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Quatro anos depois

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Quatro anos depois

Mais um domingo e eu estou no supermercado comprando ingredientes pro jantar, pensando no que eu prepararia para Rodrigo naquela noite. Como médico brilhante e reconhecido que ele era, muitas vezes os seus fins de semana eram preenchidos pelo trabalho no hospital, mas mesmo assim os domingos à noite eram sempre nossos. Há quatro anos, quando ele quis me dar uma cantada besta e eu até cheguei a achar que ele estivesse me perseguindo, não podia imaginar que ele se tornaria um amigo, uma pessoa completamente especial e importante na minha vida, com quem eu podia contar em qualquer momento, a qualquer hora. Morando sozinhos em nossos apartamentos, éramos como a família um do outro. A relação que construímos ao longo desses anos era realmente muito forte. Tão forte, que às vezes parecíamos até adivinhar quando um estava pensando no outro, como agora.

- Oi Rod! Tô no supermercado! Algum pedido especial pro jantar? – pergunto assim que atendo a sua ligação.

- Oi Moreira, liguei justamente por isso. Não vou poder sair, vou precisar cobrir o plantão de outro médico aqui. Devo voltar pra casa só pela manhã. – ele diz e eu lamento internamente. Às vezes os imprevistos aconteciam e nossos planos acabavam sendo interrompidos, como agora. Mas nunca deixava de ser chato. – Eu sei que é chato... – e lá estava ele adivinhando os meus pensamentos, como sempre. – Mas podemos deixar pra amanhã se você não estiver muito ocupada com os seus projetos. – ele sugere.

- Sem problemas, eu te entendo. – eu realmente entendia e admirava todo o amor e devoção que ele tinha por sua profissão. – Depois combinamos melhor.

- Então te vejo amanhã, tudo bem? Boa noite, e me desculpa mais uma vez.

Depois que nos despedimos, termino de fazer minhas compras e vou até o caixa pagar por elas. Caminho com as poucas sacolas até meu carro no estacionamento e as coloco na mala. Estava entrando no carro quando ouço um choro forte. Olho para os lados, procurando o lugar de onde vinha o som. Caminho até uma lixeira, onde parecia ser a origem do barulho e tomo um susto quando vejo um bebê dentro dela.

- Meu Deus, quem fez isso com você? – pego o bebê em meus braços, sujo e sem roupas, coberto apenas por uma manta. Levanto um pouco e então constato que é uma menina. Uma linda menininha. Pequena, frágil, claramente recém-nascida. O que levava uma mãe a abandonar uma criaturinha linda como essa? Era claro que ela tinha sido colocada ali porque queriam livrar-se dela. Quem jogaria uma bebezinha numa lata de lixo se não fosse com esse propósito?

Olho ao redor, vendo o estacionamento vazio. Fosse quem fosse que a tinha deixado ali, essa pessoa já estaria longe. E a bebê já estava no meio de todo aquele lixo sabe-se Deus há quantos minutos. Chegava a ser desumano. Não consigo ser indiferente, eu tinha que fazer algo por esse pequeno ser. Com meu coração acelerado pela situação e com meu corpo trêmulo, volto ao supermercado em busca de ajuda, afinal eu não tinha como ir até o hospital dirigindo sozinha e com um bebê nos braços. Quando relato o problema e peço ajuda, uma senhora que já terminava de passar suas compras se oferece para ir até o hospital comigo. A menininha necessitava de cuidados.

Assim que chegamos ao hospital em que Rodrigo trabalhava, peço que o chamem com urgência. Rodrigo é pediatra e eu confiava plenamente nele. Não foi preciso que esperássemos muito. Em pouco minutos Rodrigo vem correndo em minha direção.

- O que houve com você, Agatha? – ele pergunta enquanto me analisa de forma preocupada e eu sabia que ele estava pensando que havia acontecido algo comigo. Me repreendo internamente por não avisar a moça que foi procurá-lo que se tratava de uma emergência com um bebê.

- Calma, não foi nada comigo. Mas eu preciso da sua ajuda. – respondo, me virando para a senhora que tinha vindo comigo e que mantinha a pequena em seus braços. – Eu encontrei um bebê numa lata de lixo no estacionamento do supermercado. Ela parece precisar de cuidados e não consegui deixá-la ali. Você foi a primeira pessoa em que eu pensei para me ajudar.

Rodrigo aproxima-se da mulher, pegando a bebê em seus braços com cuidado e habilidade. Ele a examina rapidamente e logo sai com ela para tomar os procedimentos necessários, prometendo voltar assim que pudesse com maiores informações sobre a menininha.

A espera é angustiante. Eu só consigo pensar nos motivos que alguém teria para abandonar aquela bebê. Será que a mãe não tinha condições de criá-la? Será que nunca a quis e assim que nasceu ela resolveu que o melhor era se livrar dela? Eu realmente não encontrava respostas. Eu só esperava que Rodrigo pudesse voltar com boas notícias. Aquela pobre criança já tinha começado a vida de forma tão cruel! Não merecia que algo pior ainda lhe acontecesse. Quando eu estava completamente perdida em pensamentos, Rodrigo retorna, aproximando-se de mim e da senhora que me acompanhava, cujo nome agora eu sabia. Ângela.

- E então Rod?

- A pequena está na UTI Neonatal. Ela chegou com hipotermia e com baixo peso. Conseguimos estabilizá-la, mas será preciso que ela fique lá mais um tempo recebendo os cuidados necessários até a alta.

- Mas ela corre riscos? – pergunto, preocupada.

- No momento ela está estável. E continuaremos trabalhando para que ela permaneça assim.

- Graças a Deus! Obrigada, Rod! – eu digo enquanto o abraço, alívio percorrendo todo meu corpo. Não gosto de pensar na ideia de que pudesse ter sido tarde demais se eu não a tivesse encontrado, se ela ainda estivesse naquele lixo, sujeita ao frio e a qualquer tipo de perigo.

- O que acha de irmos até a lanchonete do hospital pra que você me conte melhor sobre tudo o que aconteceu? – ele sugere.

- Não está ocupado?

- Se precisarem de mim, irão me chamar. Não se preocupe. – ele diz, segurando uma das minhas mãos. – E então, vamos?

Nos despedimos de Ângela, que precisava ir embora. Lhe agradeço pela ajuda e por ter ficado comigo esperando Rodrigo e só então saio junto com ele para a lanchonete.

O Elo Entre Nós DoisOnde histórias criam vida. Descubra agora