca.
...
O Píer de Santa Mônica era deslumbrante, ao ponto de me fazer pensar que no oitavo dia Deus criou aquele lugar, e deve ter lhe rendido boas horas de sono. A questão é que um parque de diversões e uma praia me eram lugares distintos, mas o píer desafia esse raciocínio. É como shampoo dois em um, que teoricamente, já lava e condiciona os fios. Pena que na prática não funciona.
— Roda gigante. Roda gigante. — Era só o que eu ouvia Charlie dizer.
— Ou podermos só comer queijo derretido. Não parece muito mais divertido?
— Roda gigante!!!
Steve teve que verificar o brinquedo. Não estou falando com os olhos, ele literalmente usou as palavras “controle de qualidade, SEAL e Five-0" na mesma frase até obter sucesso e ter permissão pra pôr a mão em cada parafuso. Ele me disse que era confiável, e sei lá o que aquele homem havia feito com meu cérebro, mas eu concordei. E nunca vi Charlie tão feliz. A boca dele sorria como se tivesse sido feita apenas para isso. Grace não estava diferente, ela só falava de Alexander Hamilton e simplesmente ela só falava desde a notícia dos ingressos. Meus filhos estavam felizes, e eu estava completamente apaixonado.
Suados e cansados, farejaram o mar como pesquisadores perdidos no deserto anseiam pela miragem de um riacho de água doce correndo para suas bocas. Chegamos à orla, encontramos cadeiras de praia disponíveis e eles já estavam tirando a roupa de cima.
— Vocês sabem que o oceano não vai fugir, não sabem?
— Sim, mas a sensação térmica agora deve estar de 48°!
Grace sabia como me dobrar, havia puxado isso de Steve.
— Precisa de ajuda pra se livrar dessa camisa, Detetive?
Steve sabia ser sexy sem ser vulgar, e sabia ser sexy o tempo inteiro, mesmo na presença de outras pessoas e mesmo quando as outras pessoas eram meus filhos. Eu não sabia. Eu precisava de privacidade, paredes e trancas fechadas para ser sexy com ele, e dentro dos meus termos eu podia sim trabalhar.
— Vão vocês. Eu vou pedir queijo derretido e comer o de vocês.
— Danno. — Disse Steve, naquele seu tom que me fazia calar a boca e ouvir o que vinha adiante. — Podemos pedir queijo em cinco minutos. Vamos com-
— Eu não vou, Steve. — As crianças estavam distraídas com peças de roupa que precisavam ser guardadas, protetor solar que precisava ser espalhado e não prestavam atenção em mim, mas Steve nunca deixaria meu tom seco passar.
— Meu amor. — Ele se aproximou, já sem camisa e sandálias, num uniforme havaiano que eu havia criado certo fetiche e segurou minhas mãos. — Você não tá a fim de entrar na água ou você não tá a fim de entrar na água?!
Embora parecia que Steve tinha batido a cabeça, eu o entendi muito bem.
— Steve, eu não vou mentir pra você... Eu olho pro seu ombro e ainda consigo ver os pontos, eles nem tiveram tempo de cair... é recente demais.
— Entendi. — Ele beija meus dedos e eu acho aquilo incrivelmente doce e ao mesmo tempo sensual. — E você acha que consegue lidar com a ideia de eu levar as crianças até lá? Em segurança. Enquanto você pede queijos derretidos pra todos? Então você acena pra mim e nós voltamos correndo para você?
Assinto.
— Só não vão pra longe, nem tire os olhos deles, nem-
— Você confia em mim?
— Confio minha vida à você. E te amo. E me perdoe, o problema não é você.
— Eu te amo também. E prometo que vamos resolver isso juntos.
Talvez essa fosse uma espécie de linguagem universal do amor, afinal. Não com as palavras ou com os beijos, mas aqueles olhos que eu sabia que viam tudo. Viam minha própria alma e as rachaduras que a vida esculpiu nelas.
...
Steve queria alugar um carro, mas o convenci a pegarmos dois ubers para que aproveitássemos ao máximo a ideia de sermos turistas e não termos que nos preocupar com vagas de estacionamento e coisas do tipo. Grace usou um vestido bege claro com flores rosadas na saia longa e fez cachos no cabelo, porque queria mesmo ser confundida com alguém do elenco. Steve, que estava suando frio pela ideia de decepcioná-la se vestiu a rigor, e eu tive que arrancar o terno da roupa dele, o deixei apenas com uma camisa social preta de botões fechados, porque convenhamos, ele fica perigosamente lindo com parte do peitoral a vista dos olhos, sua calça e sapatos também eram pretos e social.
Charlie se vestiu como um mini-eu. Jeans azul nas pernas e social branca de manga comprida. Deixei meus primeiros botões abertos de propósito, como uma criança pedindo doces ou travessuras no Halloween, recebi beijos e um sussurro na beirada do ouvido sobre como ele estava ansioso por mais tarde.
Quando desci do táxi na porta de Mary, ela me atendeu de toalha e eu soube ali que o jantar tinha fracassado. Basicamente, o vinho que eu trouxe em mãos era a única parte do jantar que não havia sido queimado ou passado do ponto.
— Eu sou um desastre! — Ela se jogou no sofá e cobriu as pernas com uma almofada que se parecia com um pompom gigante. Os cabelos estavam bagunçados, puxados para trás da orelha escapando da presilha torta na cabeça. Os dedos nervosos se balançando pra cima e pra baixo, até mesmo dos pés. E o celular grudado em sua mão, uma chamada atrás da outra, mas sem resposta.
— Filho, por que não vai procurar a Joan? Ela tá aqui, não tá, Mary?
— No quarto, emburrada. Mas acho que pro Charlie ela vai abrir a porta.
— Eu vou até lá. Boa sorte. — Charlie assopra pra mim.
Por que meus filhos são tão espertos, meu Deus?
— Acho que agora posso perguntar, o que aconteceu?
— Além de eu ter marcado um jantar com meu irmão e o noivo dele e ter estragado tudo como sempre faço? — Mary faz uma carinha de choro.
Ah não...
— Mary, por favor não chora porque eu sou do tipo que chora junto e isso não vai ser bonito. — Me sento ao lado dela e consigo lhe arrancar um sorriso.
— Ah Danny, o meu irmão tem sorte porque você deve ser o único cara legal que sobrou no mundo!
— Então, nós estamos falando sobre um cara charmoso que por acaso se chama Jordan?
— Mais ou menos. — Ela suspira. — Mais pra mais do que pra menos.
— O que ele fez? — Tento não assumir o tom protetor que sei que estou assumindo, como se eu fosse sair daqui e levantar o cara pelo colarinho.
— A pergunta certa é “o que ele não fez?”. Eu... confundi as datas do aniversário da Cloe, uma amiguinha da Joan. Elas se adoram, ensaiam coreografias juntas e pintam as unhas uma da outra com canetinha.
— Me lembro dessa época, eu ficava maluco achando que a Grace pensava que era uma adolescente com sete anos, mas era só ela tendo sete anos...
— Eu achei que o aniversário dela fosse em setembro, mas era agosto. Na verdade, é hoje. A Cloe ligou pra Joan de última hora confirmando a presença dela, e a Joan veio até mim falando que esquecemos de comprar o presente. Então eu liguei pro Jordan, ia pedir pra ele acompanhar ela porque eu... obviamente já havia marcado com vocês e eu tô tão feliz por vocês dois que não queria fazer besteira. Danny, eu sempre soube que meu irmão era gay, me desculpa te dizer isso assim com todas as letras, mas eu sempre desconfiei e aquelas namoradas que ele arrumava... eu não suportava aquelas garotas! E... quero que pelo menos um de nós possa tomar boas decisões, e... não sou eu.
Me parece covardia sorrir enquanto alguém tem lágrimas loucas pra pular pra fora dos olhos, mas é tão bom ouvir que Mary me quer com seu irmão que eu acabo sorrindo da forma mais discreta que consigo.
— Mary. — Uso o tom de voz que Steve usa pra me acalmar quando estou falando demais. E é inacreditável, mas funciona mesmo. Ela se cala e me olha.
— Oi? — Seus olhos me encaram de baixo pra cima, como uma criança.
— Se acalma. Eu realmente aprecio o que está me dizendo. Na verdade, eu fico tão feliz que... Okay, esse não é o ponto aqui. Eu não sou o ponto. E nem o Steve é o ponto. Você também tem o direito de tomar boas decisões, okay?
— Tenho? Mas e se... eu não fizer ideia de como se toma boas decisões?
Uma lágrima escorre por seu rosto e faz uma onda em sua bochecha.
— Então eu vou ter que te lembrar que tem uma garotinha linda que eu conheço que tem uma casa tão bonita que parece uma casa de bonecas, e tem a mãe mais divertida e dedicada que eu conheço, e ainda, ela tem vagalumes morando na janela do seu quarto... sabe por que? Porque você tomou uma boa decisão. Você sabe como fazer isso. Mas não tem que fazer tudo sozinha, você não tá sozinha, Mary. O Steve se preocupa com você e eu sei que ele pode ser péssimo em dizer o que sente, mas ele se preocupa e eu também me preocupo.
— É tão difícil, Danny... eu não tô reclamando, mas é difícil. Se preocupar o tempo inteiro, se ao menos eu tivesse com quem dividir. E quando o Jordan apareceu... eu não tinha mais que me preocupar o tempo inteiro, eu conseguia tomar um banho demorado e assistir um filme do começo ao fim!
— Eu sei exatamente do que você tá falando...
Seus olhos curiosos caem sobre mim.
— Se sentia assim com sua ex-esposa?
Nego imediatamente com a cabeça, até sorrir do absurdo daquela ideia.
— A única coisa boa que saiu de Rachel foram Grace e Charlie. Eu nunca consegui ficar tranquilo enquanto as crianças estavam com ela, tinha sempre aquele sentimento de que... o telefone ia tocar e ela ia me pedir socorro. Ou pior, não ia me pedir socorro! Mas o seu irmão... pra ser justo ele sempre me ajudou, mas agora... ele tá tão empenhado em cuidar deles, Mary... ele é como...
— Um pai?
— É. — Sinto meus lábios sorrirem. — E isso me deixa... em paz.
— Tem que dizer isso pra ele, Danny.
— Tenho medo dele arrancar esse anel do meu dedo tão rápido como o colocou. — Só quando digo aquelas palavras, descubro que é o que eu sinto.
— Oh, Danny... você já reparou como o Steve olha pra você?
— Eu acho que exatamente como o Jordan olha pra você.
— Acha mesmo? Porque eu odeio sentir essa insegurança maldita...
— Acho. Mas você também tem que dizer isso pra ele, tá bom? Agora, vai se arrumar, você tem o aniversário da Cloe pra levar a Joan.
— E você?
— É Los Angeles. Eu arrumo algum lugar pra ir. Adiamos o jantar.
— Ou... você vai comigo! É perfeito! O aniversário vai acontecer num Fliperama! Charlie vai adorar o lugar, Joan adora o Charlie, eu adoro você.
— Não vai ser estranho? Eu nem sei se a Cloe é loira ou morena.
— Um pouco estranho, mas... ela é ruiva!
— Me convenceu no “eu adoro você”. Compramos presentes no caminho.
Mary se levantou e correu para dar a notícia a Joan. Eu realmente fui contagiado pelo sentimento de missão cumprida, queria ver Mary feliz.
...
O piso era de um azul coral esmaltado, fios de luzes neon tremulavam no alto da parede e no centro em vermelho piscava “Super Arcade”. Era o tipo de lugar que desembrulhava seu peito até encontrar a infância dentro de você.
A única diferença eram obviamente os cachos de balões vermelhos, a cortina com a logo da Mulher-Maravilha no centro e a mesa enorme com o bolo e as letras de madeira bem posicionadas formando um “Super-Cloe”! Realmente, uma garota de sete anos que faz um aniversário num fliperama, deve ser coroada uma heroína entre as crianças.
— JÔ!!!! A minha Amazona preferida finalmente chegou! — Gritou uma garotinha de cachos vermelhos, um vestido que imitava o uniforme da Diana, botas de plástico até os joelhos e pulseiras largas douradas nos pulsos.
— Cloe! Isso aqui tá... irado! Feliz aniversário! — Joan a abraçou e entregou seu presente. Mas Cloe estava com os olhos presos em Charlie e em mim e Joan com estrelas explodindo dentro dos olhos nos apresentou. — Esse é o meu primo, Charlie, ele mora láaaaaaa no Hawaii, mas veio visitar a gente. E esse é o pai dele, o tio Danny.
Oh! Ela o chamou de primo e eu tinha certeza que isso era coisa da Mary.
— Hawaii?! Tipo, o Hawaii?! Isso é demais! Eu sou a Cloe!
— Feliz aniversário, Cloe. Sou o Charlie e esse lugar também é demais!
Eles apertaram as mãos como dois adultos e então Charlie lhe entregou seu segundo presente.
— Você tem que conhecer todos os nossos amigos, vão adorar você!
— Tio Danny, posso levar o Charlie pra conhecer meus amigos?
Charlie me olha com interrogações brilhantes nos olhos.
— Claro, Princesa.
— Vamos! — Cloe puxou os dois pelas mãos com a força de uma Amazona.
— Eu disse que ele ia adorar. — Comentou Mary, observando as crianças e acenando para algumas pessoas que nos encaravam como se fôssemos celebridade.
— Mary, eu acho que sou o único homem aqui com mais de dez anos.
— Boa noite! Sejam muito bem vindos e por favor fiquem à vontade! — Disse uma mulher ruiva de cabelo escovado para trás, a mãe de Cloe sem dúvida alguma.
— Obrigada, Cynthia! — Agradeceu Mary, mas a tal da Cynthia parecia bem ocupada me reparando da cabeça aos pés como se eu estivesse nu.
— Então, esse é o seu namorado misterioso que nunca conhecemos?
— O Danny?! — Mary engasgou dentro da própria risada. — Não mesmo.
Vejo quando Mary cai num devaneio nostálgico dentro da sua cabeça. Com certeza pensando que precisou pegar o noivo do irmão emprestado porque o seu namorado não atendeu o telefone. Ela imergiu tão fundo que não lembrou de completar a frase com “ele é o meu cunhado, então para com esse olhar!”.
— Sorte a minha. Cynthia. É um prazer conhecer você. — Ela me estende a mão e eu retribuo exibindo minha aliança de noivado.
— Igualmente. A festa está incrível e sua filha é encantadora.
— Ah, que gentileza sua! Você também tem filhos? Ah, meu Deus o que estou fazendo? Venham, sentem-se conosco e vamos tomar um drink!
Cynthia era melhor em falar do que em ouvir. Ela disse que Charlie era a coisa mais linda que ela já havia visto e que a genética é uma “coisa” maravilhosa porque ele era obviamente a minha cara. Mary perguntou se serviam martini e ficou encarando o celular, completamente avulsa às investidas de Cynthia.
— Então, eles disseram “Senhora, nós não fazemos festas de aniversário aqui. Apenas campeonatos de jogos.” Mas descobri que estavam passando por problemas financeiros e ofereci um cheque generoso. E aqui estamos nós.
— É uma história incrível, Cynthia. Mas eu preciso mesmo de um martini. — Diz Mary, bloqueando a tela do celular.
— Mary! — Eu a chamo, mas ela apenas responde do caminho.
— Trago outro pra você, Danny.
Mary saiu na direção do bar. E Cynthia voltou a falar e falar e falar, e como se não fosse suficiente, Cynthia tinha amigas ou seu próprio séquito. Ashley, Kate, Carla, Hillary e outras duas que não fui capaz de decorar os nomes.
— Então quer dizer que você largou tudo em Jersey e foi morar no Hawaii pra ficar perto da sua filha? — Perguntava Kate ou Carla, era difícil saber.
— É. Pois é. — Respondi procurando Mary com os olhos.
— Nem todos os homens são um lixo. — Hillary teve sua própria Eureca.
— Vou colocar isso numa camisa. — Disse, sorrindo. Péssima ideia, porque ela corou como se eu tivesse realmente incentivando um flerte maluco.
— Eu compraria. Na verdade, acho que compraria qualquer coisa vinda de você. — Disse uma das mulheres que eu não sabia o nome, acho que vou chamá-la de Aquela Que Bebeu Demais E Pôs A Mão Na Minha Coxa.
— Então... — Tossi forçado. — Eu tenho mesmo que localizar a Mary.
Sai o mais rápido que pude. Tinha algo muito errado com aquelas mulheres! Vi Charlie comemorando porque havia vencido uma partida de algum jogo, segui todo o salão com os olhos e finalmente avistei Mary. Ela estava sentada numa das cadeiras altas do balcão do bar, os pés escorados no suporte da cadeira, os braços sobre o balcão, o celular ainda em uma das mãos e a outra contornando o copo corpulento de martini com duas azeitonas dentro.
Me sento com um sorriso amigável e reparo que ela está no segundo copo.
— Me desculpa, Danny... acho que bebi o seu martini.
— Mary, eu adoro você e não vou deixar você encher a cara.
Ela tenta espetar uma das azeitonas, mas acho que sua visão já não é mais a mesma de antes do primeiro copo.
— Ah, você não vai fazer isso comigo.
Puxo o copo dela no mesmo segundo.
— Tem certeza que não vou? — Espeto a azeitona que ela tanto queria no palito e o entrego a ela. Bebo todo o líquido do copo de uma vez e me arrependo por alguns segundos, exatamente quando o martini incendeia minhas cordas vocais e sinto que não vou conseguir conversar por dois dias.
— Você bebeu meu martini! Achei que você amasse sua cunhada!
— Eu amo, por isso bebi... e meu Deus! Parece que engoli uma vela acesa!
Ela sorri e aceita o meu palitinho de azeitona como pedido de desculpas.
— Eu sei, o gosto é horrível. Eu me sinto horrível. Desculpa?
— Desculpa por me fazer beber isso ou por me jogar pras cobras?
— Oh meu Deus, o Steve vai me matar!
— Eu tô brincando com você. Agora vamos falar sério. Cadê o Jordan?
Ela encara o celular e suga todo o ar do bar para dentro de seus pulmões.
— Eu não sei. Ele sumiu e não é a primeira vez. Num segundo ele tá aqui colocando a Joan na cama, fazendo frango balti pra ela e fazendo eu me...
— Apaixonar por ele? — Ofereço minha mão à ela sobre o balcão.
— Apaixonar por ele. — Ela aceita minha mão e a aperta com força. — Mas  então ele vai embora e simplesmente não dá notícia. Eu ligo, deixo mensagem, o celular chama, mas ele não atende. Sei que posso ir até o loft dele e ninguém vai abrir a porta. Sei que posso convencer o porteiro do prédio de que esqueci minhas chaves do lado de dentro, mas não vou encontrar nenhuma pista dele.
— Por isso queria que investigássemos ele? — Me viro de frente pra ela.
— É. Não acho que ele seja mal caráter, Danny, mas tem alguma coisa que o faz não estar cem por cento aqui e... eu já esgotei minha cota de abandono.
— Por que não disse antes?
Mary mordeu a almofada do seu polegar e disse:
— Porque queria que o Steve gostasse dele. Você me entende?
— Oh não... eu nem estava roendo as unhas querendo que você gostasse de mim!
— Roeu as unhas à toa. — Ela revira os olhos. — Eu sempre gostei.
— Vou fazer uma ligação. E você não vai pedir mais nenhum martini, okay?
— Talvez vodca? — Ela me encara de canto de olho.
— Tenho certeza de que você disse soda!
...
“Danny? Tudo bem? Pensei que estivesse ocupado vivendo um filme de romance.”
“E estou mas parece que sempre tem um pouco de mistério nesses filmes, certo?”
“Quando se trata da gente, sim. O que precisa, Haule?”
“Preciso verificar os antecedentes de alguém, mas preciso que seja discreta com isso, Kono.”
“Nem sei do que você está falando. Qual o nome?”
“Jordan Mayfair.”
“Te retorno assim que conseguir. Tenho que ir, o Adam chegou em casa.”
“Obrigado, irmã.”
“Você paga a cerveja quando voltar.”
...
Quando desliguei, Mary não estava mais sozinha. Se os brinquedos eram a área das crianças, o bar havia se tornado o lugar dos adultos socializarem.
—  Agora é só esperar. — Aviso ela, enquanto me sento ao seu lado.
— Obrigado, Detetive. — Ela bebe um gole de uma bebida transparente.
— Eu realmente espero que isso seja soda.
Ela enfia o copo na minha cara. É soda.
— Mais um caso solucionado.
— Então, quer dizer que o Danny é um detetive? Tipo um detetive de verdade? — Perguntou Cynthia e sua trupe se espalhou ao nosso redor.
— Sim. Mary, você não contou como nos conhecemos? Sobre o Steve?
Ela recebe minha deixa.
— Oh, eu sempre falo do Steve, mas elas acham que eu inventei ele.
— Em nossa defesa, ela mostrou a foto de um cara pra gente que com certeza é um modelo de cuecas. — Comentou Kate ou Carla.
— Modelo de cuecas?! — Dou meu sorriso afetado. — E como ele era?
— Ah, você não vai querer saber. — Diz Cynthia, suspirando.
Mary esconde a gargalhada atrás do punho escorado no balcão.
— Não. Eu quero mesmo saber. Me contem. — Rebato.
— Ele era... lindo! — Diz Hillary. — Moreno, alto, olhos verdes e um corpo... uau! — Ela se abana com o cardápio de bebidas.
— Mas eu realmente prefiro loiros. — Diz a moça da Coxa, dessa vez se aproximando demais do meu banco, e me fazendo recuar alguns centímetros.
— Então, Hillary. Esse cara que você descreveu era mesmo o Steve.
Elas se entreolham, confusas.
— Eu disse. — Acrescenta Mary.
— Então ele existe? — Pergunta Ashley com o queixo caído.
— Existe, mas garotas, o Steve é muito bem comprometido. — Completo.
— E você, gato? — Pergunta Aquela Que Bebeu Além Da Conta.
— E eu também sou muito bem comprometido. — Franzo o nariz.
— Então, Danny, você disse que se divorciou. Se casou de novo? — Pergunta Cynthia.
— Não, ainda não. Mas vou, eu estou noivo. — Sorrio involuntariamente.
— Oh, parabéns, querido! — Ela aperta minha mão. Sinto que todas elas procuram uma forma de passar as mãos em mim enquanto me parabenizam.
— Nem todos os homens são um lixo, mas todos são comprometidos. — Reitera Ashley.
— É uma boa parte de trás da camisa. — Comento.
— Não vamos perder a oportunidade de fazer uma despedida de solteiro! — Conclui A Moça Das Mãos Curiosas. Dessa vez ela me abraça de lado.
— Meninas, eu acho que o Steve não vai gostar nada disso. — Diz Mary.
— Se o conheço bem e eu o conheço, não vai gostar mesmo. — Acrescento.
— Mas podem perguntar pra ele, porque ele tá chegando bem ali.
Viro o rosto na direção que Mary aponta com a cabeça, e vejo Steve passando pela porta e encarando todos aqueles braços ao meu redor. Cynthia está ao meu lado, meio debruçada sobre seu banco. Ashley toca meu ombro ao me parabenizar tardiamente, e Aquela Que Bebeu Demais acabou de tentar sua manobra mais ousada, tropeçando os braços em torno do meu pescoço.
Grace ri da cena que encontra e da que ela sabe que vai acontecer a seguir e é pescada por Charlie para conhecer Cloe. Steve caminha em nossa direção e por Deus, aquele homem ficou muito mais bonito nas últimas horas. As mangas foram arregaçadas nos antebraços e o maldito botão de cima está aberto, o que sei que foi proposital. Ele passa a língua entre os lábios e os fecha, intrincados.
— Boa noite, pessoal! — Steve assente com a cabeça para todos.
— E que noite... — Diz uma das garotas, me fazendo revirar os olhos.
Ele deixa um beijo na testa de Mary e se aproxima de mim com tanta precisão que Aquela Garota precisa retirar o braço para ele passar.
— Boa noite, Danno. — Seus olhos continuam serrados em mim.
— Boa noite, Steven. Como foi o musical? — Puxo a barra da sua camisa, trazendo ele para mais perto e fecho aquele maldito botão da sua camisa.
— Muito bom. Mas eu senti falta de... alguma coisa. — Ele escora o braço contra o balcão em minhas costas.
— Alguma coisa? — Incentivo seu flerte, tudo o que quero é ele.
— Disso. — O beijo é rápido, mas faz meu corpo queimar mais do que o martini.
— Oh, eu acho que vou desmaiar. — Diz Aquela Que Bebeu Demais.
— E então, esse é o modelo de cuecas? Porque ele realmente poderia ser... 
— Modelo de cuecas?! — Steve franze o nariz. — Só pra você, meu amor.
Não consigo evitar o desejo em meus olhos, e ele morde seu lábio. Enfim, acho que sei sim ser sexy fora de quatro paredes e uma porta bem trancada.
— Ah, eu ainda estou aqui! — Resmunga Mary tapando os olhos.
— Nem todo homem é um lixo, mas todos são comprometidos e/ou gays.
— Todos eu não sei, mas eu sou. — Digo abraçando meu modelo de cuecas.
...
Deixamos Mary em casa e chegamos ao airbnb, colocamos as crianças na cama e Steve simplesmente não me dirigiu a palavra, fecho a porta do quarto com o coração disparado, seu silêncio me causa uma onda de pânico horrível.
— Steve, eu... não pude deixar de notar que você não disse uma palavra e sinceramente, isso está me deixando maluco. Você acha que eu estava gostando de toda aquela atenção? Porque eu, definitivamente, não estava.
— Eu sei. É que você disse algo hoje que não saiu mais da minha cabeça.
— O que eu... o que eu disse? É sobre o “eu não vou entrar no mar”?
— Não. Vamos falar disso no seu tempo, meu bem. E na verdade sobre o que eu vou falar também quero que seja no seu tempo, mas eu acho que como foi você que disse, eu... talvez possa perguntar... — Sinto seu nervosismo. — Você é gay? Quer dizer... só estava querendo espantar suas fãs ou você realmente...
— Sou gay. — Suspiro aliviado. — Era só isso?! Achei que você já tinha suspeitado. Quer dizer, eu literalmente já provei cada centímetro do seu corpo, e você sabe que eu sou louco por você, eu amo você, vamos nos casar!
— Eu me lembro, e como eu me lembro! Mas depois de todas as namoradas, não sei... eu pensei que você pudesse ser bi ou... na verdade, isso não é o importante aqui. O importante é que você me ama, por favor entenda isso. É só que... isso me deixa curioso, tudo sobre você é um livro que eu leria várias vezes e eu não sabia disso... não fazia ideia nem se você pensava nisso...
— Eu fiz uma pequena retrospectiva. Pequena do tipo... dos últimos quarenta anos. Percebi que eu não me via exatamente como você se via. Eu não sentia que estava escrevendo com a mão esquerda, eu sequer sentia que estava escrevendo, talvez reescrevendo. Reescrevendo os passos dos meus pais... eles pareciam felizes, parecia a coisa certa. Mas... sempre senti que faltava alguma coisa, Steve e no dia que eu toquei um dedo em você... destranquei uma porta que nem sabia que existia. Percebi que não era só sobre você, sobre seu corpo escultural ou sobre seu beijo tirar o chão debaixo dos meus pés, sobre o sexo ser... uau... o sexo! Mas era sobre quem eu sou! Eu. Daniel Williams sou gay.
— Acho que desde que a gente se declarou... eu fiquei morrendo de medo de você se arrepender e me trocar pela primeira mulher que aparecesse...
Sinto sua respiração acelerada, ele realmente estava apavorado!
— Meu amor... isso não vai acontecer. Eu sou completamente... seu. — Sinto o meu coração acompanhar o ritmo do dele e minha respiração ficar pesada.
Em parte, é porque quando a verdade te escapa pela boca com o pé colado no acelerador, seu corpo se despe. Mas por outro lado é porque olho para Steve, que acabou de girar a chave na porta, e tudo o que vejo é amor e desejo numa intensidade que sei que o mundo poderia cair do outro lado da janela que ele continuaria a caminhar as mãos pelo meu corpo.
Elas começam em meu rosto, firmes como se precisassem me ver na ponta dos dedos, seu indicador escorre por meus lábios e a pontinha toca minha língua de forma que meu corpo pulsa imediatamente, suas mãos desenham as curvas dos meus ombros e escorrem como calda quente pelo meu peito, os botões que visto vão se desatando conforme ele caminha por mim.
Steve se joga de joelhos no chão e o zíper da minha calça é puxado para baixo como se sua vida dependesse disso. Minhas costas colidem com a parede, onde ele apoia as mãos quando traz o rosto para o meio das minhas pernas, os olhos presos aos meus, determinados, como se ele pudesse dizer que me ama e que me quer mesmo com a boca cheia do prazer que ele arranca de mim entre seus lábios, em minutos ele me convence de que tudo que eu preciso é da sua boca exatamente onde está e que eu posso sim deixar de respirar um pouco e quem sabe me mover contra sua língua com toda a força que eu quiser, até que não reste uma gota do meu corpo que não tenha corrido para dentro do seu.
...
Los Angeles me desperta com generosidade, primeiro vejo feixes matizados de luz colorirem pequenos grãos de poeira no ar, então o perfume dele me abraça lentamente e sua boca se une a minha com tamanha doçura. Em contraste, tenho que dizer, com a lembrança que tenho de ontem à noite.
— Bom dia, meu amor! — Seu sorriso nasce sobre a camiseta branca que o faz parecer angelical e tem uma bandeja de café encaixada sobre as pernas.
— Bom dia, amor... — Esfrego o rosto nas mãos em busca de arrancar a leveza da noite do meu cérebro. — Eu passei muito da hora?
— Você estava cansado, eu te deixei dormir. As crianças já comeram, estão vendo TV. Eu trouxe o seu café duplo, achei que precisava de reforço. Fiz ovos mexidos como você gosta e trouxe-
— Eu só quero você. — O puxo pela manga da camisa, ele sorri e ajeita a bandeja na cômoda ao seu lado.
— Oh, como eu adoro sua voz quando você acorda... diz isso de novo? — Ele se deita em cima de mim e traz o ouvido para perto da minha boca.
— Eu ainda estou de pernas bambas por causa da sua boca. — Sussurro.
— Danny... — Sinto seu corpo se contraindo contra o meu. — Ontem eu... perdi completamente o controle, espero que não tenha sido ruim...
— Você só pode estar brincando! Eu fico arrepiado só de pensar nisso! — Beijo Steve devagar. — Sua boca é tão macia, quente e... bem disposta.
— Tinha muito tempo que eu queria fazer isso... minha cabeça tem uma coletânea especial pra maiores de idade com o seu nome na capa...
— Eu quero realizar cada faixa dessa sua coletânea, quero muito.
— Eu vou cobrar. — Ele me beija. — Agora me diz, o que tirou seu sono?
— Como sabe que eu não dormi demais por causa do martini ou do oral?
— Se ficar me provocando assim, eu vou ser obrigado a fazer de novo!
Sorrio e o beijo. — Eu adoro essa ideia. Mas me diz, como sabe?
— Conheço você. Eu conheço você todo, meu bem. Não parece relaxado como se tivesse dormido demais. Não dormiu demais, só dormiu tarde demais.
Mordo o interior das bochechas e ajeito o cabelo para trás.
— Eu fiz uma coisa. Que talvez... definitivamente, você não vai gostar.
Aquela ruguinha de preocupação que mora entre suas sobrancelhas se salienta, mas sei que enquanto seu corpo pesar sobre o meu tudo ficará bem.
— Você ajudou a Mary, não foi? — Ele pergunta, mas já sabe a resposta.
— Eu fiz uma ligação. Me desculpa, mas...
— Não... não pede desculpas. Eu não tô bravo, se você fez é porque teve motivos pra fazer. Eu confio em você, Amor. Só quero saber porquê.
— Te amo tanto por isso!  — Ele sela nossos lábios. — E amo aquela garota, como se fosse minha própria irmã. E eu sei como é horrível ter medo o tempo inteiro, viver esperando algo ruim acontecer. Como uma nota mental programada pra despertar a cada cinco minutos “será que é agora que vão quebrar meu coração? Será que vai ser na próxima ligação que vão me decepcionar?”.
— Não sabia que ela estava realmente mal com isso...
— Não se culpa, amor. Você não estava com ela ontem, eu estava. O Jordan não apareceu quando ela precisou, nem ligou ou atendeu o telefone. Olhei pros olhos dela e vi que ela precisava de confiança, sabe? Independente de ela estar certa ou errada, ela precisava de alguém segurar sua mão e acreditar nela.
— E você fez isso. Cuidou dela, meu amor. Te amo tanto por isso também!
— Amor, eu não entendi nem gostei da resposta que recebi ontem...
— Então ela estava certa? O que descobriu? — Ele se senta na cama.
— Fica calmo e vamos entender o que houve. Eu pedi a Kono que puxasse os antecedentes de Jordan Mayfail, o problema é que recebi uma mensagem dela com um print de parte da ficha dele quando nós já estávamos dormindo.
— A mensagem te acordou... quando eu já estava dormindo, né?
— É. E me tirou o sono. Porque... Jordan Mayfail nasceu em 1965, e morreu há 16 anos atrás. — Me sento ao seu lado e presto atenção aos seus olhos.
— E se tivesse vivo teria mais de 50 anos... 54 pra ser exato... oh meu Deus... — Lamentou Steve. — Agora entendo porque isso não te deixou dormir.
Meu celular apita e vibra sobre a cabeceira. Uma nova mensagem.
— É da Mary.
— Ela já sabe?
— Eu queria falar com você primeiro, então não.
Destravo o celular. Meu cérebro liga os pontos na mesma hora.
— O que ela disse, Danny?
— “Jordan apareceu. Esperei ele dormir e chequei a carteira dele pra procurar algum recibo que explicasse onde ele foi. Achei o RG. O nome dele não é Jordan. É Jaden Mayfair. Por que ele faria isso, Danny?”
— Jaden?! Não são nomes parecidos demais pra ser coincidência?
— São. Mas não é coincidência. Eu li esse nome ontem. Bem aqui.
Mostro o print que Kono me enviou.
— Jaden Mayfair, filho de Jordan Mayfair. Por que ele usaria o nome do pai que morreu há dezesseis anos, Danny?
— Não sei. Mas tem mais uma coisa. Jordan Mayfair morreu num acidente de carro, e seu filho Jaden, era o único passageiro com ele.
— Vamos até a Mary, Amor. Vamos agora mesmo até a Mary.
...
Joan e Charlie se revezavam no balanço de pneu na entrada de casa, e Grace ficou de olho nos dois enquanto se debruçava na cadeira de praia. Ela estava tão satisfeita com a ida ao Pantage, se sentar na primeira fileira e fazer fotos com o elenco que não se importaria em ser babá pelos próximos dois anos.
Mary abriu a porta de entrada e conversávamos aos sussurros na sala.
— Você tá bem? — Steve perguntou, o rosto atemorizado.
— É claro que sim! O que vocês dois estão fazendo aqui com essas caras?!
— A sua mensagem, Mary.
— Você contou pra ele?
— Tecnicamente, ele descobriu.
Steve estreita os olhos até mim.
— Mas é claro que eu contaria. Ele vai ser meu marido e esse não é ponto. O ponto é que descobrimos quem ele é. Jaden Mayfair, filho do verdadeiro Jordan Mayfair.
— Ai meu Deus... então é verdade! Não foi um erro grotesco do cartório ou algo assim... eu realmente fui enganada...
— Mary, se acalma. Até o momento é só um nome. Não sabemos o motivo disso.
— Só um nome? — Steve me interrompe. — Você tá esquecendo do acidente?
— Que acidente?
— Houve um acidente há dezesseis anos atrás e o verdadeiro Jordan Mayfair morreu nesse acidente. Seu filho, Jaden, era o único com ele naquele carro.
— Ai meu Deus... vocês acham que ele matou o pai? Porque o Jordan... ou Jaden... ele não faria algo assim.
— Pode ter sido só um acidente. Então ele se assustou, e saiu da cidade.
— Mas por que adotar o nome do pai morto?
Ao som da voz de Steve, todos ficamos calados. Não havia resposta pra isso.
— Vamos conseguir respostas direto da fonte dessa vez.
— Não, Mary! — Seguro sua mão e a faço me ouvir.
— Como assim “não, Mary”? Amor, a gente precisa tirar isso à limpo!
— Eu sei, eu sei. Mas estamos falando de alguém que parece fugir progressivamente. Vocês vão colocar ele contra a parede e acham que ele vai simplesmente contar a história da vida dele? Devíamos investigar o acidente, Steve.
Steve fecha os olhos e suspira.
— O Danno tem razão, Mary. Consegue fazer isso?
Mary ainda não havia conseguido verbalizar uma resposta ou sequer assentir com a cabeça. Ouvimos passos se aproximando da sala e vimos Jordan/Jaden de cueca samba canção corar ao nos encontrar com os olhos.
— Bom dia... ai meu Deus, eu não sabia que vocês... é melhor eu me vestir!
— Odeio isso. — Diz Mary. — Mas consigo fazer.
Steve a abraçou.
— Vocês dois se comportem. Eu vou fazer uma ligação. — Beijo a testa de Mary e selo os lábios na boca de Steve.
As crianças brincam do lado de fora e Grace criou uma espécie de esquema de “quem empurra e quem vai ser empurrado” que os dois adoraram. Um jogo.
Faço a ligação e ele atende no primeiro toque.
“Tio D? Tudo bem? Pensei que estivesse curtindo uma com o chefe!”
O rá rá da risadinha do Eric me faz repensar porque eu havia ligado pra ele.
“Primeiro, Eric: Nunca mais diga isso. E segundo: O chefe é meu noivo, então... isso foi nojento. Mas terceiro e antes que eu desista: Preciso de você.”.
...
Naquela tarde havíamos decidido por um passeio em Hollywood, com direito a Placa e um plural de museus. Levamos Joan conosco já que Mary precisava trabalhar. Grace parecia uma guia-turística, e nos explicava exatamente quem eram os donos de cada uma daquelas estrelas douradas cimentadas na calçada.
Sei que parece inveja, mas nunca entendi bem o conceito de ter o nome gravado num pentágono enfiado no chão para que as pessoas pudessem pisar. O que as pessoas fizeram pra merecer isso? Claro que existia todo um sistema triunfal na obtenção da fama, mesmo que às vezes ela pareça acontecer de forma tão programada quanto ser atingido por um meteorito. De toda forma, eu não conseguia me comover por aquela ideia, não mais que por broches de honra que garotos de cinco anos ganham por vender caixas de biscoito.
Eu estava divagando. Sabia disso porque Steve me encarava como um despertador atrasado, como se ele já tivesse dito alguma coisa talvez duas vezes e eu nem tivesse percebido.
— Desculpa, meu bem? Você falou comigo?
— Não sei. — Sua voz saiu musicada. — Perguntei se o amor da minha vida quer cachorro quente, mas com certeza eu devo ter falado com outra pessoa.
— O amor da sua vida, é? — Steve me faria esquecer até das estrelas do céu.
— É. O amor da minha vida. — Steve me laça pelas costas e roça o nariz no meu rosto.
— Ah não. Vocês não vão fazer isso agora! Por favor, esperem pelo menos a gente chegar na estrela da One Direction pra começarem a se beijar!
Charlie e Joan riem até reclamarem da barriga doendo. Eles se tornaram os fiéis escudeiros de Grace, se pudessem gravariam uma estrela no chão para ela.
Steve sorri contra meus lábios e eu sei que vou ter que esperar aquele beijo.
Quando a noite cai, Joan cochila em meu ombro e Steve afivela as mãos de Charlie e Grace nas suas. Charlie não conseguiria dormir essa noite sem colocar os olhos no telescópio do planetário do Observatório Griffith, e Steve sugere que a gente se divida. Ele levaria Joan para Mary, e é claro, já seria a oportunidade perfeita para não deixá-la sozinha caso Jordan/Jaden apareça, e eu termino o nosso passeio visitando estrelas de verdade. Mas eu concordo parcialmente, prefiro ir eu mesmo até Mary. Sinto que comecei aquilo e preciso dar continuidade, além do que, Steve seria passional demais para aquela missão. E convenhamos, ele está falando nomes de constelações há quase duas horas!
Tiro Joan ainda dormindo de dentro do carro e jogo minha jaqueta pelos ombros dela, Mary abre a porta com um semblante triste, que é temporariamente espantado pela visão pacífica da filha dormindo satisfeita, antes mesmo das oito da noite. Coloco Joan em sua cama, acomodo seu cobertor de borboletas e deixo um beijo em sua testa. Mary se senta em uma das cadeiras de praia do lado de fora, levando duas canecas em mão.
Me debruço ao seu lado e recebo a segunda caneca, que tem cheiro de chá.
— Eu tenho que perguntar. Tem algo ilícito aqui dentro?
Mary sorri e dá um soquinho no meu ombro.
— Depende. Você já prendeu alguém por vender laranjas, hortelã e mel?
— Belo argumento, Mary. Belo argumento. — Beberico um gole miúdo, porque os dotes culinários de Mary são totalmente desconhecidos por mim.
— E então? Você provou como se eu tivesse cozinhado inseticida.
— Eu sei... — Solto uma gargalhada curta. — Mas esse negócio é bom!
— Não sei o que Steve fez com você, mas há uns anos atrás você teria cuspido dentro da caneca. Então foi um trabalho bem feito, tenho que dizer.
Sorrio, porque ela está provavelmente certa.
— Outro bom argumento, Mary! E seu irmão fez muitas coisas comigo...
— Argh! Eu não quero ouvir isso! — Ela tapa os ouvidos com força.
— Foi você quem perguntou. — Sorrio com cara de idiota, pensando nele.
— Quando você soube? Quer dizer... quando soube que amava ele? — Sua voz fica sóbria e a ideia de falar em Steve sobressalta meu coração.
— Só pra ficar claro... — Apoio a caneca na cadeira e deito meu rosto virado para o lado, onde Mary faz a mesma coisa. — Eu sempre amei o seu irmão. Como provavelmente eu sempre teria amado esse chá, mas sim, eu teria cuspido no copo há uns anos atrás.
— Quando se deu conta? — Ela estica o braço e deixa sua caneca no chão.
— Quando achei que fosse perder ele. — Encaro as estrelas e por um segundo torço pra que Steve, dentro daquela planetário, sinta minha alma abraçando a sua. — Aí eu percebi que não sabia viver minha vida se não fosse entrelaçada na dele, como se fôssemos costurados juntos e... se arrancasse ele de mim, eu ia começar a desfiar até não sobrar mais nada. Aí eu soube.
— Posso roubar isso e pôr num livro de poemas? Juro que te pago 30% dos direitos autorais se eu ficar podre de rica.
— 50% e fechamos. Você também sente isso com o Jordan, não sente?
— Eu tenho vontade de chorar só de pensar em nunca mais comer do frango balti que ele faz... Eu nem sei o que diabos ele coloca naquilo, mas é tão bom!
— Vamos até o fundo disso, Mary. Ainda não sabemos nada sobre ele.
— Sobre o Jordan? Ou sobre o Jaden? Quem vai aparecer na minha porta amanhã? E quem vai ficar de tocaia por aqui? É seu turno ou do Steve?
Quero abraçar Mary e dizer que isso vai passar, mas vejo que não estamos sozinhos. Jordan/Jaden está estático do outro lado da portinhola da cerca. Ele traz uma rosa em mãos e vejo no rosto sua intenção amigável ser traída, provavelmente veio pedir desculpas por ontem, mas ouviu nossa conversa.
— Jordan ou Jaden?! Mary, você pediu pros policiais me investigarem?
Mary se pôs de pé num estalo, com os olhos inquietos e a boca aberta.
— Não foi bem assim que aconteceu. — Respondo, me levantando.
— Com todo o respeito... Danny. — Ele leva um tempinho pra acertar qual dos dois enxeridos e metidos a policial eu sou. — Eu perguntei pra Mary.
— Não era assim que queria ter essa conversa, Jordan... ou Jaden? — Diz Mary, os lábios trincados pela decepção.
— Você não queria ter essa conversa, Mary. Queria um caso policial.
— Tem razão. Eu pisei na bola, mas você não tá exatamente na posição de me julgar aqui, não enquanto eu não souber como me dirigir à você.
Jordan/Jaden encara os próprios pés. Mais um belo argumento de Mary.
— Eu vou te explicar tudo. — Ele enfim diz. — Quando ele for embora.
Seu olhar aponta para mim. Os olhos de Mary também acabam em mim.
— Eu sei que você não me conhece, mas vou te contar uma coisa sobre mim. — Digo. — Eu nasci numa família de quatro irmãos, mas quando meu irmão mais novo teve problemas, eu fiquei distante e acabei tendo que aceitar o fato de que nos tornamos três. Mas agora, eu olho pra Mary e sinto que tenho três irmãos de novo. E isso significa que eu não vou embora de jeito nenhum.
Jordan/Jaden assente. Mary me olha agradecida, mas ainda temerosa.
— Tudo bem. Aprecio o fato de que você tem pessoas que cuidem de você, Mary, só queria que soubesse que eu também queria cuidar. Eu amo você.
Mary deixa algumas lágrimas escaparem.
— Ótimo. Agora entra, senta e começa a falar. — Puxo a portinhola.
Queria fazer as coisas no meu modo, mas pelo visto vai ser do modo Steve.
Joan dormia no quarto em seu universo púrpuro de sete anos. Por isso, continuamos do lado de fora. Mary se sentou ou deixou o corpo cair logo em uma das cadeiras e eu conduzi Jordan/Jaden com o olhar para a outra cadeira. Uma acareação pronta para acontecer e eu entre ficar de pé ou aconchegar a bunda num pneu. Algo que terminaria com minha reputação de policial mau.
Por isso fico de pé, as mãos na cintura e o olhar impertinente.
— Eu não sou americano, nasci na índia e quando meu pai disse “vamos para a américa”, pensei nos filmes. Nova York, Vegas ou aqui. Mas fomos parar no Tennessee e minha infância não foi exatamente a mais fácil do mundo. Eu era confundido com um terrorista e nem valia a pena explicar que fui criado como um hinduísta atuante que crê no Universo e defende a não-violência. Quando tinha vinte anos, vi minha mãe receber o homem que empregou meu pai, intimamente no quarto dos meus pais. Me pareceu muito claro o que eu deveria fazer. Meu pai me colocou no carro, precisava de ajuda no trabalho. No meio do caminho eu contei o que tinha visto e ele... perdeu o controle do volante. Acho que não conseguiu puxar o freio a tempo, foi parado pela frente de outro veículo. Morreu na hora. Minha mãe nunca mais conseguiu olhar pra mim. Eu contei a verdade aos policias, disse que foi minha culpa. Depois caí na estrada e comecei a sobreviver longe do julgamento nos olhos da minha mãe, longe do tal benfeitor que prometeu ajudar meu pai e acabou se deitando no lugar dele.
As mãos de Mary tremiam deitadas sobre o rosto desde metade da história.
— Sinto muito, Jaden. Só não explica a Mary te conhecer como Jordan.
Jaden assente. — Eu não conseguia me estabelecer em lugar nenhum. Era sempre questão de tempo pra alguém jogar meu nome na internet e encontrar uma manchete, mas eu não conseguia lidar com isso, queria enterrar meu passado, detetive. Conheci a Mary no meu primeiro dia de trabalho no abrigo, o salário era ruim, mas ela era amável comigo. Elogiava meus piores trabalhos. — Mary sorriu. — E eu senti que era um sinal. Uma espécie de segunda chance. Mas não queria que ela encontrasse as manchetes um dia, então entrei em pânico e o primeiro nome que passou pela minha cabeça foi o do meu pai, um minuto depois percebi que era um tiro no pé, porque também teria o nome dele no jornal, mas já era tarde demais. Meu passado é uma droga, Mary. Mas queria que meu presente e futuro fosse melhor e tivesse você e a pequena Joan.
Espero Mary chorar e correr pros braços dele, mas ela é uma garota durona.
— Pra onde vai quando some e não atende minhas ligações? E por que você tem meia dúzia de empregos e mora num loft quase vazio? O que você faz?!
Os olhos de Jaden se fecham pesarosos, como se aquela próxima parte pudesse ser ainda pior. E ela era. — April Lee Jones. Dezessete anos.
— Ela dirigia o outro carro? — Pergunto, compreendendo o que houve.
Ele assente com repugnância para com seu próprio pensamento.
— Era uma aluna exemplar que nunca chegou na sua formatura. Porque um carro desgovernado a arrancou da pista e... causou uma lesão na sua medula. As despesas médicas são absurdas e eu sempre ligo, peço informação pra uma enfermeira que já se acostumou comigo e faço depósitos, anonimamente.
Sinto um arrepio sórdido correr pelo meu braço e meu estômago embrulha. Às vezes acidentes são apenas acidentes, uma roda precisa ser substituída, a lataria necessita de reparos. Outras vezes, são vítimas fatais e paralisia. Jaden não era nem um mentiroso nato nem um mal caráter. Ele era um sobrevivente.
— Eu sinto muito mesmo, Jaden. — Digo e percebo todas aquelas chamadas perdidas no meu telefone. — Tenho que ir, Mary. Steve precisa de mim.
— Danny? — Ela me chama como se mal lembrasse como organizar a voz e formar palavras. Seus olhos me dizem obrigada, os meus dizem não há de quê.
E não havia mesmo.
...
A última coisa que eu precisava depois do relato que ouvi, era descobrir que perdi cinco chamadas de Steve e que sua única mensagem era de meia hora atrás, pedindo para eu encontrá-lo na recepção do Children’s Hospital.
Liguei para ele durante todo o percurso, mas o telefone não chamava. Dei uma gorjeta de vinte dólares para o motorista do uber porque não conseguia esperar o troco. Corri pela entrada do hospital e só voltei a respirar quando vi Steve sorrindo para Grace, eles dividiam os fones de ouvido e eu tinha certeza de que ouviam a trilha sonora de Hamilton, enquanto Charlie dormia no colo de Steve, com apenas um curativo de quatro centímetros no joelho esquerdo.
Eles só percebem que estou ali quando coloco minhas mãos trêmulas na cabeça de Charlie, sentindo seu pulso e temperatura tudo ao mesmo tempo.
— Ele está bem? O que aconteceu?
Vejo a expressão de Steve ficar preocupada e em pânico quando ele encontra meus olhos e Grace segura seu braço tentando consolá-lo.
— Ele está bem. Estávamos no planetário, que fica escuro a noite e o Charlie tropeçou. Eu o trouxe pra que examinassem seu joelho. O médico disse que foi superficial, mas não podiam liberá-lo sem um responsável legal presente.
Assinto e suspiro profundamente, tentando tirar da minha cabeça todas as ideias horríveis que acumulei nos trinta minutos da casa de Mary até aqui.
— Por que não me ligou, Steve? Eu quase arranquei o volante do uber!
— Pai, se acalma... — Pediu Grace. E ela nunca me chamava de pai.
Era como uma punição. Eu estava sendo idiota e deixava de ser o Danno.
— Tentei te ligar, você não atendeu. Continuei tentando até ficar sem carga. Grace não tinha sinal, então tivemos que esperar você pegar minha mensagem, porque eu não podia sair, e nem ia deixar as crianças aqui longe de mim.
A expressão de Steve corta meu coração.
— Com quem eu falo para a gente ir embora daqui?
Steve apontou com a cabeça para uma das recepcionistas.
— Eu sinto muito... — Sua voz sai abatida, e eu só quero ir embora dali.
Vou até a recepcionista. Ela chama pelo médico. Ele me oferece a mão.
— Boa noite. Sou o Doutor Palin. Você deve ser o Sr. Williams?
— Sim, sou o pai do Charlie Williams. É um prazer.
— Vejo que está apreensivo, mas não tem motivo para isso. Seu filho está ótimo, foi só uma escoriação na pele. Uma semana e nem vão se lembrar disso.
— Obrigado, Doutor. Foi um dia cheio... será que podemos ir pra casa?
— Claro! Me perdoe fazer você vir até aqui. São os protocolos, embora o seu filho tenha dito que aquele é seu segundo pai, eu tenho que seguir as normas.
— Ele disse isso? — Sinto meu rosto queimar, como se toda a emoção daquela noite se acomodasse por trás de meus olhos em forma de lágrimas.
— Disse. Por quê? Ele não é? — Pergunta o médico com olhar desconfiado.
— Ele é! — Sorrio. — É só que... é a primeira vez que um deles diz isso.
Acho que o Doutor Palin finalmente compreende minha comoção.
— Ele agiu como tal. Só um pai me deixa louco por causa do raio-x de um joelho ralado. Seu filho está em boas mãos. Tenho que ir. Boa noite.
O médico se foi sem eu ter certeza de que ele ouviu meu agradecimento.
Olhei para trás e vi Steve desviar o olhar cabisbaixo. Grace mantinha o braço pendurado no dele e repousava a cabeça em seu ombro e Charlie continuava dormindo calmamente em seu colo como se fosse um bebê muito grande.
O segundo pai dos meus filhos. Era exatamente isso que ele era.
...
— Então quer dizer que o único erro do Jordan-
— Jaden. — O corrijo.
— Jaden... foi querer recomeçar?
— Foi. Eu devia ter ouvido você, Steve. Elas não estavam em perigo, e eu sou o cara que invadiu a privacidade dele por um favor. — Encaro o teto.
— Hey! Não seja duro consigo mesmo. Eu tenho orgulho do que você fez. — Eu acho que ele tinha mesmo algum orgulho, mas disse isso encarando o teto.
— Tem orgulho de eu ter provavelmente destruído o namoro da sua irmã?! — A exaltação me faz virar a cabeça e espiá-lo, ele é rapidamente recíproco.
— Danno... posso dizer uma coisa sobre você? — Ele se vira para mim.
Seu rosto lindo que não me beija há horas se acomoda no travesseiro. As pontas dos dedos capazes de incendiar meu corpo se ajeitam frias no lençol, meu corpo congelando sem o toque de suas mãos correndo por todo lado.
Espelho sua imagem, me deitando com o corpo voltado para ele e assinto.
— Você é incapaz de destruir qualquer coisa.
Fecho os olhos e sinto a onda de paixão que suas palavras provocam em mim, mas elas ricocheteiam em minha consciência que nega imediatamente.
— Você ouviu o que eu acabei de te contar? Eu fugi da casa da Mary, Steve. Você, suas ligações foram praticamente o meu álibi de detetive fracassado.
— Você está sendo tão duro consigo mesmo, Danny. Você não causou o acidente. Você não mentiu pelo Jaden. Você nem mesmo duvidou de verdade dele. A única coisa que você fez foi confiar e proteger a nossa família. Você fez a minha irmã sentir o que eu nunca soube fazer, que ela não está sozinha. E eu admiro tanto você, tanto... que é difícil ser o cara que tenta ser bom como você... — Linhas se formam entre suas sobrancelhas e seus olhos ficam úmidos. — É difícil ser o cara que tenta ser metade do que você é. É difícil ser o parceiro do detetive cujos instintos nunca falham, é difícil ser apaixonado pelo homem mais puro que conheço, é difícil ser o padrasto dos seus filhos...
— Não seja. — Mordo meu lábio semi aberto, por onde o ar escapa enquanto meu coração pulsa desesperado, tentando escapar a qualquer custo do peito.
— Quer desistir? Você... tá desistindo da gente? — Pânico. Puro pânico.
— Não, Steven. Eu nunca vou desistir de você, nem de mim ou da gente.
O ar retorna ao seu corpo.  — “Não seja”? O que não devo ser?
— Padrasto. Não seja o padrasto dos meus filhos. — Seguro seu rosto pelo queixo e me aproximo de seus lábios. — Seja o segundo pai dos nossos filhos?
— Danny...
Tem algo de magnífico em encher os olhos de outra pessoa com lágrimas que nascem num sorriso. Algo de mágico em ouvir seu coração bater sem precisar de uma ferramenta pra isso. Algo de mágico em amor correspondido.
— Padrasto é assustador e tio é pouco demais. Eu quero te dizer isso desde que chegamos em LA. Sei que parece que estou te pedindo o mundo, mas não é nada que você já não faça. Você já é o pai do Charlie e da Grace, ao meu lado. Somos os pais deles. É em você que o Charlie pensa quando vai entrar numa corrida, é em você que a Grace pensa quando quer mostrar uma nova música.
— Isso não... te incomoda nenhum pouquinho?
— Não! — Nego com a cabeça e sorrio. — Eu me sinto... em paz!
— Em paz? — Ele sorri, como se esse fosse o melhor momento de sua vida.
— Sei que não demonstrei isso hoje. Eu entrei em pânico com o que houve com o Jaden e nossa comunicação foi péssima. Mas não foi sua culpa e você foi maravilhoso. Você é maravilhoso, Steve. Comigo, com a Grace e com o Charlie. Você viveu sua primeira crise hoje e lidou com a situação, como eu sempre soube que você faria. Por isso eu fico em paz. Eu achei que tinha que dar conta de tudo sozinho, Steve, e é pesado, você viu, mas você presta atenção em coisas diferentes que eu. E não existe rivalidade nisso, nós somos um time e tudo o que fazemos é melhor quando fazemos juntos. Não quero o amor deles todo pra mim, eu quero que eles tenham o máximo de amor que for possível, e é isso que nós dois somos juntos. Nós somos o máximo de amor que eu conheço. E eu morro de medo de perder você, Steve. Eu morro de medo de estar te pedindo demais, te pedindo o mundo inteiro e fazer você tirar esse anel do meu dedo...
— Meu amor, presta atenção. — Seu corpo pesa sobre o meu. —  Quando coloquei esse anel no seu dedo, eu me entreguei todo pra você. Se você me pedir o mundo, eu te dou. Eu te dou todo o meu amor, e tudo o que eu quero é cuidar de você e da nossa família. Ser o seu marido e o pai dos seus filhos... Eu nunca tive uma família, mas eu também nunca quis como eu quero essa família.
Seus lábios se enroscam nos meus, urgentes como só ele sabe fazer. Sua língua massageia minha boca e eu desenho sua extensão em meus lábios.
— Steven Jack McGarrett, você vai ter que se casar comigo!
— Eu vou. Agora me diz tudo o que você quer e eu vou fazer, meu amor.
— Eu quero deitar no seu colo, Steve. Quero fazer carinho em você daquele jeito que você gosta, e sentir sua boca na minha até a gente adormecer juntos.
— É tudo o que eu quero também, meu anjo.
Foi a primeira vez que fui seu anjo e todo dia é nossa primeira vez em algo.
Ele se deita e me estende o braço como travesseiro, eu me deito em seu peito, ouço o farfalhar intenso do seu coração, o sangue correndo em suas veias. Deslizo as pontinhas dos dedos por seu peitoral, movimentos circulares que sei que ele adora e procuro por sua boca, como um peixe procura pela água.
— Me beija até me convencer de que você é meu?
Ele sorri e me beija, diz que me ama até que suas palavras se repitam em minha mente depois que o sono me carrega, e eu continuo nos braços dele.
...
Acordo com a impressão de que havia alguém martelando em algum lugar. Meus dedos estão repousados no pescoço de Steve, e percebo que passei a noite toda deitado em seu ombro, de onde não quero nunca mais sair.
As marteladas recomeçam. Steve se mexe abaixo de mim. Elevo a cabeça até ele e o vejo me espiar com apenas um olho aberto e interrogativo.
— Ouviu isso?
— Acho que bateram na porta.
— Somos nós! Estão vestidos? Nós queremos entrar! — Grita Grace.
— Estamos vestidos, princesa! — Steve responde. — Pode entrar.
— Você ainda dá corda pra eles. — Resmungo, mas ele me ignora.
Charlie passa pela porta e a segura para Grace que surge com uma bandeja.
— Vocês tinham alguma dúvida, até agora, de que somos os melhores filhos do mundo? — Pergunta Grace, trazendo a bandeja até a escrivaninha.
— Eu tinha. E você, Steve?
— O que o Danno quis dizer foi “Não. Vocês são os melhores filhos do mundo!”.
— Exatamente. Mas isso depende do que tem nessa bandeja aí. — Estico o pescoço na tentativa de enxergar o conteúdo das tigelas. — Uau... cereal?!
— Eu achei uma ideia muito original. Dou cinco estrelas pra vocês!
— Um serviço de quarto muito requintado! — Faço um biquinho.
— Então... vocês dois estão bem de novo, certo? — Pergunta Grace.
Agora eu entendi o motivo do café da manhã surpresa na cama: Inspeção.
— Quem? Seus dois pais? — Pergunto e mordo a língua, quando Steve fica completamente sem ar e Charlie deita a cabeça com as maçãs do rosto corando.
— Vocês mesmo. Nossos dois pais. — Responde Grace, na pulsação exata.
— Nós nunca estivemos tão bem, meu amor. — Diz Steve, apertando o braço em torno do meu corpo, que continua enrolado e quente contra o seu.
— Ufa! Sem pressão, mas por favor fiquem juntos pra sempre! — Ela pede.
— E você, campeão. O que acha disso? — Pergunta Steve.
— Eu amo ter dois papais, e quero que fiquem juntos. Pode ser?
— Oh, eu acho que nós podemos fazer isso. O que você acha, Amor?
— É tudo o que eu quero. Além de um beijo de bom dia de cada um de vocês três. — Responde Steve, puxando Charlie e se escondendo na camisa dele.
— Bom dia, Papai Danno e bom dia Papai Steve! — Ele sorri e deixa um beijo em Steve, que está enfrentando uma barra para segurar o choro.
— Como tá o joelho, Campeão? — Ele funga e é exatamente adorável.
— Tudo bem, nem dói mais.
— Esse é o meu garoto. Cadê o beijo do Danno? — Peço, e Charlie vem.
— Bom dia! Será que eu também posso te chamar de Papai Steve ou eu tô velha demais pra isso? — Grace também segura uma emoção pertinente.
— Você sempre vai ser a minha garotinha! — Steve desiste de segurar.
— Eu amo você... Papai Steve. E te amo também, Danno! Amo vocês!
Grace deixa um beijo em cada um de nós e finalmente entendo como ela sempre esperou por esse momento. Sempre soube que Steve e Grace tinham um lugar no coração um do outro, mas entendo que são pai e filho de almas.
— Se a gente acordar tarde amanhã de novo, vocês fazem ovos mexidos?
— Não, Danno. Só viemos ver se estavam bem. Missão cumprida, Charlie! Ah, e a Tia Mary ligou convidando a gente pra jantar na casa dela.
Meus olhos correm pra Steve, tão surpreso quanto eu.
— Pede pra ela não queimar o jantar dessa vez. — Digo, e Steve sorri.
— Sabe o que eu reparei? O meu futuro marido não me deu um único beijo de bom dia! — Steve faz uso de sua feição bela e ofendida.
— Você só quer um? Eu posso fazer melhor do que isso...
— Charlie, essa é a nossa deixa. Quando começam a se beijar...
— Eles não param mais. Eu sei. Vamos ver TV.
— Não fiquem trancados no quarto o dia inteiro, crianças. — Diz Grace, antes de fechar a porta.
— Nós amamos vocês! — Grita Charlie.
O estalinho da língua da fechadura se encaixando na esquadria da porta, nos deixa mergulhados em pleno silêncio.
— Uau... — Diz Steve com fogos de artifício dentro dos olhos.
— Eu sei. Quais as chances de termos filhos que fazem cereal só pra vir investigar nossa vida conjugal? — Me viro para ele sem abandonar seu colo.
— Eles amam a gente, Danno...
— Você está ultrapassado. O termo correto é shippam.
— Grace tem razão. Você é uma criança, sabia?
— É você que só porque tem dois filhos, tá agindo como um velho!
— Meu Deus... eu tenho dois filhos! — Steve abre um sorriso gradativo. — Nós temos dois filhos, Danno! E vamos nos casar e ficar juntos pra sempre!
— Temos dois filhos que shippam a gente! E vamos nos casar pra sempre!  Nem acredito que vou me casar com o homem mais lindo que conheço...
— Eu sou o homem mais lindo que você conhece, meu bem?
— Com certeza, mas não precisa ficar metido. Eu só estava pensando alto...
— Eu também vou me casar com o homem mais lindo e sexy que conheço.
— Ele parece um cara de sorte!
— Não é sorte, são os olhos. É impossível não se apaixonar por eles...
Eu o beijo. Amo quando Steve fala dos meus olhos e ele já sabe disso.
— Bom dia, meu amor! — Digo finalmente. — Eu te amo. Eu te amo. Eu te amo. — Intercalo minhas declarações de amor com beijos curtos e molhados.
— Uau... Bom dia, meu anjo lindo. Nem sabia que podia me apaixonar mais.
Dessa vez ele é quem me beija, segurando meu rosto entre os dedos. Meu telefone resmunga sobre a cabeceira. Solto um gemido indisposto. Steve me abraça para que eu não caia de cima do seu corpo e estica o braço até o móvel
— É o Eric.
Meus olhos saltam.
— Oh... Eu me esqueci completamente do Eric! Põe no viva-voz, por favor?
Steve atende a ligação e a transfere do alto falante, como eu pedi.
— Bom dia, Tio D!
— Bom dia, Eric! Por favor não faça nenhuma piadinha idiota sobre o meu chefe porque ele está segurado o celular e você está no viva-voz. Agora pode falar...
— Opa! Sinto que atrapalhei um momento... particular... íntimo. Devo retornar?
Refiro os olhos. Eric realmente não entende meu idioma.
— Oi Eric, é o Steve. Pode falar, garoto, nós estamos ouvindo você.
— Okay, o Tio D parece estar com a boca ocupada, mas ele pode me ouvir.
Espalmo o peitoral de Steve.
— Eric Russo! Fala logo antes que eu faça o Steve te demitir!
— Calminha, eu só estava brincando. Então... Eu estou no Tennessee e embora as pessoas por aqui pareçam um pouco hostis, elas são muito piores que isso! Mas vamos lá, conversei com o policial responsável pela investigação do incidente que tirou a vida de Jordan Mayfair. Depois que ele se lembrou de que caso se tratava, me contou que o filho, Jaden Mayfair, confessou ter roubado a atenção do pai durante o percurso e disse com essas palavras “É minha culpa.”. Mas como eu sou um perito criminal de ponta, fui atrás do veículo, que foi apreendido e guardado num depósito cheio de animais peçonhentos. Vocês não vão querer ouvir os detalhes, mas passando pra frente, eu encontrei o carro. Embora o automóvel esteja deteriorado pelo tempo, seus circuitos internos estão intactos, provavelmente porque cobras ainda não sabem dirigir.
— O que sua análise forense diz, Eric? Qual sua opinião profisisonal?
— Que há um defeito de fabricação no veículo, Chefe. — Meus olhos buscam Steve. — Eu pesquisei e esse não é o único modelo da época com problemas de desempenho, mas foi o que rendeu o acidente mais grave. O freio emperrou, porque há um atraso na fricção do mecanismo, a resposta é realmente lenta.
— Quer dizer que Jaden Mayfair não causou o acidente? — Pergunto.
— Não, tio D. Ele não teve culpa alguma. Foi uma falha mecânica infeliz.
— Ooohh... — Me desmonto em alívio. Jaden não causou o acidente!!!
— Isso foi um gemido? Gente, eu ainda tô por aqui.
— Você, garoto, é o melhor perito criminal que conheço! Muito obrigado!
— Obrigado, Chefe. Meus dotes profissionais estão a sua plena disposição!
— Eric, para de puxar saco. E escuta o que vou te dizer. Você fez um excelente trabalho, garoto. O tio D tá muito orgulhoso, agora saia desse ninho de cobras e eu vou desligar porque preciso beijar meu noivo, tudo bem?
— Missão privacidade para o sexo acontecer em 3, 2, 1..
Eric desligou o telefone.
— Viu o que você fez?!
— Eu sei, esse garoto é muito abusado mesmo.
— Eu tô falando da investigação, meu amor! Você descobriu a verdade, Detetive. Vai tirar dezesseis anos de culpa das costas de alguém inocente!
— É... Eu não vejo a hora de contar isso pro Jaden.
— Vou ligar pra Mary e garantir que ele vá.
— E ela vai ter seu felizes para sempre!
— Graças a você, meu anjo.
...
Aquela tarde era um campo vazio no nosso cronograma, mas Steve conseguiu transformá-la em uma experiência realmente proveitosa para as crianças. Ele nos fez tapar os ouvidos enquanto dizia nosso destino para o taxista, e só descobrimos o que íamos fazer quando chegamos no Echo Park. Compramos todo tipo de comida que os ambulantes estivessem dispostos a vender, mas os tamales mexicanos foram a melhor parte gastronômica do passeio, comemos amontoados na área gramada bem na beira do lago Echo, que parecia vestir um manto elegante cheio de flores de lotus cor-de-rosa.
Havia água por todo lado, e o lago podia até ser fundo e ter uma camada polida de lodo cobrindo a superfície, mas as flores nasciam do mesmo jeito. Compreendi o recado dele, e a minha pele florescia onde seus dedos tocassem.
Tínhamos uma ou duas horas até o jantar, tempo suficiente para descansar e se arrumar, mas quando entrei no quarto trancando a porta, eu queria mais. Reparei que a luz que entrava pela janela já havia enegrecido, ouvia as gotas d’água chovendo na banheira, a porta foi deixada aberta e a neblina suave que umedecia o ar denunciando o banho quente. Foi suficiente. Era um convite.
As formas que Steve encontra para se comunicar comigo sem usar palavras são fascinantes. Eu ultrapasso a porta do banheiro vestindo apenas minha aliança de noivado e o encontro deitado como uma pérola dentro de uma ostra. As costas repousadas no acrílico da banheira de hidromassagem, os braços abertos acompanhando a borda oval, uma das pernas dobradas deixando o joelho acima do nível da água clara salpicada pela espuma branca.
Ele ergue o pescoço e inclina a cabeça para me encontrar. Seus olhos procuram meu rosto, mas escorregam pelo meu corpo, ele segura o lábio nos dentes. Quero ficar ali um pouco mais só absorvendo a imagem daquele homem lindo me olhando no meio do caminho entre incompreensão e concupiscência.
— Oi meu amor. — Ele passa a mão no cabelo molhado, empurrando-o para trás, os músculos do seu braço se contraem. — Quer um banho de chuveiro?
Seus dedos fincam nas bordas e seu corpo se prepara para se levantar.
— Quero que fique exatamente onde está. — Minha voz vibra trêmula.
Seus dedos se desfazem da borda, e sua respiração se torna profunda, enquanto seus olhos me examinam curiosos e cheios de expectativa.
Caminho em busca dos degraus de mármore e só o que consigo reparar é no desenho esculpido em seu corpo, abaixo das tatuagens, sua pele é resultado de uma caligrafia elegante, grafite de ponta fina, esfumado nos vãos que a água encontra para escorregar. Vejo as duas pontas nítidas do cálice desenhado em seu tórax, sulcos arraigados no fim do seu tronco, queria ver onde terminam. Ver se ele repousa tranquilo no banho morno ou se queima mais que a água.
Ele ergue o braço em minha direção, a palma da sua mão faz um carinho breve na parte baixa da minha cintura e ele me oferece sua mão aberta.
— Quer que eu diminua o volume d’água? Ou mexa na temperatura?
Eu o entrego minha mão. A sua me recebe, seu polegar sempre carinhoso.
Passo a perna direita para dentro, sinto o choque térmico e só então entendo que há uma camada grossa de pavor congelando minha pele. Mais uma perna. Sinto a água lamber meus pés, ondas traiçoeiras escalam meus calcanhares Lembranças terríveis batem na porta, dedos pálidos arranham meu cérebro.
— Tudo bem se não estiver pronto, meu amor. — Sua voz é tão doce.
Eu me sento e sinto as ondas irem e virem sobre meu corpo gelado. Já engoliram minhas pernas, minha pelve e querem todo o resto, mas me acomodo entre as pernas de Steve e debruço as costas em seu tórax bem desenhado.
— Eu sei que não vou estar pronto pra água salgada tão cedo, e talvez precise de algumas seções de terapia pra voltar um dia, mas agora eu só preciso de você, Steve. — Minha voz tropeça no ar. — Você é o meu porto seguro. Dentro dos seus braços eu me sinto tão seguro! Eles espantam minha insônia, e tantos outros medos... Não vai ser esse que vai tirar isso de mim.
— Eu tô aqui, meu amor. Eu vou segurar você pro resto de nossas vidas.
Steve roça as pernas nas minhas e me abraça apertado contra seu corpo. Num segundo eu só conseguia lembrar da água entrando pela minha boca, do meu peito gritando por um punhado de oxigênio, da minha garganta se fechando, da minha visão perdendo a cor... mas então me lembro do rosto dele. Os olhos verdes aflitos, os cílios encharcados, a boca aberta e o seu beijo. Sua voz falha me pedindo perdão até eu ter certeza de que estava vivo e estava bem melhor do que isso, aninhado em seus braços e sua boca ali presa na minha.
Sinto o ar entrar mais sossegado em meus pulmões, e acaricio seus braços.
— Não quero estragar o momento, Steve, mas você é muito gostoso.
Ele sorri aliviado contra minha nuca. Sinto o ar quente de seu hálito em meu pescoço, minha pele fica elétrica e um arrepio percorre todo o meu corpo.
— Não estragou, mas talvez eu faça isso, porque você é uma delícia.
Ele beija minha nuca. Faz meu pescoço se contorcer como ele deseja.
— Amor... sua boca, seus dedos, suas mãos... eu só quero sentir você.
— Eu tô bem aqui, meu lindo. Consegue me sentir assim?
Ele continua me segurando firme com uma das mãos, a direita sobe até minha cabeça, bagunça meus cabelos contra a raiz, sua boca logo atrás seguindo seus dedos, traçando uma trilha de beijos molhados em minha nuca.
— Oh... Eu consigo, Amor. Mas só me faz querer sentir mais...
Seus dedos datilografam meu corpo. Massageiam meus ombros, correm pelos meus braços, descendo até as mãos e retornando ao meu peito, seus dedos brincam em meus mamilos. Meu corpo contrai, minha respiração arqueja.
— Quer me sentir um pouco mais pra baixo, meu amor?
Sua mão desliza leve pelo meu abdômen e repousa firme na parte mais baixa.
— Quero. Eu com certeza quero sentir você ainda mais em baixo...
— Gosta disso? — Vejo sua mão linda e viril mergulhar dentro d’água. Sinto ele agarrar meu pênis e arfar, sentindo o desejo que já tomou conta de mim. Seu polegar acaricia a fenda em minha glande, uma sensação maravilhosa.
— Gosto... — Minha voz sai manhosa. — Mas quero mais...
— É isso que você quer? — Sua mão escorre para a raiz do meu pênis e ele caminha pela primeira vez para cima, levando a pele superficial junto da palma de sua mão, e a trazendo de volta me causando um preciso espasmo de tesão.
— Oh meu amor... Por que tudo o que você faz é tão gostoso?!
— Porque eu adoro fazer você gemer pra mim, meu amor...
Seus dedos abraçaram meu pênis com certa gentileza que lhe era natural, casado a movimentos precisos que se repetiam levando a pele da raiz à ponta. E cada vez que a parte externa de sua mão batia em minha virilha, eu gemia.
— Oh S-Steve...
Sentia sua respiração arfar em minha nuca. Sentia ele crescer contra mim.
A fricção da palma de sua mão com a pele quente e macia do meu pênis rendia estalos estimulantes na superfície da água. Eles se inflamavam gradativamente, me faziam lembrar das suas pernas batendo em minhas coxas.
— Você não faz ideia de como é sexy... Eu fico louco ouvindo você gemer.
Os estalos se tornaram batidas bem definidas que espirravam água pelo cômodo, e eu sabia que logo esse deixaria de ser o único líquido jorrando ali.
— Amor? — Seguro sua mão antes que ele me leve a um orgasmo iminente.
— O que deseja, meu bem? — Ele beija minha nuca, já sabe o que eu desejo.
— Eu quero você, Amor. — Viro o corpo de frente para Steve.
— O que exatamente você quer, meu bem? — Ele arfa.
— Eu quero você dentro de mim. Quero transar com você aqui e agora.
— Quer? — Assinto. — Vou cuidar de você com muito carinho, Lindo.
Ele encaixa minhas pernas em torno de sua cintura e acomoda o pênis dilatado e conciso contra mim. Sua glande pede passagem, ele me abre.
— Oooh S-Ste Steve... — Minha voz arfa trêmula. — Mais... por favor...
Sinto ele crescendo, deliciosamente, dentro de mim.
— Oh Danny... que delícia... Você gosta disso? — Ele me avaliou, rouco.
— Eu a-adoro seu pênis entrando... dentro... de mim. Mas quero mais...
Ele é forte e me segura onde quer, vai controlando o prazer que me dará.
— Assim está... gostoso? Eu não quero machucar você, meu amor...
Seu pênis derrubava camadas de pudor dentro de mim, até eu só pensar nele.
— Tá m-muito gostoso. Mas você s-sabe que eu quero todo, Amor...
— Hunnnnnn... e agora, delícia? — Ele me deixa sentar em seu colo.
— P-Porra... que gostoso você metendo devagar... oh amor...
Steve se move gentilmente deslizando o pênis dentro de mim. Meu corpo se arrepia, minhas costas arquejam e aos poucos ele passa a me estocar decidido.
— Ahn ahn... — Ele geme compassado. — Você gosta assim, meu Loirinho?
— Eu a-adoro uh sentir uh você metendo uh seu pênis gostoso uh em mim...
— Ahn meu amor... Você é tão lindo... me deixa louco quando fala assim.
Era difícil conversar. Steve sabia mesmo como me deixar excitado.
— Agora eu quero saber... se você, meu noivo, gosta disso?
Rebolo devagar com todo o seu conteúdo colossal acomodado dentro de mim. Ouço ele arfar e suspirar sofregamente. — Você é tão gostoso, Danny...
— Eu sou, é? E o que acha disso? — Me seguro na beira da banheira e elevo o corpo caindo sentado em seu pênis, repito o processo até estar cavalgando em seu colo. Ele segura meu pênis, em resposta, e me masturba decididamente.
— Ooooohh.... porra Danny... que delícia... ahn ahn ahn ooohh....
— Ahhhh você vai me foder com seu pênis e ainda me masturbar, Amor?
— Danny... eu vou te dar todo o tesão que você merece, meu amor...
Dito isso, ele me estoca na pressão correta, masturba meu pênis me deixando livre pra abraçar seus ombros e gemer enquanto chupo a pele do seu pescoço.
— Oh Steeeve... oh S-Steve... — Aquilo era tão gostoso!
— Oh Danny... que delícia... oh...
Seguro firme em seu pescoço e pulo sobre seu pênis. Sinto ele se contrair. Em resposta ele organiza suas forças e me estoca com precisão acertando minha próstata repetidas vezes. Meu corpo rugindo implorando pelo orgasmo.
— Oh Steve... Eu preciso...
Ele me abraça e diz no meu ouvido: — Goza. Goza no seu noivo?
— Gozo meu amor, mas me beija ou vou fazer muito barulho.
Ele sorri, a boca aberta de desejo, mel lhe escorrendo pelos lábios quando eles se enfiam nos meus. Passo meus braços por seu pescoço e o beijo.
— Oooooohhhh!!! Ahn ahn... S-Steve... ahh ahn ahn que tesão...
— Uau... porra... que delícia Danny... eu t-tô gozando dentro de.... você...
Ver Steve perder o controle era a parte que mais fazia minhas pernas tremerem. Ele não abandonava seu modo gentil, mas se tornava urgente. A pele do seu pescoço estava quente e vermelha e ele descia os dedos pela bagunça que fiz em seu peito, mordendo o lábio e ofegando em minha boca.
— Caramba... Meu amor, que bagunça que a gente fez...
— É, meu anjo, mas você tinha razão. Tudo que fazemos é melhor quando fazemos juntos. Eu te amo, Daniel. Isso foi...
— Maravilhoso, Steven. Transar com você é maravilhoso.
— Ver você gozar é o suficiente pra me levar ao orgasmo na mesma hora...
— Eu te amo, Steven. Amo tudo em você, amo conhecer você todo dia mais.
— Eu te amo também, Danno. Amo o seu corpo todo, amo transar com você.
— Eu sou seu e eu amo ser seu.
— Eu também, meu amor. Eu também.
Ele se arrepia quando eu convido sua língua pra minha boca e digo:
— Acha que a Mary tá tentando rastrear a gente?
— Ela provavelmente já acionou a polícia.
— Ainda bem que nós somos a polícia.
— Somos. — Ele nem sabe do que estamos falando, mas sua língua diz sim.
...
Optei por uma camisa de seda azul eclesiástico, cuja manga eu gostava de dobrar suspensa abaixo dos cotovelos, o tecido era gostoso e se acomodava ao meu corpo como um lençol macio onde parte de mim queria estar com Steve. Pra ele, escolhi uma camisa rosê de tricoline leve, que realçava seus músculos.
Nosso banho legítimo foi rápido, a fim de tirar o aroma de sexo do corpo. Mas sabíamos que ele continuaria intacto dentro do cômodo, então fechamos o quarto após sairmos afetuosos e meio lentos, exalando sabonete e perfume.
Grace e Charlie estavam enfiados no sofá com aquelas caras de quem esperou tempo demais. Tiraram os olhos dos aparelhos eletrônicos e nos encararam.
— Até que enfim!!! — Charlie se levantou num pulo.
Steve me encarou hesitante, roçando a nuca e sorrindo no canto do rosto.
— Será que sobrou água no planeta pra Mary fazer o jantar?
Pergunta Grace, confirmando nosso uber e nos guiando pra fora.
...
Mary abriu a porta de casa e nos examinou com os olhos.
— Tia Mary! — Charlie a abraçou e correu para procurar Joan.
— A culpa é toda deles pelo atraso. Ficaram duas horas no banho. — Diz Grace, enquanto abraça Mary e também segue para dentro da casa de bonecas.
O olhar de Mary se estreita em nossa direção.
— Então. — Steve diz. — É claro que nós temos um ótimo motivo pra isso.
Ele me olha desajeitado.
— Hun... sim! É realmente incrível como aquela banheira demora pra...
— Encher. Isso. Encher. — Completa Steve.
— Tivemos que fazer... uns reparos, sabe?
Mary assente.
— Reparos? Por isso você tá vermelho, e Steve tem chupões no pescoço?!
Steve e eu trocamos um olhar desesperado e cúmplice.
— Pois é. — Estendo a mão para Steve. — E eu tô morrendo de fome.
— E eu não posso deixar meu noivo com fome. Ele fica rabugento! — Ele sussurra pra Mary, mas eu ouço e o puxo pela mão.
— Que cheiro maravilhoso! Nada de fumaça e alerta de incêndio hoje!
— Bem observado, detetive Williams. Qual o prato da casa hoje, Maninha?
— Frango balti. — Mary sorri pra mim e eu respiro aliviado.
— Boa noite, senhores! Vamos começar de novo? — Pergunta Jaden.
— É uma ideia muito boa. — Mary comenta. — Maninhos, esse é o Jaden, meu namorado, de vez em quando artista plástico, babá e chefe de cozinha.
— Prazer, Jaden. Eu sou o Danny. E esse homem charmoso e lindo e algumas vezes irritante, mas ainda assim lindo é o Steve, meu noivo.
Jaden sorri e aperta nossas mãos. Às vezes a vida merece outra chance.
Steve ajuda Mary a colocar os pratos em volta da mesa, e eu aproveito para contar a Jaden que ele já pagou demais por pecados que nunca cometeu.
O que importa não é o que a vida te dá, nem mesmo o que você dá pra vida. É a troca que importa. O equilíbrio está na incapacidade de amar sozinho.
...
— Você era só um bebê quando essa história começou e com certeza não se lembra. Era uma vez um Príncipe lindo que tinha um garanhão negro veloz e de pelo brilhante. E como te contei uma vez, havia um Ogro também, um Ogro chato e feio que não deixava o Príncipe andar no próprio garanhão. Mas quer saber? Passou um tempo, na verdade, passou muito, muito tempo, tempo demais. Por alguma razão, o Príncipe e o Ogro não conseguiam ficar longe um do outro, eles sentiam falta de tudo no outro. Sentiam falta até de brigar um com o outro. E eu vou te contar porquê. E o Ogro, ele só fazia isso porque era louco pelo Príncipe e não suportava a ideia dele se machucar, e o Príncipe brigou tanto com ele que aquilo o distraiu. Um dia ele percebeu que amava muito o ogro e que ele era incrivelmente lindo, embora continuasse chato.
— Tio Danny, eles foram felizes para sempre?
— Essa é a melhor parte, Princesa. Eles estão sendo felizes para sempre.

***

mas o gosto da sua boca ...Where stories live. Discover now