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Uma hora antes

Shawn

Acordo cedo, mesmo no sábado.
Não consegui dormir muito, então fico de boa na cama, esperando a coragem vir. Através da janela, vejo o sol nascendo e fico observando, enquanto as memórias me tomam e eu sinto uma saudade dolorosa da minha morena. Tudo o que eu estou fazendo de errado, é resultado do meu desespero. Dois anos se passaram, e eu continuo amando ela com a mesma intensidade, com a mesma entrega. 

Me levanto da cama, querendo afastar os meus pensamentos. Ficar pensando no que eu vivi com a Isabella me causa mais dor ainda, mais do que o que eu já sinto. Nunca mais vou vê-la, então por que ficar me atormentando com isso? Tomo um banho rápido e coloco roupas pra malhar. Vou dar uma volta no parque, hoje. Preciso me apegar desesperadamente a qualquer distração que eu consiga para me afastar dela. 

A minha vida está uma bagunça e eu não sei como organizar isso. Ponho o tênis e saio, correndo pela calçada. O ar frio e leve da manhã toca o meu rosto e me acalma, lentamente. O parque está vazio, mas é porque ainda é cedo. 

Corro por uma hora, mais ou menos, e vou tomar um café. Olho no relógio e já são 9:30. Tenho que ir pra casa daqui a pouco, para uma reunião com os sócios. 

Volto para o parque, para dar uma caminhada lenta, só para curtir o lugar, todo florido por causa da estação. Ouço alguém chorando, o que me deixa nervoso. Não sei lidar com pessoas chorando, sempre fico desconfortável. Mas é uma menina, de uns 8 anos, com os cabelos em tranças e com sardas no nariz. O joelho dela está ralado e sangrando. O skate ao lado dela está caído. Provavelmente ela caiu, quando estava muito rápido e ralou o joelho.

Vou até ela e me agacho. Sempre fui apaixonado por crianças, e vê-las chorando parte o meu coração, faço de tudo pra vê-las brincando e sorrindo. Isso faria de mim o pai mais bajulador de todos. Se eu tivesse um filho, mimaria tanto, cuidaria tanto.

Mas você vai ter um filho, só não ser com a pessoa que você quer.

Obrigado por lembrar, consciência. 

 "Você está bem? Onde estão seus pais?"

A menininha funga, entre as lágrimas. 

 "Eu moro no apartamento ali, de frente pra esse parque. Meus pais não tem muito tempo e eu acabo vindo sozinha."

Ajudo a menina a se levantar e a sentar no banco.

"Quer ajuda pra ir pra casa?"

Ela balança a cabeça, já com uma cara aflita. Os pais dessa menina são tão ruins assim que ela não quer ir pra casa? 

"Não, não precisa, vou ficar aqui, não quero ir pra casa agora."

Meu coração se parte quando noto como a menina é forte e bem mais madura do que qualquer criança que eu já tenha visto. Me sento ao seu lado. Se eu não ajudar essa menina, o ferimento vai acabar infeccionando. 

"Você deixa eu cuidar do seu machucado?"- Ela faz uma careta. Claro, um estranho se oferecendo pra cuidar dela? Isso parece idiota até na minha cabeça.- "É que seu você não cuidar desse machucado, ele vai inflamar e vai doer muito. Olha, me espera aqui. Vou na farmácia, comprar um remédio pra limpar e um Band Aid, para não ficar aberto assim. Tudo bem?"

A menina assente, trincando os dentes de dor. Vejo o orgulho nos seus olhos. Ela teve que aprender a se cuidar sozinha, e depender de alguém causa estranheza, desconforto. Ela é muito diferente das crianças que eu já vi e me lembra muito uma menina orgulhosa e forte igual a ela. Guardo um sorriso e me levanto, procurando com os olhos alguma farmácia próxima. Já vim aqui muitas vezes, mas nunca prestei atenção nas lojas que rodeiam o parque. 

Trombo com alguém, que cai no chão. 

"Bella?"

É claro que é ela. Mesmo com o cabelo mais curto, reconheço ela. Meu coração tropeça, sem acreditar no que estou vendo. Ajudo ela a se levantar, e ela desvia o rosto.

"Você se machucou?"

 Pego seu queixo, preocupado de ter machucado ela, mas seu rosto está intacto. Seus olhos tem o mesmo brilho de rebeldia e intensidade, mas estão um pouco diferentes. Tem um brilho neles que eu não conhecia, algo diferente. Ela mudou, e até seus olhos refletem isso. 

Depois de alguns segundos, ela se solta, impaciente. 

"Estou bem. Eu...hãm...Tenho que ir."

E ela sai correndo, sem mais nem menos, tão excêntrica e impulsiva quanto eu me lembro. Não posso evitar sorrir. Só de vê-la, tocá-la, meu corpo já se aquece de saudade, lembrando de um tempo onde nada nos separava, onde eu só precisava do calor dela pra enfrentar qualquer coisa. 

Queria correr atrás dela e dizer todas as coisas que eu estou sentindo. Queria dizer que ela está ainda mais linda, mais mulher, que meu coração acelera igual um idiota apaixonado quando penso nela, que eu não quero viver mais nenhum segundo sem ela, mas eu fico parado, olhando para onde ela correu, assustada, confusa e tensa.Se for o nosso destino ficar juntos, vamos voltar a nos ver, por isso e deixo ir. 

Vou numa lojinha e compro o que eu prometi para ela e vou até lá, cuido da menina e ela me abraça, agradecida, pegando skate e saindo correndo. Meu celular toca, e é a Agatha.

"Bom dia, coisa linda."

"O que você quer, Agatha?"

"Tão doce, como sempre. Preciso que faça um favor pra mim."

"Não vou te emprestar a minha Ferrari, nem começa."

"Deixa de ser besta, eu ia pedir pra você encontrar com a dona da empresa que vai fazer o casamento da sua irmã. Estou presa numa reunião e vai durar o dia todo. Faz esse favor pra mim, Shawnie lindo?"

"As mulheres da minha vida só me estressam. Daqui a pouco a minha irmã me liga pra pedir alguma coisa."

"É porque a gente te ama."

"Sei. Mas pode deixar que eu vou, faço esse sacrifício por você."

"Você é pra casar mesmo, te amoooo"   

"Tão falsa. Se cuida, beijos."

"Beijos, lindo."

Pego um Uber, mas vou pra o meu apartamento, pra não me encontrar com a Loren e discutir de novo. Mais tarde ela quer fazer uma Ecografia, mas eu ainda não estou pronto pra lidar com isso. Tipo, eu vou ser pai? Estou fugindo disso, é muita informação. Eu nem lembro de ter dormido com a Loren, parece mentira. Ela deve ter me drogado, não é possível.

Tomo um banho e me arrumo. Mesmo sendo um almoço, como tenho uma reunião depois, não quero ter que voltar, então ponho uma camisa preta, deixando em cima desabotoado e dobrando as mangas até o cotovelo e uma calça. Passo um perfume, e vou até o restaurante, na minha Ferrari. 

Estaciono e vou pra mesa marcada. Olho no relógio. A moça está atrasada. Que ótimo, já não gostei dela. Não quero nem imaginar a briga que vai dar se ela atrasar com alguma coisa na organização do casamento, porque eu vou gastar uma fortuna, exijo um serviço perfeito, sem estresse e problemas. 

Fico mexendo no celular. 

"Me desculpa o atraso, estou com um bebê em casa e o dentinho está nascendo e..."

É ela. O destino não falha mesmo. Correu de mim e agora, aqui estamos nós, nos encontrando sem saber e sendo obrigados e ficar juntos. Obrigado, mundo. Isabella está toda arrumada, tão linda que eu fico sem folego. 

Mas ela falou de um bebê. Ela tem um filho? Faço os cálculos rápidos. Pode ser meu. Isabella teve um filho meu?  

"Qual bebê?"

Ruin ~ Shawn MendesOnde histórias criam vida. Descubra agora