Mentiras

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Marc não soube como reagir à cena que se desenrolava na sua frente. Um Archie sorridente segurava em seus braços uma recém-nascida que dormia profundamente. Ele a  balançou para cima e para baixo, depois para os lados, lentamente, embalando-a para que continuasse dormindo. 

    O que deixava Marc ainda mais boquiaberto era a destreza que Archie tinha para lidar com qualquer situação nova. Ele havia lhe confessado, no carro, que nunca tinha segurado um bebê, mas lá estava ele, sentado na poltrona, com uma felicidade genuína estampada em seu semblante. 

    Os pais também estavam radiantes de alegria. Adeline possuía olheiras embaixo dos olhos, mas sua pele brilhava com o nascimento da filha. Os cabelos castanhos, da mesma cor que os de Marc, caíam por seus ombros em ondas bonitas e sedosas. O pai, Jacques, parecia mais emocionado do que a esposa, e olhava para a recém nascida com admiração. 

    ━Ela já gosta de você, Archie. -Adeline murmurou com um sorriso, ao ver a filha bocejar e voltar a dormir- Resta saber se ela gosta do Marc. -olhou para o filho com curiosidade

    ━Por que não a segura, filho? -Jacques sugeriu- Admito que eu também estava com medo de machucá-la, mas era um medo sem fundamento. 

    Marc começou a suar com aquela sugestão e sentiu-se pressionado. Suas mãos estavam no bolso da calça preta que vestia e, quando Archie encontrou o seu olhar, incentivou-o a segurá-la. Suspirou com uma expressão derrotada e tentou ajeitar os braços para recebê-la. 

    ━Aqui. -o garoto levantou-se da poltrona e, com cuidado, colocou-a nos braços de Marc

    O bebê mexeu-se e resmungou baixinho e logo voltou a dormir. Marc observou os traços da irmã e tentou encontrar alguma semelhança consigo, mas não conseguiu. Em seguida reparou melhor e notou algumas pintinhas no pescoço dela, por isso sorriu sem perceber.

    O quarto tornou-se silencioso e todos fixaram o olhar na cena que se desenrolava. Eram raras as vezes em que Marc sorria genuinamente e se deixava ser vulnerável. Adeline, ao ver o filho segurar a recém-nascida, lembrou-se filha falecida e, em poucos minutos começou a chorar baixinho. O marido tentou confortá-la, abraçou-a com carinho e ajeitou seus cabelos, mas nada adiantou. Ela chorou mais e a situação tornou-se difícil para Marc.

    O bebê começou a chorar em seus braços e Marc viu-se deslocado e em pânico. Archie pegou-a rapidamente e embalou-a nos braços, fazendo-a acalmar-se em poucos minutos. 

    Marc olhou para a mãe e engoliu em seco, sabendo muito bem no que ela estava pensando. A última vez que ela havia ido a um hospital a notícia não tinha sido boa. Subitamente ficou irritado por ter vindo e o arrependimento por estar ali, parecendo um intruso, lhe deixou mais amargurado ainda. 

    Pegou a carteira de cigarros e o isqueiro do bolso. Virou as costas e, sem nenhuma palavra, saiu do quarto, deixando um Archie atônito encarando suas costas.

_____

    Tragou o cigarro longamente, soltando a fumaça pela boca em seguida. Sempre que ficava nervoso ou agitado recorria à nicotina para sentir um pouco de tranquilidade e relaxamento.

    Olhou para o horizonte, sentindo a irritação de minutos atrás diminuir. Ao longe viu Archie caminhando lentamente na sua direção. Ele chegou perto o bastante para que sentisse o cheiro de seu shampoo de morangos. Sentiu uma vontade súbita de acariciar seus cabelos por longas horas e enterrar o rosto em seus cachos (pois adorava fazer isso quando estavam sonolentos e abraçados).

━Eles me disseram o nome dela, é Marie. -Archie disse e encostou-se ao seu lado no capô do carro.

Marc não disse nada e, após alguns segundos, disse:

CicatrizesOnde histórias criam vida. Descubra agora