1.0

72 3 0
                                    

Eu observava a chuva escorrendo pela janela enquanto fingia escutar atentamente o que a senhorita Yoon dizia. 

- Como uma tarefa de casa, quero que todos criem um texto no estilo das cantigas trovadorescas. - a voz dela era monótona. - Sejam elas de amor, amigo, maldizer, escárnio. Por favor se atentem às características de cada uma. Quero o texto para amanhã com no mínimo, 100 palavras. 

Quando o sinal tocou, juntei rapidamente minhas coisas para me encontrar com Tina, mas escutei a professora. 

- Precisamos conversar, Alice. Se sente. - ela disse enquanto arrumava as próprias coisas.
Vi todos saírem da sala e alguns me lançaram olhares curiosos. 

A senhorita Yoon se sentou numa cadeira no meu lado e ela parecia desconfortável. 

- Estamos no último ano, Alice. - sua voz já não era monótona, mas sim carregada de preocupação.

- Eu sei. - era meio óbvio. 

- Vou tentar conversar abertamente com você. - ela levantou um dedo aos óculos, ajeitando-os no rosto. - Sei que sua mãe morreu e sei também que as coisas ficaram difíceis e por isso te ajudei e convenci os outros professores a te ajudarem a passar de ano.  

- Onde quer chegar? - agora era eu que estava desconfortável.

- Você parecia enlutada no ano passado, num estado lástimavel e pensamos que tudo ia ficar bem depois de você superar. 

- Superar? - minha voz se tornara amargurada agora. - Superar que minha mãe morreu? Isso não é algo que eu vá superar algum dia, senhorita Yoon. 

- Eu entendo pelo que está passando, Alice. Mas seja realista, você está num estado deprimido ainda. Pensamos que você ia melhorar, mas até agora você parece tristonha.

Eu sabia que a professora era alguém que realmente se importava com os alunos, mas ela parecia passar dos limites. Minha vida pessoal não era da conta dela.

- Era só isso que você tinha pra dizer? 

- Não. - ela cruzou os braços. - Como eu disse, estamos no último ano. Se você quiser ter alguma chance de ganhar uma bolsa você tem que se concentrar no estudo e não ficar se lamentando pelos cantos. 

- Eu agradeço a preocupação, mas eu não consigo pensar em faculdades agora.  

- Vai pensar quando então? - ela pressionou. 

- Eu não sei. 

- Vou ser sincera, Alice. Não como professora, mas como amiga. Esse momento da sua vida é aquele instante onde a realidade te alcança. Tudo o que você faz agora vai afetar como será a sua vida daqui dez anos.

- Não consigo pensar em nada disso agora...eu não...- não pude nem terminar a frase. Meus olhos já lutavam para manter as lágrimas. Eu não queria chorar na frente dela. 

- Sua mãe iria querer que você se concentrasse no seu futuro. 

Você não sabe de nada, eu queria dizer pra ela. Todavia, ela estava certa. Mamãe tinha muitas expectativas quanto ao meu futuro.

- Vou pensar nisso. - pronto, era o máximo que eu podia dizer a ela.

- Falo isso porque você é uma garota inteligente, Alice. Vejo você amanhã. - ela se levantou e colocou as suas coisas sobre o braço. - Não se esqueça da sua lição de casa. - dito isso ela saiu da sala. 

Quando finalmente saí da sala esbarrei com um menino, derrubando as coisas dele no chão.
Nos abaixamos ao mesmo tempo para pegar as coisas e nossas mãos se encontraram no caminho, não pude deixar de soltar uma risada. Essa cena era a mais comum nos livros de romance que eu lia quando tinha treze anos.

ImersaOnde histórias criam vida. Descubra agora