olhando para o horizonte

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     A vida pacata de Alexander foi virada do avesso. Agora, tudo o que sobrou foram memórias e um vazio no coração, antes ocupado por sua família, agora por ódio.

   Seu avô Luke era um homem prestimoso e muito sábio, foi quem educou o jovem 'Alex', como o chamavam. Em tempos de crise ele administrou sua aldeia,  mostrando-se muito inteligente e habilidoso: a vila que governara nunca mais passou por dificuldades e todos o adoravam. Nas horas vagas o líder se dedicava à magia, de todo tipo. Seus feitiços e estudos já o puxaram para caminhos escuros, mas sempre resistiu à tentação de trocar sua essência por poder.

   Sempre foi calmo em tudo, até no fatídico dia em que deu sua vida pelo bem de todos. Ele morreu junto com os invasores mandados pelo rei, mas eles voltaram. Mais um grupo de inquisidores foi mandado a pedido do rei, em mais um de seus atos covardes. Chegaram pela noite, como se pensassem que debaixo da luz do Sol Deus reprovaria seus atos.

   Sem outra alternativa, Alexander, o neto e sucessor do chefe da aldeia se vê como uma das poucas barreiras entre a vila e o fim dela. Empunhando uma espada ao lado de cerca de 15 outros defensores, era o mais novo mas também o mais determinado, não tinha medo de perder o pouco que lhe restou. 

   O que seguiu após isso não foi exatamente uma batalha, seria melhor descrito como um massacre. Desde o princípio era uma causa perdida, os guerreiros apenas desejavam ganhar tempo para que as mulheres, crianças e enfermos pudessem se abrigar ou fugir, o que nem todos fizeram.

   Dentre os 15 corajosos haviam 3 mulheres, um jovem de 17 anos (quase tão novo quanto Alex) e o lenhador, um homem alto e de ombros largos que mostrava muita seriedade e compostura segurando seu machado de quase um metro e meio, mesmo estando febril e tão quente quanto as tochas dos paladinos, que a esse ponto já iniciavam o ataque. Estes lutaram abastecidos pela raiva de terem sido julgados incapazes de proteger suas terras.

   Mesmo com toda a comoção e esforço que foi empregado na defesa, as forças do rei estavam em maior número e melhor equipados, sem contar que possuíam experiência em combate, algo que não se pode dizer de todos om membros da barreira humana. Em dois minutos toda e qualquer resistência foi reduzida a uma fila de corpos no chão, e aqueles que preferiram entrar em suas casas no lugar de correr para longe foram sentenciados a queimar em seus lares.

Alexander tinha sido desarmado e amarrado logo no início da batalha; aparentemente o rei gostaria de puni-lo presencialmente, já que não teve a chance de condenar seu avó por acabar com vários de seus melhores cavaleiros. Ou talvez pretendia tirar do jovem alguma informação sobre as magias que o ancião dominava. Seja qual fosse o motivo, foi amarrado e obrigado a assistir as vidas de seus conterrâneos sendo ceifadas.

O que lhe poupou de um destino pior  foi a ausência dos soldados que inicialmente lhe vigiavam. Estes foram ao socorro de seus colegas que estavam sendo subjugados e rasgados como folhas de papel pelo lenhador, que continuava atacando ferozmente mesmo após perceber que todos que começaram a batalha ao seu lado já haviam caído.

Vendo uma chance de fugir para viver outro dia, Alex alcançou uma faca de caça posicionada em sua cintura mesmo com suas mãos atadas, e cortou de modo laborioso todas as amarras que o prendiam.

Ao se virar para o que restou de seu lar, só encontrou chamas, corpos e morte. Percebeu que seus algozes sentiram sua falta e iniciaram a busca pelo fugitivo mata adentro.

'"Ele fugiu capitão! O menino fugiu!"   disse um dos paladinos, apenas para logo em seguida ser respondido por uma voz profunda e ameaçadora

"Encontre-o, agora."   Disse a voz, de forma resoluta, mas sem omitir seu descontentamento

 Poucos segundos depois o dono da voz saiu das sombras e se revelou como o capitão, um homem que se assemelhava mais a um armário do que a um ser humano, aspecto reforçado por sua robusta armadura.

Alexander estava tremendo, tremendo de frio, de raiva, de medo, tremendo de culpa. Culpa era o sentimento que mais penetrava sua mente. Sentia que tinha caído sem lutar, foi jogado para o lado como peso morto e viu todos a quem segurava algum apreço sendo atravessados por lâminas frias. 

Por que eles estavam mortos e ele não? Não merecia ele tanto quanto os outros estar no meio de uma pilha de corpos? De qualquer modo estava vivo, ao menos por fora, e usou suas últimas forças para correr, e o fez sem olhar para traz.

Não sabia para onde corria, de quem corria, ou por quanto tempo seguiu em sua fuga histérica. Os gritos e estalos das chamas foram substituídos pelo silêncio, que torturava Alex tanto quanto seus pensamentos.

Em algum momento seus movimentos erráticos cessaram por conta própria; estava sozinho, mas não seguro, e nem satisfeito. Se encostou involuntariamente em uma árvore e desabou em seus lamentos, ao mesmo passo que suas pernas cediam ao cansaço. Foi a primeira noite de muitas, em que não ouviria nada além de sofrimento.

  

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