Capítulo 9: Queda

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Annie Cresta

O caos se instala. Ainda assim, para mim, é como se tudo estivesse em câmera lenta. É provavelmente o efeito da adrenalina correndo por minhas veias.
Uma a uma, as crianças de cada distrito descem de seus pedestais e começam a correr: uns em direção à Cornucópia, outros na direção oposta. Acredito que muitos não tiveram o privilégio de ter bons conselhos de seus mentores como Dean e eu, já que noto que vários jovens inexperientes correm direto para as plataformas que levam até a fonte maior de recursos.
Antes de me virar e correr rumo aos mantimentos que desejo, consigo visualizar a seguinte cena: Farrah, a lutadora do 2, surge primeiro dentro do meu campo visual, pois, como já era de se imaginar, ela corre muito à frente para chegar primeiro à Cornucópia. Porém, o garoto do 8, cujo nome não me recordo, pensou que seria uma boa ideia tentar ir pelo mesmo caminho. Resultado? A garota do 2, perita em artes marciais, dá meia volta e se joga sobre o menino que, mesmo aparentando ter o dobro da massa corporal de Farrah, é facilmente arremessado rumo aos espinhos. Primeira morte.
Junto toda energia proporcionada pelo surto de ansiedade e simplesmente dou as costas à cena sanguinária que ocorre logo atrás de mim. Aparentemente, os outros tributos mais próximos não tiveram a mesma ideia de fugir, então meu caminho até minha futura mochila está livre.
Retiro minha jaqueta laranja que, considerando o calor desse lugar, só chamará atenção, e a coloco na bolsa. Dentro dela, há uma corda bem resistente e alguns esparadrapos; itens úteis, mas que não são suficientes para o que vou viver.
Com a faca em mãos, atrevo-me a olhar para trás novamente para acompanhar a trajetória de Adalia, pois pode ser que nem sequer precisarei esperar por ela. Para minha surpresa, a garota do 9 mais parece uma carreirista também: conseguiu chegar no meio sem ser notada, pegou uma série de coisas que não consigo identificar com clareza e já se dirige pelo caminho de onde veio.
Sabendo que minha aliada está à caminho, permito-me verificar o que mais aconteceu no período mínimo de tempo em que me virei para pegar meus recursos. Vejo que um menino consideravelmente distante encontra-se estirado no chão, com uma flecha em sua cabeça. É então que meus olhos notam Blair, irmã de Marshall, já no centro e convenientemente equipada com sua arma predileta: uma besta. Falando dos gêmeos, acredito que Marshall foi para a parte da Cornucópia que não consigo ver, pois ele sumiu de repente.
A contagem de mortos só aumenta. Acompanho os movimentos do tributo do 5, Aaron Flyn, assim como Finnick recomendou. Ele acertou uma lança na barriga de um tributo, se não me engano o garoto do 3. Não consigo ver onde Dean está e imagino que isso seja algo bom. Raiden e Farrah, por sua vez, totalmente equipados, saem em disparada do centro em busca de mais vítimas. Acho que é a hora de ir.
Corro o mais rápido que posso até a distante árvore que combinei com Adalia, com medo de ser atingida pelas costas. O caminho é repleto de arbustos que dariam ótimos esconderijos, além de uma ou outra árvore. Espero que esse aspecto do bioma não seja o mesmo de toda a Arena; do contrário, esses Jogos vão acabar em pouquíssimos dias, dadas as poucas opções de refúgio.
Depois do que parecem ser vinte minutos de corrida ininterrupta, chego ao local combinado. Ofegante, sento-me no chão na direção do massacre que está ocorrendo a vários metros de mim. Sinto, de uma vez só, toda a adrenalina ir embora e dar lugar a algo pior: medo e tristeza. Só consigo chorar pelas mortes horríveis que acabei de presenciar, ainda que eu não tenha sido responsável por nenhuma delas.
     Permaneço um tempo imóvel, só imaginando o que mais aconteceu no Banho de Sangue. Como minha aliada ainda não demonstra sinais de estar próxima, não só descanso para poder correr para mais longe, se for preciso, como também avalio melhor o conteúdo da mochila que peguei. Encontro, em um bolso pequeno na parte inferior, uma pequena caixa de fósforos: fico animada com o fato de não precisar me esforçar tanto para conseguir criar fogo para me aquecer e cozinhar. Se bem que, com o calor que faz aqui, não acho que frio será um problema.
     Estou com sede. É só então que cai a ficha: não vi qualquer indício de água em toda extensão do caminho que percorri. Além disso, não tive a sorte de encontrar um cantil, então possivelmente ficarei dependendo de fontes de água naturais. Isso não é muito bom para alguém que não quer ser caçada.

70°Jogos Vorazes: Annie CrestaOnde histórias criam vida. Descubra agora