Entre nós, o passado

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Aposto que neste capítulo teremos muita gente que vai colocar um certo membro da família real como um dos personagens favoritos...

A propósito, este capítulo responde a um mistério que foi questionado lá no comecinho do livro...

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Quando Carmen ficava sem vontade de dormir, ela tinha sempre duas opções.

A primeira era ligar a televisão do quarto e assistir a algum filme que passava no horário, não importando o tema - aquilo sempre a fazia descansar.

Mas quando seu corpo realmente não queria que ela dormisse, a jovem não resistia aos chamados biológicos e descia até a cozinha de casa, a fim de preparar um café preto, sem açúcar. Subia até o quarto com sua caneca no formato da máscara do Batman e lia algum livro.

Entretanto, não estava em casa - e sim no Palácio Real, no ambiente leste, onde a sala de cinema ficava no último andar, bem distante de todos naquele lado do palácio. O lugar mais perto de Carmen era a cozinha, que ficava no térreo, e bastava ela sair do quarto, caminhar pelo corredor até as escadas e descer dois lances até chegar à sala de jantar restrita para ela e Max e num outro ambiente, a cozinha.

Pegou o roupão de dormir, feito de algodão, e cobriu a longa camisola de alças, também de corte retrô, e se lembrou da piada de sua amiga Eulália, que a chamava de "professora de filme noir dos anos 40". "Nem sei se tem professoras em filmes noir, Lália", refletiu a jovem, esboçando um sorriso saudoso.

Mal se preocupou com os cabelos, que desciam crespos feito uma cascata, e calçou suas pantufas de Robin, espantosamente verdes e vermelhas para uma roupa de dormir tão branca e sóbria, e caminhou silenciosamente pelos corredores até descer as escadas.

O Palácio Real de Azzurro à noite poderia ser uma visão assustadora por dentro. As paredes escuras, com detalhes em alto relevo de rostos, flores e padrões que uma figura mais criativa poderia entendê-los como expressões macabras, ali no Ambiente Leste era mais aterrorizante que em outros espaços, de decoração mais singela e menos conflituosa. Carmen inferia que a influência por ali era barroca, mais do que o exagero romântico do rococó; havia algo de tormento e tristeza no Ambiente Leste que casava com a história trágica de Luisa de Aragón, que não apenas construiu o jardim e a piscina; mas vivia exatamente ali, enquanto o marido morava no Ambiente Oeste, do outro lado do palácio.

"Por que ainda não inventaram histórias de assombração envolvendo a antiga rainha?", questionou Carmen, que mesmo cética, imaginava que, se Luisa de Aragón quisesse assustar alguém, ali seria o lugar perfeito.

Assim que chegou até a cozinha, buscou no armário sua querida caneca do Batman e deixou na mesa, enquanto procurava o pote de café e enchia a jarra de vidro com água, a fim de fazer o café na máquina.

- Cheguei cedo... Para amanhã...

A voz pastosa de Bruno León surgiu repentinamente na cozinha, assustando Carmen, que deu um leve pulo.

- Vossa Alteza me assustou! - a jovem colocou a mão no peito, tentando se acalmar.

- Minha adorada Perseis está sem sono...? Que triste...

O príncipe caminhou trôpego pela cozinha, e no momento que buscou a cadeira para sentar, segurou no encosto sem muita força e quase caiu; Carmen o segurou, sentindo rapidamente odores misturados de bebida e perfume barato.

- Quer beijar o príncipe...?

- Vossa Alteza está mais para um sapo, isso sim! - manteve-o erguido, e logo ele conseguiu a muito custo se sentar, observando os movimentos de Carmen buscando o café com sua caneca do Batman.

Coração de Rainha [livro 1]Onde histórias criam vida. Descubra agora