Depois - Capítulo 21

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Dublin, março de 2018


Alanis

Acordo com a minha colega fazendo barulho com o liquidificador.

- 5 anos dividindo apartamento e não me acostumo. – resmungo levantando da cama. 

Vou até o banheiro e vejo minha cara inchada de sono no espelho. Meu cabelo castanho escuro bagunçado com as mechas roxas cada uma pra um lado.

- Deus, que bizarra! - digo pra mim mesma. 

Lavo o rosto e faço um coque simples, deixando só minhas mexas soltas. Vou até a cozinha ver o que tem de bom por lá.

- Bom dia, dorminhoca! – Jéssica diz ao me ver.

- Bom dia. – bocejo. – que horas são?

- Hora de uma boa vitamina!

Ela coloca uma gororoba estranha num copo e me serve.

- Obrigada, eu acho. – cheiro antes de experimentar.

- Você está bem?

- Por que não estaria?

- É que hoje... Você sabe.

- Estou bem. – tomo a gororoba toda de uma vez e coloco o copo vazio na pia. – estou ótima! – sorrio cinicamente voltando para o meu quarto.

Fico olhando pela janela o dia frio e chuvoso, como todos em Dublin.

Abro meu guarda-roupa e pego a camiseta do Nirvana, toda surrada, já sem seu cheiro.

- 28 anos hoje, hein. – uma lágrima escapa me levando de volta a 2007, quando tudo era perfeito. – Ah, Guilherme, quando vou te superar, seu imbecil? - bufo e jogo a camiseta de volta no guarda-roupa.

Tomo um banho quente ouvindo a playlist mais animada do Spotify na tentativa de afastar Guilherme dos meus pensamentos. E por um instante até que deu certo.

Me visto com uma roupa qualquer para passar a tarde fazendo absolutamente nada, ou quase nada. Ligo meu notebook e fico enviando currículos e meu portfólio para várias empresas da Irlanda e do Brasil até dar meu horário de ir pro serviço.

A noite trabalho num pub, na esquina do meu prédio. Não é o trabalho dos sonhos, mas enquanto não encontro nada na minha área, consigo me virar com esse emprego.

4 anos estudando arquitetura pra trabalhar num pub.

Meu avô deve estar se revirando no túmulo.

Meu sonho é conseguir um emprego no Brasil. 

Eu amo Dublin. Se sou alguém mais independente é graças a essa cidade.

Vim pra cá sozinha, sem saber fritar um ovo. Nem ônibus eu sabia pegar. Hoje em dia me viro muito bem, mas meu lugar é com a minha família e meus amigos.

Se eu passar mais um ano longe da Samira, ela surta.

Além das pessoas, sinto falta do sol, do calor, da comida, tudo! Preciso voltar pro meu país.

No fim da tarde me arrumo pra ir trabalhar.

- Alanis, o Jean está aqui! – Jéssica diz do outro lado da porta.

Jean também é brasileiro, vive na irlanda desde 2010 e é o amigo gay que todo mundo deveria ter. Seu cabelo castanho contrastando com os olhos azuis, a pele clara e sua barba ralinha enganam. A cara é de metido, mas só a cara mesmo. Ele é meu anjo da guarda aqui. Desde que cheguei, me ajuda em tudo que preciso. Ele e o namorado, Lorenzzo, um italiano simpático que faz um nhoque melhor do que ninguém. Os dois são incríveis e me adotaram, pois cuidam de mim como se fosse a filha mais nova, apesar de Jean ser um ano mais novo que eu.

Meu garoto do violãoOnde histórias criam vida. Descubra agora