Capítulo 4

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Jade Prescott

Expectativas. Eu as odeio. Principalmente quando depositam elas em mim, me sinto pressionada e acabo fazendo tudo errado. É uma droga olhar para o lado e ver pessoas colocando expectativa em você para fazer algo que nem quer.

Estou no penúltimo ano do ensino médio e ainda não sei qual curso da faculdade quero fazer. Não sei nem se quero fazer uma faculdade. Sempre digo para todos que vou fazer psicologia porque gosto do relacionamento que tenho criado com a minha psicóloga, mas sinto que isso não é para mim — não sou de interagir com as pessoas.

Se você me perguntar o que gosto de fazer, eu te direi que é dançar. A dança é como se eu me sentisse livre, adoro dançar. Mas se quiser saber do que eu realmente amo, falarei que é cantar, sem pensar uma vez. Amo cantar, é como se tudo ao meu redor fosse se resolver com uma só canção.

Posso estar em um momento bastante aleatório da minha vida, contudo, mesmo que me ofendam, apenas cantarei os xingamentos para longe. Podem me chamar de garota vazia, não ligarei, apenas cantarei Hollaback Girl.

Às vezes penso que estou em Glee para poder sair cantando no meio de todo mundo — o pior é que para eles dá tudo certo. Encontro a maioria das soluções dos meus problemas com a música.

Eu posto vídeos cantando no Instagram e recebo mensagens positivas de pessoas comentando que, de fato, canto bem. Não querendo ser modesta, também acho que canto bem, na minha humilde opinião, é claro. Na verdade, já cogitei a ideia de fazer faculdade de música, pois gostaria de ser cantora, mas aí lembro do meu pai. Ele já me trata de uma forma ruim, se eu resolver fazer faculdade de música ou de artes, ele acaba comigo.

Aí está um grande impasse, ser feliz fazendo o que amo e fazer meu pai me odiar mais ou ser infeliz e descontente com a minha vida e com meu pai tendo um certo "orgulho" de mim?

Esses dias, parei para pensar na minha vida e em todas as minhas decisões, descobri que admiro tanto a Zoe, ela sempre parece tão segura de si e tão decidida com o que quer. Falando em Zoe, nós voltamos a ser "amigas", ainda estamos em um momento de adaptação com isso, mas, na primeira mensagem que trocamos, consegui me abrir com ela como nunca me abri com ninguém. Ela também já dividiu algumas coisas sobre o seu passado comigo e que me deixaram sem um pingo de reação. Ela descobriu que é descendente de índios e está bastante feliz com isso, desde que a conheci, há alguns anos, ela sempre apoiou a causa indígena e isso é muito lindo. Adoro ver a felicidade das pessoas que eu gosto.

Você deve estar se perguntando "E o Damon?". Bom, já faz alguns dias desde que peguei o número dele e ainda nem o chamei.

Além de Damon, ainda temos que comentar sobre a minha amiga Rebecka, melhor amiga... Eu acho, não sei ao certo. Rebecka é aquele tipo de garota mimada pelo pai e que odeia a mãe, pois a mesma não realiza os seus desejos. Não entendo o porquê de a chamar de melhor amiga, talvez porque ela me chame assim também, mas não agimos como melhores amiga, sei lá. Ela é muito diferente de mim e temos personalidades totalmente opostas. Ela diz querer igualdade no mundo, mas, na primeira oportunidade, está diminuindo alguém, e normalmente esse alguém sou eu. Tento ao máximo ignorar o que ela diz, há muito tempo não paro para escutar o que ela fala. Quando estou com ela, tudo ao meu redor parece parar. Uma Jade sem o menor interesse de saber o que a Rebecka fala aparece. Não me preocupo em saber qual a próxima artimanha dela para deixar a mãe com raiva.

Meu ciclo de amigos é muito pequeno e bastante selecionado desde os fatídicos acontecimentos.

Eu tinha uma melhor amiga chamada Jordan, não, melhor ainda, eu a considerava uma irmã para mim, daquelas de dividir tudo mesmo. Até acontecer o lance do estupro comigo no qual fiquei grávida. Ela passou quase dois meses dizendo me apoiar, mas logo virou as costas para mim e me tratou como um lixo, começou a falar mal de mim até para as baratas que apareciam no banheiro dela. Nunca soube o porquê e nem quero saber. Não quero mais nenhum tipo proximidade.

Não guardo nenhum tipo de rancor, mas me doeu bastante saber disso, eu contava tudo para ela. Mas se ela precisar da minha ajuda em algum momento, estarei lá para ajudar, nunca hesitei em ajudar ninguém e não será agora que farei isso. Desejo muitas coisas boas para ela. Talvez eu seja ingênua em pensar dessa maneira, mas aconteça o que acontecer, eu nunca vou deixar de ajudar e acreditar que as pessoas podem mudar. Talvez essa seja a minha doença.

Além dessa história com Jordan, ainda preciso falar de Peter... Nem sei por onde começar.

Peter e eu estamos nos dando bem, estamos mais próximos e conversamos sobre diversos assuntos. A gente tem muito em comum. Ele sempre leva algo decente para eu comer quando tenho que passar a noite com a minha avó no hospital.

Os tratamentos pelos quais ela está passando são bem intensos, é muito difícil eu chegar e ela está acordada. A enfermeira disse que os medicamentos são muito fortes e isso faz com que ela fique com muito sono. Mas quando eu chego e ela está acordada, a gente sempre acaba conversando. Ela fala sobre o dia dela e pergunta como foi o meu. Leio alguns trechos do livro que estou lendo no momento para ela e ela adora. Conversamos sobre como está a casa e ela não vê a hora de ser liberada e voltar para casa. Eu também não vejo a hora disso acontecer. Tenho saudade até das reclamações de que eu deixei o copo do liquidificador fora do lugar. Ela é preciosa demais para mim, meu porto seguro.

É inevitável pensar o quanto eu gostaria de trocar de lugar com ela. Odeio vê-la desse jeito, fraca e sem fazer o que tanto gosta que é cuidar de todos nós. Odeio vê-la sofrer e gemer de dor quando as vezes chego no horário do tratamento. Sempre que tenho que ficar durante a noite, choro enquanto ela dorme, baixinho, para ela não escutar. Me dói muito.

— Oi. — Peter dá duas batidas na porta. — Trouxe comida para você.

Me levanto, olho para minha avó que dorme calmamente e saio do quarto. Sorrio para Peter.

— Obrigada, você está salvando meu estômago dessa comida de hospital — falo enquanto abro a sacola do Ruby's sentindo o cheiro maravilhoso do hambúrguer e da batata frita. — Quanto eu te devo? — pergunto e vou em direção ao refeitório para comprar um suco. Peter me segue.

— Não precisa me pagar nada.

— Claro que eu preciso, você está fazendo muito saindo da sua casa a essa hora para trazer alguma coisa para eu comer.

— Você não me pediu para trazer nada. Eu trouxe por vontade própria, e não vou aceitar o seu dinheiro.

Reviro os olhos enquanto me sento em uma das mesas e começo a comer. Talvez eu tenha soltado um gemido baixo de satisfação que fez com que Peter risse.

Ele está sendo muito atencioso em fazer isso por mim. Não pedi em nenhum momento que ele fizesse esse esforço por mim e isso me deixa um pouco intrigada. Será que ele está esperando algo em troca? Ou está fazendo isso só por que quer?

Fica a dúvida.

— Então, o nosso jantar daquele dia não deu muito certo né? — Ele diz.

— É.. Quando tudo ficar mais calmo por aqui, a gente pode tentar de novo — falo depois que mastigo.

— Seria ótimo. — Ele sorri. — Sua avó está melhorando?

— Ela está mais fraca a cada dia, mas o médico disse que é normal por conta do tratamento contra o câncer.

— Entendo, mas ela vai ficar bem. É nessas horas que temos que ter fé.

Não sou uma pessoa muito religiosa. Eu acredito em Deus, acredito que ele existe e que está sempre olhando por cada um. Mas não acho necessário está sempre dentro de uma igreja e fazendo coisas absurdas para provar que acredita nele. Se ele mora dentro de nós então acreditar já basta, não é?

Necessito de MimOnde histórias criam vida. Descubra agora