game over

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— Quer beber alguma coisa? — depois de uns dez minutos, onde eu apenas chorei e manchei sua camisa de rímel, ele me perguntou. Afirmei com a cabeça. — Serve vinho?

— Qualquer coisa serve. — respondi com a voz embargada, me jogando no tapete de sua sala. Maya iria dormir fora e última coisa que eu queria hoje era ficar sozinha.

— Quer me contar o que aconteceu? E fica tranquila, minha mãe já está no sétimo sono a essa hora. — Dave trouxe uma garrafa e duas taças e se sentou ao meu lado no chão. Estava tão atordoada que tinha até esquecido que ele não morava sozinho.

Eu adorava a mãe dele, sempre que eu vinha aqui ela me tratava como a filha que nunca teve. E apesar disso ser ótimo, ainda doía em mim. Tudo que me lembrava o amor maternal que eu nunca presenciei era uma ferida aberta e que eu preferia deixar bem escondida.

— Eu... não fui muito sincera com você ultimamente. — beberiquei o vinho, fazendo uma leve careta. Nunca me acostumava com o gosto. — Eu tava saindo com uma pessoa, tem quase um mês...

— Ah, eu sei. — apesar do sorrisinho, percebi o incômodo na voz de Dave. Ele também bebeu do vinho, um gole bem maior que o meu. — Você não é a melhor pessoa em contar mentiras.

— Desculpa... de verdade. Mas eu queria ver se ia dar certo primeiro antes de falar qualquer coisa. — não era totalmente mentira, mas também não era o principal motivo. — Acho que você já viu que não deu.

Deixei uma risada carregada de sarcasmo escapar. Nessas últimas semanas tudo parecia tão certo, cada saída ou mensagem trocada com Christian, por um momento parecia que nada poderia estragar aquilo. Eu ainda sentia o nervoso típico do começo de um relacionamento toda vez que nós nos víamos, toda vez que aqueles olhos castanhos me olhavam como se tentassem entender cada pedacinho confuso de mim. O amargo do vinho na minha boca me lembrava nosso segundo encontro, quando no final do dia ele acendeu um cigarro e eu insisti em experimentar. Pior escolha da minha vida, mas valeu a pena só de ouvir a sua risada ao me ver tossir como louca com a fumaça presa na minha garganta.

— O que aconteceu? — Dave ainda não me olhava diretamente nos olhos, parecia que qualquer coisa na sala era mais interessante. A culpa por ter escondido tudo dele caiu em mim de uma vez, e ela era esmagadora.

— Ele... teve que ir embora. Se mudar. Pode ser que ele nem volte mais. — segurei o choro e destruí o nó em minha garganta com um longo gole do vinho. Enchi a taça novamente e tomei mais um pouco, já sentindo os efeitos do álcool começarem a chegar. — Não era pra eu estar assim, eu já sabia que não daria certo, desde o começo...

— Como assim? É impossível você saber algo assim, Aly. — Dave se aproximou, nossos joelhos se esbarraram e aquele simples toque acendeu algo em mim que eu preferia não ter sentido.

— Eu sabia, todos sabiam. Todo mundo falava que não eu era pra eu me aproximar, pra nem tentar. Mas eu fui teimosa, insisti em ver algo que mais ninguém via. E esse algo estava lá, eu estava certa... só que agora eu queria não estar.

Não precisei falar mais nada. Dave cortou qualquer proximidade entre nós e chegou para trás, a expressão de quem não queria acreditar. Meu peito apertou.

— Esse cara... era o Christian? Christian Gonzales? — tinha raiva em sua voz, mas seu rosto era de incrédulo. — Foi ele que te deixou assim, Aly? Puta que pariu... — seus dedos ficaram brancos, ele apertava a taça com tanta força que eu temia que ela fosse quebrar. — Foi isso que a gente tentou te avisar, Aly. É isso que acontece quando você se envolve com um cara assim. Eu falei, a Maya falou, por que você não escutou a gente? Você não estaria assim agora se simplesmente tivesse escutado seus amigos.

Eu já tinha desistido de segurar as lágrimas, elas caíam pelas minhas bochechas enquanto Dave falava. Ele estava certo, eu sabia. Mas eu também não me arrependia por ter feito o que fiz, por ter cavado mais fundo e ver que Christian era de verdade uma pessoa boa. Não me arrependo de nenhum momento. Não me arrependo de sentir que as coisas poderiam ter sido diferentes, não me arrependo de ter me apaixonado pelo cara que me tratou bem e me fez sentir especial em cada vez que saímos.

— Desculpa, mas te ver assim está me matando por dentro. Principalmente por saber que a culpa é dele. — Dave me abraçou e eu enterrei a cabeça em seu peito, tentando fugir daquilo tudo por pelo menos alguns segundos. Eu deveria falar que Christian não era esse demônio que ele achava que era, deveria o contrariar, falar que eu estava chorando porque nós não tivemos uma chance de chance de ser um casal de verdade, e não porque ele me magoou. Mas do que adiantaria agora?

— Eu estava gostando dele de verdade, Dave. E eu queria te contar, mas eu sabia que essa seria sua reação. — separei-me de seus braços e terminei o que deveria ser minha terceira taça de vinho. Deitei a cabeça no sofá com os olhos fechados e senti que meu equilíbrio já estava afetado. Ótimo. — Mas eu não quero mais falar sobre isso hoje, tá?

— Tudo bem.

Eu sabia que ele ainda estava incomodado com aquilo tudo, podia sentir a raiva emanando de seus poros. Mas ele escondeu bem, apenas ficou em silêncio ao meu lado e terminou a garrafa de bebida na nossa frente.

Os momentos com Christian ainda passavam como um filme na minha cabeça. Como a vez que fomos tomar sorvete mesmo num frio de 5° graus que fazia. Quando íamos embora, sua mão desceu do meu ombro até minha cintura e ficou ali até chegarmos em sua moto. Eu lembro que me arrepiei da nuca até os pés e me senti a garota mais bonita do lugar, como a nerd acompanhada do garoto popular num clichê de ensino médio. Ou então bem antes disso, antes de começarmos a sair, toda vez que eu ficava nervosa, por qualquer que fosse o motivo, a lembrança de Christian me acalmando no elevador vinha na mente e eu relaxava na hora. A luz vermelha tornava tudo mais assustador na hora, mas agora, depois que o pânico se foi, só deixou Christian mais atraente. Suas mãos segurando as minhas, os olhos preocupados que não saíram dos meus até que meu coração não estivesse mais a ponto de explodir.

E como eu poderia esquecer do dia que eu vi mais dele do que eu queria? O sangue vermelho escuro sujando meus dedos enquanto eu o costurava, sua respiração ofegante ecoando pelo banheiro. Eu tentei prestar atenção no que fazia, mas era inevitável não admirar o corpo na minha frente de vez em quando. Cada traço seu era bonito, parecia que tinha sido desenhado especialmente para ele. E as cicatrizes, tantas espalhadas por sua pele, que só revelava o tipo de vida que ele levava, mas que só me fizeram ter vontade de conhece-lo mais. Eu queria conhecer a história de cada uma, perguntar quais ele mesmo tinha fechado, ou se alguma garota já tinha feito o mesmo que eu. Só o pensamento me deixou com um ciúmes ridículo, e eu me forcei a voltar para a realidade.

Dave me olhava, o rosto apoiado na mão e as ondas do cabelo caindo sobre seus olhos. Por um instante eu imaginei como teria sido se eu tivesse me apaixonado por Dave, ao invés de Christian. Não era algo impossível. Eu achava Dave um dos caras mais bonitos que já tinha visto, com aqueles olhos verdes escuro, que não importava a luz, estavam sempre brilhando. E aquele cabelo, era um mistério como ele sempre estava bagunçado e ao mesmo tempo sempre estava bonito. Sem contar que desde o dia que nos conhecemos, ele tem sido tão bom pra mim. Sempre tão atencioso e carinhoso, fazia de tudo pra me fazer rir e me ver bem.

Eu não sei bem o que aconteceu. Pode ter sido o álcool, ele já tinha me feito fazer várias coisas que eu nunca faria sóbria. Ou então a decepção amorosa, que doía mais que tudo, mas que naquele momento... se tornou quase uma raiva. Não sei o que foi, nem adiantava tentar explicar, mas assim que me dei por si, eu estava em seu colo, devorando seus lábios num beijo desesperado. Suas mãos ansiosas corriam pelo meu corpo, apertando minhas coxas e me fazendo suspirar a cada espaço livre entre nossas bocas.

— Aly, tem certeza disso? — nunca o odiei tanto por nos separar. Apenas afirmei com a cabeça e voltei a colar nossos lábios, uma chama crescia dentro de mim e queimava qualquer pensamento que dizia que era melhor parar. É claro que eu não tinha certeza, mas a luxúria falava mais alto. A culpa era toda dele por ter me beijado naquela festa do lago e me fazer ficar dias pensando naquele beijo. A culpa era toda dele.

Eu poderia me arrepender daquilo pelo resto da minha vida, mas já estava tudo indo por água abaixo mesmo, por que não terminar de me afogar?

Uma Segunda Chance (PAUSADA)Onde histórias criam vida. Descubra agora