Little Angel

Capítulo 16

Alec já havia visto muitos demônios em seus anos de vida. Mas tinha a total certeza de que nenhum deles era daquele... tipo.

Eram diferentes. De alguma forma, aqueles três demônios muito maiores do que o normal eram diferentes. Não só no tamanho, como também no modo de agir. Pareciam possuir alguma inteligência, uma certa noção em relação às suas ações. Isso era o que mais os diferenciavam.

E em pé ali, naquele lugar mal-iluminado, com um Jace ainda inconsciente jogado no chão ao seu lado, a única coisa em que a atenção de Alec se focava era Harmony.

A menina estava parada, completamente imóvel, na frente dos monstros. Mais especificamente na frente do que se encontrava no meio, que era um pouco mais do que os outros, e tinha o olhar focado nela. Assim como ela tinha o olhar focado nele, e poderia jurar que alguma coisa fazia com que não o desviasse, por mais que quisesse. 

E ela sentia que estava perdendo a consciência... e um zunido chegou aos seus ouvidos... mas continuava de pé, de alguma forma, porém não tinha tanta certeza se possuía controle sobre o próprio corpo.

A única coisa que Alec podia fazer era prestar atenção em tudo, porque, pelo olhar que recebia dos dois outros demônios, chegou à conclusão de que provavelmente seria atacado ao primeiro passo que desse na direção de Harmony. Achou que era melhor não arriscar por agora.

Mas o que Alec não sabia, não havia se dado conta, era que a menina não conseguia se mover, não conseguia pensar direito, e sequer poderia fazer alguma coisa em relação à isso. Não fazia ideia do que estava acontecendo. 

Seus pensamentos se tornaram nebulosos e confusos, e pareciam ir para longe dela cada vez mais, deixando sua mente para trás, apenas com um estranho vazio a preenchendo. E então seu olhar escureceu, e ela de repente estava olhando para o nada. 

Alec continuava parado, tentando não fazer nenhum movimento brusco, e começou a perceber que havia algo errado, porém não conseguia pensar em nada que pudesse fazer, sendo vigiado daquele jeito. Talvez se a chamasse...

- Harmony. - ele murmurou, e um dos demônios torceu a cabeça deformada levemente para o lado, o olhar ainda focado nele.

- Harmony. - repetiu, um pouco mais alto desta vez. A menina não esboçou nenhuma reação, mas o monstro virou a cabeça para o lado oposto. E, quando o homem percebeu que suas tentativas não estavam dando muito certo, resolveu arriscar um pouco.

- Harmony!

Não havia sido um grito muito alto, mas, mesmo assim, alto o suficiente para que todos naquele ambiente pudessem ter escutado claramente, e com um exagero notável no volume. Mas Harmony continuou completamente imóvel, e a séria preocupação tomou conta de Alec, o que só se agravou quando o demônio soltou um grunhido. E acabou piorando ainda mais quando o maior entre eles começou a se aproximar perigosamente da menina.

A respiração de Alec se tornou descompassada, e quase como um reflexo involuntário, deu um passo à frente, o que percebeu na hora que não foi uma boa ideia. Um dos demônios soltou um barulho estranho, ao mesmo tempo em que se moveu, ficando mais próximo do homem, que, por zelo à sua própria vida, resolveu permanecer estático. Mas, mesmo assim, seu olhar continuou focado em Harmony.

O demônio, com uma lentidão quase agonizante, ainda continuava a se aproximar dela, ainda direcionava o olhar penetrante e estranhamente racional aos olhos dela, e, com isso, ainda a mantinha em uma espécie de hipnose mental, sugando toda a sua consciência...

Um minuto deve ter se passado, e aquilo que Alec mais estava temendo que acontecesse realmente aconteceu bem diante de seus olhos. Uma das enormes, longas e afiadas garras do demônio começou a se erguer na direção de Harmony, que continuava impressionantemente imóvel. 

Foi tudo tão rápido que Alec mal teve tempo de piscar.

Em um movimento fluido e ágil, a garra se levantou de uma vez só. No entanto, parou abruptamente quando estava a míseros centímetros de distância do rosto da menina. Os olhos dela agora estavam diferentes... tingidos de dourado. E aquela mesma runa que havia destruído um demônio dias atrás brilhou, iluminando todo o ambiente, o que chamou a atenção do que estava ali. Mas, quando os olhos dele se fixaram na intensidade daquele brilho, bem no ponto de origem, um rugido de dor saiu de sua boca, e agora cambalente e com as garras desajeitadamente postas sobre o rosto, cobrindo os olhos, ele finalmente se afastou, debatendo-se e, segundos depois, desabou no chão de pedra.

Alec observou tudo completamente parado, e só percebeu que havia dado passos para trás quando se viu encostado na parede. Nenhum demônio estava o observando agora, já que os outros dois tinham se aproximado do maior, que agora dava pequenos espasmos, esparramado no chão. A luz que vinha do pulso de Harmony estava se enfraquecendo aos poucos, mas, antes que pudesse se apagar completamente, Alec pôde observar o monstro derrotado. E, quando o fez, percebeu que, em seu rosto, se encontravam duas órbitas vazias, com uma leve fumaça saindo de cada uma delas. 

O demônio ficou inerte ao mesmo tempo em que o homem ouviu um barulho, e quando olhou um pouco para o lado, viu Harmony jogada no chão. Um pouco desnorteado, logo se apressou em ir até ela. 

Enquanto se abaixava ao lado da menina, ainda com receio de que os demônios fossem até eles, um leve brilho avermelhado chamou sua atenção, vindo do outro lado da sala. O demônio maior continuava imóvel no chão, mas os outros dois desapareceram no momento em que entraram em uma espécie de portal.

Um silêncio absoluto tomou conta do local. A única coisa que se ouvia era a respiração acelerada de Alec, que se encontrava ajoelhado ao lado de uma Harmony desacordada. 

- H-harmony. - ele murmurou, a voz falhada - Ah, por favor...

Ele levou aos mãos até ela, e estremeceu quando tocou o rosto frio. Os olhos dele se arregalaram, e as batidas de seu coração estavam tão descontroladas que achou que fosse infartar. Mas respirou fundo e, com uma das mãos, foi descendo lentamente por seu rosto, chegando no pescoço igualmente frio. E então, com os dedos, começou a tentar desesperadamente encontrar uma pulsação. 

O alívio que percorreu o corpo de Alec quando encontrou aquele sinal de vida foi tão grande que ele não poderia dizer se já tinha sentido algo parecido na vida. 

- Alec! - a voz familiar chegou até ele quando estava prestes a pegar a menina nos braços, segundos depois - Alec! Harmony!

- Estou aqui embaixo! Estamos aqui embaixo. - quando disse isso, se lembrou de que Jace também estava ali com eles. E se perguntou se ele estava...

Só foram necessários três passos longos para que chegasse até ele. E, quando se abaixou ao seu lado e fez a mesma coisa que havia feito com Harmony, soltou um suspiro de alívio, levantando lentamente logo depois, praticamente ao mesmo tempo em que Izzy terminou de descer as escadas, parando bem na entrada do lugar.

Seu olhar viajou de Alec, para Harmony, para o demônio e para Jace repetidas vezes, antes de começar a andar até a menina.

- O que aconteceu? - perguntou, se abaixando ao lado dela - Eles estão bem...?

- Estão vivos. Não sei... não sei muito bem o que aconteceu. - falou, seu olhar viajando de Izzy para o corpo que estava não muito longe - O demônio, ele... fez alguma coisa com Harmony. Foi muito estranho.

- Vamos subir. - ela disse enquanto passava os braços ao redor da menina e a erguia do chão - Clary está... preocupada.

Nenhum dos dois disse mais nada enquanto Alec pegava Jace nos braços e, logo em seguida, subia as escadas, com Izzy logo à sua frente.