A Garota Secreta: Medo Absoluto

Capítulo 28

"Os tristes acham que o vento geme;
Os alegres acham que ele canta" - Luis Fernando Veríssimo

----------

Depois de uma burocracia infernal que só fez Marcos e eu sofremos mais, finalmente fomos enterrar Gabriel. Voltamos para o Rio e Rafael fez questão de ir conosco. Resolvemos enterra-lo ao lado de Lívia, eram duas pessoas muito importantes para Marcos e eu jamais negaria isso a ele. No enterro de Gabriel não havia ninguém exceto eu, Marcos, Rafael e os coveiros. Seu caixão era minúsculo e branco e na lápide tinha seu nome: Gabriel Sanches Fernandes.

Eu não estava suportando tamanha dor, aquilo estava sendo demais para mim. Até os coveiros pareciam saber como aquele serzinho era importante para nós. Eu e Marcos estávamos lado a lado chorando em silêncio enquanto seu caixão descia. Eu me culpava. Tentei salvar os três e perdi meu filho, as vezes pensamentos obscuros vinham a minha mente e eu pensava se não era melhor eu ter abandonado Marcos e ido embora com meu filho. Eu ficaria dilacerada pois o amava mas eu amava muito mais a meu filho e se fosse necessário, deixaria Marcos para salvar Gabriel. Porém fui burra ao imaginar que conseguiria salvar a todos. Como sempre, eu tentei ser uma heroína e não deu certo. Por que eu ainda tentava?

- Eu não sei o que dizer, mas eu sinto muito - Rafael disse - vou fazer de tudo para ter sua filha de volta, Marcos

- Um filho não substitui o outro, Rafael - Marcos disse olhando para a cova aberta - nunca vai substituir, eu perdi meu filho e você não sabe como isso está doendo. Quando você tiver filhos, vai saber do que estou falando.

- Meu amor - eu olhei para Marcos com um olhar morto, ele me olhava da mesma maneira - eu estou dilacerada por dentro, tenho uma dor tão grande que é imensurável mas eu quero passar isso com você. Vamos chorar e sofrer juntos. Sempre tivemos apenas um ao outro e por mais que agora tenhamos Rafael que é um grande amigo, só nos dois sabemos tudo que passamos e só nós dois sabemos o que o outro está sentindo nesse momento. Então quero fazer questão de dizer que mesmo eu não tendo estrutura alguma para suportar mais essa dor. Eu estou aqui para te apoiar, como sempre foi.

- Eu sei - ele disse quase sussurrando - eu também estou aqui - ele me abraçou e ficamos ali por um tempo. Tempo suficiente para notar que Rafael e até os coveiros estavam chorando - vamos continuar, por favor.

Eu e Marcos pegamos um punhado de terra e soltamos devagar sobre o caixão de Gabriel. Então deixamos os coveiros fazerem seu trabalho

- Se a vida fosse fácil como a gente quer... - cantarolei a mesma música que havia cantando a uns tempos atrás enquanto a terra sugava meu filho. Eu parecia uma louca cantando em um velório e eu talvez estivesse mesmo - se o futuro a gente pudesse prever - eu não me preocupava em cantar no ritmo certo e a dor me impedia também - eu estaria agora tomando um café, sentado com os amigos em frente a TV. Eu olharia as aves como nunca olhei, daria uma abraço apertado em meus avós, diria eu te amo a quem nunca pensei, talvez é o que o universo espera de nós - não consegui cantar mas nada pois entrei em um choro profundo e me ajoelhei no chão implorando mentalmente para morrer. Naquele momento eu lembrei que escutava essa música as vezes no rádio que tinha na boate que usávamos para treinar nossa dança para a noite e ela me dava esperança. Esperança de dias melhores, esperança de sair daquele inferno, esperança de ter meu filho de volta.

Vi Rafael abraçar Marcos, este tentava se manter firme mas não conseguia e Rafael tinha se tornado um amigo tão próximo que sabia disso. Eu perguntava aos céus porque eu estava viva e meu Biel morto, isso não fazia sentido algum para mim. Apesar de tudo as palavras daquela enfermeira não saiam da minha cabeça. Será que Gabriel realmente tinha uma missão? Não conseguia aceitar tal fato.