Prólogo

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- Ainda vai demorar muito, mamãe? - a garotinha pergunta enquanto olha as nuvens pela janela do avião - Deveríamos ter ficado em casa...

- Só mais algumas horas, meu anjinho. - responde acariciando a bochecha da filha - E você sabe que não podíamos ficar. Tenho que trabalhar em Nova York agora, então não tinha como ficarmos em Seattle, Harmony. - a menina olha para a mãe, confirma com a cabeça e volta seu olhar para a janela. 

Há sete longos e incríveis anos, são só as duas. Ninguém mais. Isso fez com que a relação de mãe e filha se fortalecesse mais, mesmo com as diferenças entre elas. Harmony Fray nunca foi uma menina fácil de lidar, desde que era um bebê. Claro, as duas se muito dão bem, mas digamos que isso é uma surpresa. Sempre foi independente, com uma personalidade forte, ao contrário de sua mãe - literalmente ao contrário. 

Não há ninguém da família que Harmy - como costuma ser chamada - conheça. Sem avós, tios, primos ou irmãos. E, o mais importante de todos, sem pai. Nas poucas vezes em que tocou no assunto, a única resposta que recebeu de sua mãe foi "não sei". Não importa a pergunta - desde que tenha a ver com seu pai - a resposta sempre será essa. E, o mais estranho, é que Harmony realmente acha que ela estava falando a verdade. 

Mesmo sendo tão nova, possui uma facilidade incrível em perceber o que acontece à sua volta. Ver o que as pessoas estão sentindo, e, em alguns casos, ajudar com isso. A escola é o único lugar onde socializa com outras pessoas - assim como o lugar que menos gosta de ir. E isso não se deve ao fato de que fica trancada em casa pelo resto do dia, mas sim porque, segundo ela, são "relações necessárias". 

Por ter, no geral, uma vida monótoma, mudanças não são muito comuns - e, consequentemente, menos aceitas, porém Harmony faz isso "silenciosamente". Quando recebeu a notícia de que iriam se mudar para o outro lado do país, não ficou frustada, muito menos animada. Ela é especialista em ter uma "reação neutra". É a que utiliza quando recebe qualquer notícia. Se for muito boa, existem exceções, mas, no geral, é assim que funciona. 

Talvez ela aja assim porque sempre pensou que falta alguma coisa na sua vida. Na verdade, faltam muitas coisas, porém resolve deixar as mais irrelevantes para trás. O que falta? Ela não sabe. E talvez não saiba até encontrar.

Horas depois, o avião finalmente pousou no aeroporto de Nova York. Harmy e sua mãe tinham uma sequência de ações: táxi, nova casa, desfazer malas. E, no dia seguinte, iriam ficar o dia todo fora, para que Harmony pudesse conhecer a cidade, já que Clary - sua mãe - havia crescido ali. Na semana seguinte, o ano letivo começava, e então virá a nova escola. Essa foi a única parte, verdadeiramente, que mais desagradou a menina - não que ela houvesse expressado isso.

Não é por causa de amigos - ela não tinha nenhum - mas sim pelo fato de ser uma novata - essa é uma das piores coisas para se ser na escola. As pessoas não conhecem, então, consequentemente, julgam. Claro, pode se tentar dar uma boa impressão, mas às vezes isso realmente não funciona - ainda mais quando não se é tão normal assim.

*~*~*

- Nós vamos voltar para Seattle algum dia, mãe? Ou vamos ficar aqui... pra sempre?

Já se passaram duas semanas desde que haviam chegado na cidade. Os primeiros dias foram tranquilos, as duas se adaptando a nova casa, dando voltas pela cidade, conhecendo pessoas novas, mas os dias seguintes não trouxeram experiências boas - pelo menos para Harmony.

Ela já havia começado seu novo ano letivo na nova escola da nova cidade, e, como já sabia que seria, não foi uma experiência tão agradável.

- Filha... eu sei que os primeiros dias podem ser difíceis mas você vai se adaptar, até porque não, não vamos voltar para Seattle nem tão cedo. Não até que haja um bom motivo para voltarmos para lá. - Clary diz olhando para a garotinha, agora cabisbaixa, rabiscando em uma folha de papel.

Para falar a verdade, "rabiscando" não é um termo tão correto para o que Harmy faz. Assim como sua mãe, tem um incrível talento com desenhos, porém uma vez uma coisa bem estranha aconteceu - e não foi a única em sua vida.

Há alguns meses estava desenhado uma flor. Uma rosa, para ser mais específico, com as pétalas amarelas. Quando terminou o desenho, passou, levemente, o dedo indicador por cima do papel, sentindo a textura do lápis de cor por cima do mesmo. Foi aí que, em um ato de impulso, fez um movimento com os dedos - o qual Harmony não se lembra muito bem qual foi - e, segundos depois, percebeu que a flor já não estava mais no papel, e sim em sua mão. 

Ela não contou para sua mãe sobre isso, porque tinha quase certeza que era uma coisa de sua cabeça - esse "quase certeza" está aí por um motivo. Aliás, não seria a primeira coisa estranha que ela vê. Em seu pulso esquerdo, ela consegue ver algo, e quando digo "ela", significa apenas ela. Teoricamente, não tem muito segredo nisso, não é uma coisa tão anormal, apenas uma tatuagem. Quero dizer, não seria se Harmony não fosse uma criança de sete anos e soubesse como havia parado lá. 

Quando isso havia aparecido em seu pulso? Ela não sabe dizer. Se fosse chutar, diria "desde sempre". Sua mãe poderia ter, por algum motivo, feito isso quando era um bebê? Sim, poderia - por qual razão, não sei. Se ela pudesse ver essa essa tatuagem, sim. Mas não pode. Ninguém pode. E qual é a única explicação lógica para isso? Bom, tecnicamente, não existe uma, mas é melhor acreditar que é apenas uma ilusão da sua mente do que ficar se perguntando pelo resto de sua vida.


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