GLORX

Capítulo 5

A pele escura de Luka reflete a luz alaranjada do fogo, formando sombras nos vincos ressaltados de seu rosto. Mina retira de sua bolsa um objeto pequeno e uma faca.

— Esse é seu presente. Seu hologrx.

A menina se aproxima cautelosamente. Mina estende a mão esquerda enquanto Luka pousa sua mão direita sobre a palma de Mina.

— Isso dói. Serei rápida. — a expressão de Mina reafirma o alerta.

Gira o braço da menina, expondo a parte de cima do antebraço fino da criança e, na junção do punho, faz uma pequena incisão. Insere metade do dispositivo no local, deixando apenas o pequeno visor exposto.

— Espera um pouco. — Mina se abaixa novamente para a bolsa e pega um estojo — Vamos dar uns pontos aí para segurar o dispositivo.

Após costurar a pele no entorno do corte, o dispositivo se prende. Mina observa a expressão angustiada de Luka. A dor é confirmada pelos lábios contorcidos e os olhos cheios d'água da menina. Luka percebe algo por baixo de sua carne, um repuxo lancinante, que ela sente ser o dispositivo se conectando a seus nervos e músculos. A dor paralisa seu braço e involuntariamente ela solta um gemido, um grito contido.

— Olhe para mim. — a voz de Mina é imperativa. — Olhe para mim Luka.

A menina olha, sem conseguir conter uma única e solitária lágrima que escorre pela sua bochecha, mas ela segura o choro e olha séria para a mentora. As áureas de Mina estão acesas em azul mais forte que o usual quando, Luka sente uma claridade esverdeada brotar em seu campo de visão.

— Pronto! Está feito!

Mina pega um pequeno espelho de maquiagem na bolsa e vira para Luka. A menina observa admirada que sua áurea está verde. Um verde desbotado, mas ainda assim, verde. Mina abre um sorriso inesperado, claro e, pela primeira vez, autêntico. Luka sorri de volta, contagiada pelo inesperado sucesso da experiência, que é complementada pela excentricidade da caverna onde se encontra.

— Agora você é, oficialmente, uma Utópica. — Mina proclama solenemente enquanto Luka chora, agora emocionada.

— Vamos voltar para Refúgio, mas antes, há mais uma coisa que você precisa ver.

Luka está atônita. Quantas surpresas este dia ainda lhe ofereceria? Mina segura sua mão e conduz a criança em direção à parede flamejante da caverna. À medida que se aproximam, a luminosidade aumenta, tornando difícil manter os olhos na claridade que as chamas impõem.

A imagem é tão real e, ao mesmo tempo, tão estranha... A parede está ali... é possível ver que é uma parede de pedra, mas o fogo é perfeitamente visível por trás da mesma. Não se sente nenhum calor, embora as chamas sejam enormes e vivas. Com a proximidade, Luka consegue ver que, por trás das chamas, existe um espaço, como outro grande salão, um enorme anel escavado na rocha em torno de todo o templo onde se encontra agora e, nesta galeria ela vê muitos vultos, todos imóveis.

— O que é aquilo? São pessoas? — Luka pergunta, intrigada.

— Sim... pessoas. Eram pessoas, agora são apenas múmias. Estão todos mortos.

A visão de Luka, agora ajustada à luminosidade, consegue perceber que são corpos inertes, farrapos humanos, secos e emurchecidos. Ainda estão com roupas prateadas, igualmente esfarrapadas. De pé, observam com suas órbitas vazias, preenchidas somente com áureas coloridas o decorrer dos séculos, sem se importar, sem sentir.

— Quem são eles? — Luka volta curiosa.

— Nossos antepassados. Pelo menos é o que dizem. Somente nós, os rebeldes, sabemos da existência deles, assim como, deste salão. Aqui é nosso templo e nossa fundação. Somente aqui é possível implantar um hologrx sem que sejamos reveladas.