01 | o sol e a lua

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G R A C E

Nada muda o fato que eu não conseguia me divertir em meio a multidão, onde todos dançavam, comiam com fartura, e festejavam por terem orado por semanas para os seres de luz que nos protegem através dos tempos.

O Vale das Cinzas se dividia em uma pirâmide hierárquica, onde os moradores dos Alpes, os pontos mais altos e afastados, eram muito abastados, e giravam a economia local. Mas estes dependiam muito dos que viviam no região Intermediária, pessoas que poderiam ser consideradas de boa situação financeira por se tratar de comerciantes, mercadores, a segurança, e também os curandeiros que cobravam cada vez mais caro por uma consulta de saúde.
E os da Vila, como eu, que para sobreviver prestam serviços braçais ou domésticos para ambas partes da pirâmide.

E todos da Vila, sonhavam em um dia subir de posição. Mudar sua realidade.

Mas havia um dia, onde todos independente de como vivem, se reuniam.

Na grande festa do Sol e da Lua.

Quando eu era criança, a festa do "Sol e da Lua" era minha favorita, mais que meu próprio aniversário ou o aniversário do Vale das Cinzas, onde acontecia um festival que tem por duração: uma semana inteira.

Eu podia ouvir Lyra minha melhor e única amiga, falando novamente sobre como Eric Vallahar era o rapaz mais lindo, educado, e cavalheiro do vilarejo e que um dia ele a notaria, pediria sua mão ao seu irmão, eles se casariam, teriam uma bela família, e seus filhos teriam nomes das constelações assim como ela.

Eu concordava com a cabeça, para fingir que estava prestando atenção, mas eu só conseguia pensar no meu pai, com toda bebida disponível aos homens, iria beber novamente, e quando isso ocorria, ele se tornava rude e agressivo, chegou a me agredir muitas vezes, por um jantar que ainda não estava pronto, por eu pedir que ele não bebesse daquela forma, ou por eu falar de minha falecida mãe. E por vezes descontava na pouca mobília que tínhamos em casa.

Minha irmã mais velha, Grazielle, fez um bom casamento. Com o sheriffe Roosevelt, indo viver no Intermediário, e isso era mais um motivo para represálias dentro de casa. Eu ainda não havia encontrado um possível candidato a marido, e completaria dezenove em algumas semanas, muito mais velha que o comum entre as moças solteiras.

Eu tinha muitos poucos pretendentes, mas um deles, era logo Victor Kingsley, vivia nos Alpes, era muito bonito e respeitado, diziam até que seria candidato a prefeito, deveria ser a minha a escolha, mas pelas poucas vezes que estive na presença dele, meu coração, como em uma intuição, clamou para que eu mantesse distância.

Normalmente os pais podem fazer as negociações de casamento, mas o meu felizmente ainda não foi feito, porém para papai, ser cortejada por um dos homens mais ricos do Vale das Cinzas, e não lhe dar a devida atenção, era motivo para que eu levasse uns bons tapas, até que aceitasse me casar.

Pois Victor antes impôs que eu também quisesse isso.

E era nobre da parte dele.

Lyra achava que minha resistência tinha haver com ele ser primo de um Espírito do Fogo, o monstro que matou os próprios pais a três anos, e foi expulso do vilarejo, levado até a margem da Floresta das Labaredas, onde não havia saída.

Se tratava de Damian Kingsley, na época, era um jovem de vinte anos, muito ambicioso, queria logo cuidar da fortuna da família que estraía o minério que usavam para a fabricação de armas. Seu pai vivia negando isso a ele por saber que este era irresponsável. Eles moravam nos Alpes, um tanto afastados demais das outras propriedades, pelo que é dito, ele colocou fogo na própria casa depois de uma noite de bebedeira para matar os próprios pais.

Eu mesmo, vi Damian no máximo três vezes apenas, antes de tudo isso.

Victor e seu irmão mais novo Vincent são órfãos, com seus tios mortos e Damian exilado, herdou toda a fortuna dos Kingsley. E ele diz por ai, como seu primo era odioso, como não conversava com muitas pessoas pois detestava todo o vilarejo, e ficava bastante tempo recluso, tramando coisas, pois era uma pessoa sombria.

Damian após seu crime hediondo, foi sentenciado a pior das punições. O exílio. Não poderia mais voltar para o vilarejo pois seria enforcado em praça pública. O que restava, sem saída, era entrar na Floresta das Labaredas. Todos esperavam que as criaturas o matassem. Mas Damian Kingsley em forma humana, foi visto a mais de um ano, a metros da barreira. O próprio sheriffe estava presente e confirmou, que ele não só estava junto a eles. Mas havia se tornado um deles, e tanto faz, que fez questão de mostrar a todos, se transformando em um espírito de fogo, tão logo foi visto, quanto desapareceu junto aos outros se embrenhando na escuridão da floresta.

O que provava que seu coração era tão maligno, que o fogo não o consumiu, mas se fez parte dele, como se era contado a nós, passado de pai pra filho, desde a infância, por conta da necessidade de manter nossos corações puros de toda maldade.

E eu por vezes me perguntava, como meu pai não havia se tornando uma criatura dessas, mas logo afastava o pensamento, pois talvez esses tapas e toda grosseria que ele dispõe a mim, seja pensando no meu próprio bem, por eu não entender muito da vida.

Eu nunca vi nenhuma dessas criaturas, mas todos que os viram, dizem que são seres das trevas.
Haviam as terríveis bruxas que não foram queimadas pela inquisição, viviam por séculos com seus feitiços. Mas os mais horrendos e comuns, são os monstros corpulentos, alguns tem mais de três metros de altura, suas peles são retorcidas e deformadas pelo fogo, envoltos de névoa que se confundia com fumaça ou crepitação. E claro, os mais raros, vistos de séculos em séculos, que se parecem com humanos mas podem se transmutar, parte ou todo o seu corpo, em chamas, aparecer e desaparecer, seu toque era a pura destruição. E assim era Damian Kingsley, um Espirito do fogo.

Mas todos eram feitos da magia negra mais antiga.

Essas criaturas não entravam no vilarejo, pois há séculos atrás, seres de luz, santidades, protegeram nossa morada, deram sua vida em uma profecia que sugou suas forças vitais, para deixar-nos seguros, para viveremos tranquilamente, protegidos por uma barreira invisível, como água corrente que se faz em ácido unicamente para essas criaturas.

Minha avó dizia que os avós dela presenciaram quando um deles tentou entrar. Jamais conseguiu.

Se defez em cinzas.

E como as cinzas, meus pensamentos se desfizeram ao notar Victor Kingsley vir em minha direção com um sorriso.

Fiquei tensa, sentindo pequenas cotoveladas no meu braço.

- Olha quem está vindo! E ele está muito lindo esta noite... - Essa era a Lyra.

- Eu sei. - Resmunguei. Ele realmente estava muito bem trajado, era um belo homem eu não podia negar, tinha por volta dos trinta, cabelos acobreados e olhos azuis... Mas ainda sim, eu só conseguia o ver como um homem qualquer.

- Grace, que prazer em vê-la! - Disse se aproximando.

- Olá, Victor. - Cumprimentei, o vendo acenar com a cabeça para Lyra.

- Precisamos conversar. - Disse ele, chegando mais perto.

- Sobre? - Eu quis saber.

- Nosso casamento.

__________

EIS O NOSSO PRIMEIRO CAPÍTULO❤

Damian logo vai aparecer.

Estamos apenas começando, mas espero que essa parte mística (que é nova pra mim) não esteja muito confusa, se vocês acharem que está, podem me falar (me perguntar também), pois eu realmente gosto de ter a opinião dos leitores pra escrever.

Agradeço desde já.

beijos

- cris

O que queima através de nós | LIVRO IOnde histórias criam vida. Descubra agora