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Steve e eu estávamos num encontro no final de semana. Depois de vários dias falando que queria um encontro, ele finalmente cedeu. Naquele momento, eu estava no carro dele, de olhos fechados apreciando o vento sobre o meu rosto. 

A sensação me inundou trazendo lembranças de quando meu pai, minha mãe e eu éramos uma família. Nós dirigíamos durante horas para acampar, ou para fazer um piquenique.

Sentia falta de uma família e também sentia falta da minha mãe.

- Tudo bem? - Steve perguntou em um certo ponto do trajeto, provavelmente observando minha expressão tristonha.

- Tudo ok. - respondi simplesmente. 

Steve dirigia rápido já que quase não haviam carros pela estrada. 

Todas as vezes que eu perguntei aonde estávamos indo, ele dizia: já vamos chegar, se eu contar deixará de ser uma surpresa. 

E como eu era uma pessoa que gostava de surpresas, tentei não perguntar tantas vezes.
Quando Steve estacionou  seu carro no acostamento de uma estrada eu o olhei confusa. 

- Por que estamos no meio do nada? - observei ao redor e só vi a escuridão. 

- Você verá. - ele saiu do carro e logo em seguida abriu a porta para mim. Meu coração se aqueceu com aquele simples ato. Ele entrelaçou nossos dedos e pegou uma cesta fechada que estava no banco de trás do carro. 

- O que vamos fazer aqui no escuro? - levantei uma das sobrancelhas, mas não acho que a escuridão o deixou ver. 

Steve nada respondeu, apenas me puxou para atravessarmos a estrada e então eu vi.
Todos aqueles minutos no carro, valeram a pena. Eu podia ver toda a cidade daquele lugar. Vendo assim a cidade parecia pequenininha. As luzes da cidade formavam um show visual. Quase perdi o fôlego, vivendo anos naquele lugar, como não pude apreciar o quão belo era? 

Ouvi uma risadinha vindo de Steve. 

Ele pegou uma toalha e a colocou no chão e logo se sentou tirando o que tinha no resto da cesta.
Quando vi um bolo de chocolate saindo da cesta, me sentei rapidamente. 

- É tão bonito aqui. 

- Sabia que você iria gostar. - ele sorriu para mim, oferecendo um pedaço do bolo em um prato de plástico. 

- Obrigada. - falei dando uma mordida no bolo. - Hmmmm...eu adoro bolo de chocolate. 

- Eu sei. - ele colocou a cesta do seu lado esquerdo e se arrastou para perto de mim. Aquele gesto e o fato de ele ter lembrado do que eu gosto, aqueceu meu coração.

- Tina estava errada. - murmurei para mim mesma. 

- Hmmm? 

- Tina me disse para terminar logo, mas veja como estamos bem agora. Era tudo questão de tempo.

- Tina te disse para terminar comigo? - ele me olhou bravo e soube naquele instante que não deveria ter feito nenhum comentário sobre aquilo. 

- Ela não usou todas essas palavras, mas disse que seria mais fácil desistir. - coloquei o prato de lado e coloquei minha mão sobre o rosto dele. - Nós estamos bem agora, é o que importa. 

- Não me sinto satisfeito com isso. 

- Com o que? - franzi o cenho e abaixei minha mão. 

- Sua amizade com essa Tina não me parece boa. - ele jogou as palavras no ar.

- Por que não? Tina é minha amiga desde que me entendo por gente. 

- E mesmo assim, ela te disse que seria melhor desistir de nós. - ele desviou seu olhar para o cenário que estava a frente. - Você quer esse tipo de amiga na sua vida? Ela nem considerou seus sentimentos ao falar aquilo. Ou você de fato está infeliz comigo?

- O quê? - balancei a cabeça negativamente. - Eu estou muito feliz com você. 

- Então sua amiga é mesmo uma insensível. Ela queria que você terminasse comigo, mesmo você sendo feliz no nosso relacionamento. 

- Tina só queria ajudar... 

Repassei aquele dia na minha cabeça e Tina não parecia ter uma má intenção dizendo aquilo, ela simplesmente... só estava preocupada. Como uma amiga normal estaria.

- Como qualquer casal normal, nós temos problemas, docinho. Mas que tipo de amiga diz para a outra terminar o seu relacionamento ao invés de tentar solucionar os problemas? - ele voltou seu olhar para o meu rosto. - Não acho que essa Tina seja uma boa influência pra você.

Encarei o cenário diante de nós tentando digerir tudo. E talvez, Tina realmente não tenha dado um conselho bom. Steve tinha razão.

- É bom filtrar tudo o que ela diz para você. Principalmente quando for algo sobre nós dois.

- É...acho que sim. - assenti meio incerta.

Steve passou um de seus braços ao meu redor, me puxando para perto.

Se passaram alguns minutos antes que Steve quebrasse o silêncio.

- Já que estamos nessa conversa, por que não esclarecemos tudo? 

- Pensei que já estivéssemos bem. - falei com um quê de dúvida na voz. 

- Se nós conseguirmos nos abrir um com o outro, talvez esses erros não se repitam. 

- Pensei que não gostasse dessa ideia de conversar sobre como o outro de sente. - dei uma risadinha e Steve ficou um pouco constrangido. 

Me lembrei de alguns meses antes quando eu gostaria de conversar sobre os nossos sentimentos e Steve simplesmente riu de mim e achou a ideia patética. Ele querendo voltar nesse assunto novamente e até mesmo reconsiderar, era uma das provas que ele conseguia ser razoável. Isso tornava nossa relação quase perfeita. 

- Andei pensando nisso e não é uma ideia péssima. Talvez você tenha razão, se falarmos o que estamos sentindo e sobre o que estamos incomodados de alguma forma, talvez nos ajude a chegar num consenso. Então a gente pode voltar a ser como éramos antes. 

As palavras dele aqueceram meu coração. Tudo o que eu mais queria era voltar para a época em que éramos perdidamente apaixonados um pelo outro. O início da nossa relação foi marcado pelos momentos mais românticos que já tivemos. E se conseguíssemos voltar para como éramos antes dessas discussões, as coisas finalmente voltariam ao normal e tudo ficaria bem. 

- Quer começar com o motivo de você ter me perseguido em todas as festas? - ele me tirou do transe. 

Eu respirei fundo e pensei muito antes de escolher as palavras.

- Eu não tive muitos exemplos para relacionamentos saudáveis. Meus pais tiveram uma história fracassada e até mesmo ...trágica. - Steve começou a mover sua mão para cima e para baixo no meu braço como uma forma de me reconfortar. - Não quero ter algo parecido com o que eles tiveram. Meu pai abandonou a minha mãe no momento em que ela mais precisava. Isso me gerou uma série de inseguranças. E se quando eu mais precisar de alguém e ela não estiver por perto? E se ela se livrasse de toda a nossa história no pior momento possível? Meu pai parecia amar tanto a minha mãe, mas quando ela esteve precisando dele...ele se foi. Ele a abandonou.

- Eu não abandonaria você, Alice. - sorri um pouco com o comentário dele.

- Eu sei, Steve. No entanto quando eu pensei mais sobre isso, consegui enxergar que o meu pai tinha se afastado gradativamente da vida dela. Uma noite ele saía sem avisar, outrora passava semanas sem aparecer em casa. Até que um dia, ele foi embora pra sempre - senti dificuldades em falar, tentando manter as lágrimas presas. - Eu não quero ser deixada por quem eu mais amo. E eu amo tanto você, Steve. - algumas lágrimas escorrem no meu rosto sem minha permissão. - Quando você some, eu entro em desespero e perco a razão. Me desculpa se você se sentiu desconfortável com isso quando eu te procurei nas festas que nem uma maluca, mas eu não pude evitar.

Steve me puxou ainda mais para perto e me apertou junto ao peito. Senti as lágrimas inundando sua camisa, mas não me importei.

- Eu sinto tanto...não sabia que você se sentia assim. - as palavras dele saíram entrecortadas e sufocadas. - Eu farei o possível para não te machucar mais. Sinto muito, meu bem. -
Era reconfortante e libertador ter dito o que eu sentia afinal.

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