Penúltimo Capítulo - O Comandante

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Narrado por Raymond Steele. 



Covardia. 
Ta aí uma palavra que combina perfeitamente comigo. 
Quando mais jovem, me sentia sufocado. 
Oprimido pelo meu pai, o poderoso John Steele. 
Há gerações minha família vem fazendo história no exército dos Estados Unidos da América, o país mais poderoso do mundo e este sentimento de posse, de poder, sempre foi muito importante para John que me criou com muita rigidez, contrastando com minha mãe, Ruth, que era uma mulher muito dedicada e carinhosa comigo. 
Nunca tive poder de escolha pois meu pai sempre dizia que um dia iria substituí-lo no exército, mas meu sonho mesmo era ser professor. 
Sim, professor de geografia pois esta sempre fora minha matéria preferida do colégio. 
Mas a covardia sempre me acompanhou e por isso, na hora de escolher minha profissão fiz como sempre, aquilo que John desejava. 
Um dia, durante as férias de verão em uma cidade litorânea conheci e me apaixonei por uma linda jovem. 
Se chamava Carla, mas a apelidei apenas de Cah.
Tinha cabelos castanho claros, olhos escuros, era espevitada e tinha um sorriso cativante. 
Foram os quinze dias mais encantadores da minha vida, regados a boas conversas, muitas risadas, carícias, noites de paixão. 
Ao fim da viagem percebi que estava mesmo apaixonado por Carla e a ela, prometi o mundo. 
Disse que iríamos casar, ter filhos, formar uma família feliz. 
Mas quando voltei da viagem meu pai me deu um banho de água fria ao deixar bem claro que eu não poderia namorar Carla, ainda mais quando soube que ela era de classe social muito inferior a da nossa família, que sempre fora tradicional. Ele disse que eu deveria focar integralmente na carreira militar, no trabalho e que quando estivesse tudo bem iria me casar sim, mas com alguém da mesma classe que eu. 
Quando soube que Carla estava grávida, meus olhos se encheram de lágrimas. 
Fiquei feliz, apesar de preocupado pois sabia que meu pai iria odiar a novidade.
Quando contei ao grande General dos EUA que minha namorada estava grávida, ele se enfureceu de forma absurda. Disse que Carla queria dar o golpe da barriga em mim, até mesmo que o filho que esperava não era meu. Eu defendi a mulher que amava, mas John deixou claro que eu não teria escolha, avisando que se  insistisse e ficasse com aquela doce menina, tornaria nossa vida um inferno para todo sempre e John, jamais deixou de cumprir uma ameaça.
Jamais.
Nem mesmo minha mãe ficara ao meu lado nesse momento, o que enfraqueceu mais ainda meus anseios. 
Foram horas difíceis até que eu tomasse uma decisão.
Eu era muito jovem e ainda dependia financeiramente de John, além de ter muito medo do que ele seria capaz de fazer com Carla caso eu não o obedecesse.  
E foi aí que mais uma vez, fui covarde. 
Quando reencontrei Carla novamente disse a minha garota que não poderíamos mais ficar juntos. Mesmo com ela chorando e ajoelhada aos meus pés, disse não. Porém, ofereci dinheiro, uma ajuda de custo para que ela pudesse cuidar do nosso filho e dar mais conforto a ele pois jamais quis deixa-los desamparados, mas Carla considerou minha proposta uma humilhação e deu um tapa na minha cara. 
Um tapa merecido, que me fez baixar a cabeça.  
Apesar de saber que estava cometendo um erro, que ela iria sofrer e que eu também sofreria como um cão pelo resto da vida, a abandonei de vez e retornei ao quartel do exército no Pentágono, onde morava desde que completei dezoito anos.
O tempo passou, perdi minha mãe, me formei na academia, comecei a subir de patente. 
Conheci algumas mulheres, mas nenhuma era tão adorável quando Carla e por isso mesmo, decidi não me casar.  
Nunca a esqueci e naquele momento, ainda pensava muito nela. 
Quando John faleceu, assumi suas funcões no Pentágono, me tornando um dos homens mais importantes daquele imenso lugar. Participava de muitas operações, guerras e missões todos os dias. Nas horas de folga, tentava descobrir o paradeiro de Carla, mas a única coisa que sabia dela era seu primeiro nome. 
Nem o sobrenome eu sabia, o que tornava a procura cada vez mais difícil.
Até mesmo seu rosto, tão fresco antes em minha memória foi se apagando aos poucos. 
Com o tempo, acabei desistindo de procura-la. 
Mas não guardei toda a dor que sentia só para mim.
Meu melhor amigo, Carrick, sabia de tudo. 
Discordava das minhas atitudes, mas sabia que estava arrependido e me dava o apoio moral que tanto precisava naqueles dias tão difíceis. O fiz jurar pela filha dele, a doce Rosalie, que jamais dividiria meu segredo com mais ninguém.  
E até o momento, ele cumpriu seu juramento com perfeição. 
Quando um casal de amigos muito próximos partiu, decidi adotar o filho deles, uma criança adorável que atendia pelo nome de Christian. 
Aquele foi o jeito que encontrei de me desculpar com meu filho, que estava em algum lugar do mundo sendo criado pela menina que conheci em uma linda praia, muitos anos atrás. Prometi a mim mesmo que faria de Christian um grande homem, ao contrário de mim que sou um mero covarde. 
E aquele garoto moreno de olhos azuis se tornou meu grande orgulho, sendo hoje um importante Coronel tanto dos Sentinelas, quanto do exército em geral. 
Com o passar dos anos, tentei viver em paz. 
Criei meu filho com carinho e aos poucos, fui focando mais na parte burocrática do trabalho no Pentágono, me afastando das missões e indo somente nas mais importantes para me poupar um pouco pois a velhice está cada dia mais perto e eu, cada vez mais cansado dessa área  militar. 
Quando conheci Anastasia tive simpatia pela moça e a achei parecida com alguém que conheci ao longo da vida, mas jamais imaginei que aquela corajosa Tenente fosse minha filha de sangue. Ela pareceu sim suspeita vez ou outra, mas nada muito explícito, que pudesse revelar algo ou causar grandes desconfianças em mim. 
Pelo menos não até o dia em que fui sequestrado. 
Já tinha sido sequestrado por inimigos outras duas vezes por questões de trabalho, mas agora a inimiga em questão era minha filha, fruto do único amor verdadeiro que tive nesta vida.
Foi doloroso olhar pra ela e ver um ódio tão grande dentro de seus olhos, uma fúria, uma inquietação, um desejo de vingança incontrolável. 
Anastasia me maltratou, me torturou, me destruiu.  
Destruiu sim porque cada palavra dela digirigida à mim era muito dolorosa. 
Era como se uma faca estivesse sendo enfiava no meu peito, me rasgando por dentro. 
Mas o pior de tudo foi quando ela disse que Carla estava morta.
Nunca imaginei que aquela menina de sorriso fácil fosse adoecer por minha causa. Graças a minha maturidade e experiência de vida, eu sabia que ela tinha se suicidado por conta da depressão, uma doença muito grave, mas sabia também que tinha responsabilidade no que tinha ocorrido com ela na juventude e mais ainda, no destino infeliz que Anastasia e ela tinha sido. 
Saber que Carla estava morta acabava de vez com minhas esperanças de um dia reencontra-la e pedir perdão por toda a dor que a causei. 
Pelo menos não em vida.
Durante aquelas horas de fortes discussões e ameaças de morte, percebi que tinha feito só burradas na vida. Que o erro de ter abandonado minha filha teve um preço muito maior do que imaginei que fosse ter. 
Um preço e um peso imensamente grande. 
Em alguns momentos, pensei que Anastasia fosse me matar.
Em outros, que não teria coragem.
Em alguns, desejei que me matasse mesmo para que eu tivesse o fim que merecia, indo para o inferno para talvez, pagar meus pecados e encontrar minha Carla. 
Em outros, tinha vontade de sobreviver. 
No final das contas, fui resgatado com vida pelos Sentinelas e pelo meu filho do coração, Christian. 
Enquanto era atendido pelos socorristas, fui dando conta do que tinha acontecido e a dor que sentia dentro de mim, aumentou ainda mais. 
Quando cheguei em casa, tive uma dura conversa com Christian, descobrindo que ele era o pai do neto que Anastasia perdeu naquela maldita explosão.
Um neto... 
As vezes, me pego pensando como teria sido minha vida se tivesse tido peito para encarar meu pai e viver minha paixão com Carla. Nós teríamos nos casado, eu teria trabalhado em um emprego pouco valorizado para sustentá-las, mas certamente teria sido muito mais feliz do que com todo este poder que tenho hoje. 
Porque felicidade, felicidade plena mesmo só senti durante aquele amor de verão. 
O que tenho hoje são alguns momentos felizes, a maioria deles com Christian, mas de resto tem um oco, um vazio dentro de mim que jamais foi, nem será preenchido.
Depois de resgatado, fugiu do meu controle o destino de Anastasia. 
Minha filha se tornou uma fugitiva da polícia agora e por minha causa. 
Mas talvez, ainda haja um jeito de resolver esta situação. 
Talvez.  
[...]
- Pai? O médico não disse para o senhor ficar de repouso por alguns? - Christian questionou ao me ver de pé, pronto para sair de casa. 
- Tenho muita coisa pra resolver hoje, filho. - Falei tomando rapidamente uma xícara de café preto, minha bebida preferida depois do vinho tinto - Mas antes, preciso que responda uma pergunta.  
- Qual? 
- Você ama mesmo a Anastasia?
- Com todas as minhas forças, pai. - Só de falar dela, os olhos do meu filho querido já se encheram de água - Não quero viver sem ela, não posso! - Quase desabou. 
- Preciso ir filho, não fique longe do celular, por favor. - Avisei com uma ideia audaciosa e muito perigosa em mente.  
[...]
- Missão?! Mas Comandante, nosso foco agora tem que ser prender aquela maldita Capitã primeiro! - Riley resmungou durante uma reunião em minha sala - Ela quase te matou dias atrás! 
- Da Capitã cuido eu, Riley. Enquanto isso quero você e Leah nessa missão secreta em Israel. Daqui duas horas vocês embarcarão, então avise logo sua colega para que se prepare e me mantenham a par do andamento de toda a investigação, é claro. 
- Comandante, me deixa ficar. Garanto que encontro aquela vadia em dois tempos e vingo o nome do senhor, deixa comigo! 
- Vai contestar minhas ordens agora, Riley? Se eu quero que vá a Israel apenas me obedeça, sem contestar. Anda! - Ordenei batendo com a mão na mesa e mesmo contrariado, o rapaz me obedeceu saindo da sala apressadamente. 
A última coisa que preciso agora é de Riley cuidando pessoalmente da perseguição a Anastasia.
Ele é um ótimo profissional mas truculento e agressivo demais, se encontrar minha filha antes de mim não tenho dúvidas que vai mata-la com suas próprias mãos e... Eu não quero que Anastasia morra. 
De jeito nenhum. 
Mesmo sabendo que a recíproca com certeza não é verdadeira. 
Após a saída de Riley, pedi a minha secretária, Cassie, que trouxesse Carrick até mim com a maior discrição possível. 
Dez minutos depois, meu melhor amigo já estava em minha sala. 
- Está melhor Raymond? - O General questionou sentando-se à minha frente - Deveria ter tirado alguns dias de folga depois de tudo que passou. Aliás, como está se sentindo? Te liguei ontem mas nossa conversa foi rápida demais, nem deu para você desabafar direito. 
- Péssimo, meu amigo. Mas você me conhece, sabe que não sou de tirar férias. Carrick, quero que use toda sua rede de contatos para localizar a Anastasia o mais rápido possível, antes da polícia principalmente. 
Carrick é a melhor pessoa desse país para encontrar fugitivos, ninguém pode com ele e é por isso mesmo que pedi sua ajuda agora.   
- O que pretende fazer? - O loiro questionou com a sobrancelha arqueada.
- Apenas faça o que te pedi. - Respondi misterioso. 
- Como quiser, meu amigo. Mas por favor, lembre-se que a Capitã é sua filha biológica. Não faça nada de que possa se arrepender depois. 
- Não esqueço disso nem um por um minuto, Carrick. Acredite. - Afirmei respirando fundo. 
[...]
- Encontrei. - Carrick avisou entrando na minha sala sem bater várias horas depois.
- Sério?
- Está em Nova York. Foi um pouco difícil encontra-la, mas ninguém escapa da minha lupa mágica, não é mesmo? 
- Nova York? Então é para lá que eu vou. - Levantei pondo a arma na cintura - Quer dizer, nós vamos. No caminho, diga para Christian que em breve ele será mandado para uma missão importante e por isso, deve ficar de malas prontas, okay?
- Okay. 
[...]
Pegamos um jatinho e em pouco tempo chegamos a Nova York. 
- Onde ela deve estar? - Perguntei colocando um boné e óculos escuros pretos, das mesmas cores das minhas roupas.
- Em alguma pensão barata, não vai ser muito difícil de achar. - O loiro respondeu entrando em um carro escuro seguido por mim. 
[...]
Passamos horas e horas procurando Anastasia pela cidade, mas até agora nada. Paramos um pouco para nos alimentar e depois, retomamos nossa caçada. Enquanto Carrick dirigia por NY, eu falava ao telefone com algumas pessoas a fim de resolver coisas que considerava relevantes para o que estou planejando. 
[...]
- Ei... Olha aquela garota ali. - Carrick falou apontando para uma mulher que andava apressadamente por calçada. 
Seu tipo físico lembrava muito o da Capitã. 
Quando a mulher viu nosso carro, apertou ainda mais o passo. 
- Acelera. - Mandei e ao acelerarmos, a garota saiu correndo e sua peruca caiu revelando de vez sua identidade - É ela! 
Após um breve período a perseguindo de carro, Carrick e eu descemos do mesmo e nos separamos para procurar Anastasia pelas ruas. 
Por destino ou coincidência, fui eu quem conseguiu alcança-la primeiro. 
A Capitã estava em uma rua sem saída, em cima de uma caçamba de lixo prestes a pular o muro para mais uma vez, fugir de mim.  
- Desça daí agora, Anastasia. - Ordenei apontando minha arma na direção dela. 
Lentamente, a morena virou-se para mim. 
- R... Raymond? - Indagou engolindo em seco. 
- Eu mesmo. - Avisei jogando o boné e os óculos no chão - Não faça isso, pode ser pior para você. - Avisei vendo a jovem tentar sacar a arma para se defender de mim.
Como se precisasse. 
- Me dê sua arma. 
- Droga... - Furiosa, Anastasia jogou sua arma no chão, descendo da caçamba e se aproximando de mim - É... Você venceu, Comandante.
- Não, ninguém venceu. Só perdemos, Anastasia. Só perdemos. - Guardei as armas dela no meu casaco.
- Vamos! Me prenda de uma vez. - Ela disse estendendo as mãos. 
Guardei minha arma. 
- O que está fazendo? - Ela perguntou com a sobrancelha arqueada.
- Precisamos conversar antes. - Falei pegando o celular em mãos e discando para Carrick - Encontrei a Anastasia, General. Volte para o carro, daqui a pouco vamos ao seu encontro. - Desliguei. 
- Daqui a pouco? - Anastasia me olhou desconfiada - O que vai fazer comigo até lá? 
- Sente-se. - Falei sentando-me na guia da rua mesmo. 
- Não estou entendendo. - Ela sentou-se ao meu lado. 
- Você sabe que se for levada à justiça passará o resto da vida na cadeia, não sabe?
- Claro, e é por isso que estava tentando fugir, mas devia imaginar que o chefe dos Sentinelas com todo o poder que possui, me encontraria em algum momento. - Suspirou frustrada. 
- Exatamente. - Concordei. 
- O que está esperando para me prender Raymond? Estou aqui, você pode fazer o que quiser comigo agora. Me prender, até me matar se quiser. E ao invés de resolver as coisas de uma vez por todas, você fica com essa conversinha sem pé nem cabeça? Que jogo é este que está jogando agora, Comandante?  
- O jogo da justiça, Capitã. Melhor dizendo, ex-Capitã. - Corrigi - Não quero que você vá pra cadeia, muito menos que tenha uma condenação que a faça perder toda a sua juventude atrás das grades.  
- Vai me matar então? - Ela perguntou engolindo em seco.  
- Anastasia. - A olhei nos olhos - Apesar de tudo, eu te amo. Você é minha filha e sempre vai ser. Tudo que mais quero nesta vida é o seu perdão, mas sei que não o terei. Não posso mudar o passado, não posso voltar atrás e consertar todos os meus erros, mas posso mudar o futuro e fazer com que minha filha e o meu filho sejam felizes juntos. Não como nesses contos de fadas, mas da forma que dá se você concordar. 
- Você sabe sobre mim e Christian? 
- Sim, ele me contou tudo sobre o romance de vocês outro dia. Inclusive, que é o pai do filho que você perdeu naquela explosão.  
- Ta, mas o que realmente está querendo dizer?
- Que estou aqui para te ajudar a fugir pra bem longe, Anastasia. Sumir neste mundo  com meu filho.   
- Espera... Você?
- Isso mesmo, filha. Se você quiser, faço você fugir pra longe com meu filho, que eu sei que te ama mais do que tudo nesta vida. 
Sempre fui covarde mas desta vez, não. 
Desta vez, serei corajoso e farei o que tiver ao meu alcance para que minha filha seja feliz, como deveria ter feito desde o começo.  
- E então? Aceitará minha ajuda ou não, Anastasia? 

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Olá!

Hoje inicia a maratona e espero de coração que curtam porque fazer maratona dá um trabalho danado hein kkk

E aí? O que acham que a Ana vai dizer?

Votem, comentem e a quem puder divulguem o link da história para mim para que outras pessoas também possam conhecer esta história ❤ Amo vocês!

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