Capítulo 5 - Conhecendo o conselheiro

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Tony insistiu para que Guga fosse até a sua moradia para aguardar a chegada do conselheiro. O menino, por sua vez, mesmo desconfiado, resolveu aceitar com a premissa de que se tudo desse errado, ele retiraria o chapéu e escaparia facilmente do homem estranho que conhecera.

— Venha pirralho, eu moro perto daqui. Lá te contarei tudo o que você precisa saber — falou Tony, fazendo sinais com a mão para que ele o seguisse. — Tenha cuidado com as pessoas daqui. Nem todo mundo é confiável. Tive sorte de te encontrar tão rápido.

— Como você sabia que eu estaria lá? — Perguntou Guga, curioso, enquanto se desviava de algumas vegetações estranhas que decoravam as paredes peculiares do apertado beco.

— O conselheiro me ajudou a sentir a presença do chapéu. Só precisei vir até aqui e seguir os meus instintos — respondeu Tony, precisando ficar de lado para passar pelo beco que se estreitava à medida que andavam.

Fez sinal para que o garoto esperasse e tentou passar pela saída do local estreito, ficando entalado. Era um homem de grande estatura e tinha certa dificuldade de passar por tal lugar tão apertado.

— Quer uma ajuda? — Perguntou Guga.

— Seria muito grato, pirralho — respondeu Tony, espremendo-se nas paredes.

Logo, o garoto tomou impulso e o empurrou, desentalando-o na mesma hora. Gustavo imediatamente deu de cara com um enorme rio de águas cor de vinho, contemplando mais uma vez o grandioso sol do entardecer de Monte Cinza. Mesmo sendo um mundo de cores mórbidas, sem dúvidas a pouca vivacidade que tal lugar tinha se decorria do astro a brilhar tímido nos céus.

Antony olhou para os lados, checando se alguém os observava naquele instante. Logo, à beira do rio, uniu os polegares de ambas as mãos, enroscando-os um no outro, e uma estranha embarcação emergiu das profundezas do rio de cor de sangue. Parecia ser um submarino de estrutura metálica robusta, cheio de algas vermelhas por toda sua superfície, escondendo a sua cor azul-marinho. Uma enorme porta de aço maciço veio ao chão, convidando-os a entrar. Tony logo pôs-se a seguir para dentro seguido por Guga, boquiaberto com tal cena. Ao entrarem, a embarcação logo imergiu.

Lá dentro, o garoto observava com muita curiosidade o lar de Tony. Era um ambiente não muito grande, porém, confortável. Ficou ali de pé no que parecia ser a sala de estar.

— Fique aqui, vou preparar algo na cozinha pra você e o conselheiro beberem e comerem — falou Antony retirando o seu casaco marrom, o colocando em cima de um suporte próximo ao que parecia ser uma televisão.

Inquieto e curioso como sempre costumava ser, Guga começou a andar pelo ambiente. Passou a mão pelo tecido de uma das três poltronas que estava próxima a uma lareira de chamas azuis e logo notou a peculiaridade do forro que a cobria, tendo a impressão de que a sua mão seria engolida a qualquer instante, sendo puxada por aquele móvel que parecia ter vida própria. Assustado, deu um pulinho para trás, afastando-se dela. Mesmo com medo, continuou a investigar o local, observando que no teto havia um belíssimo lustre prateado com luzes amarelas flutuantes presas dentro de vidros que rodopiavam sem parar, trazendo luz para o ambiente. Enquanto observava ainda de pé a chama azul da lareira, aproximando-se dela, sentiu além do seu calor que algo farejava o seu pé. De um berro só, Guga se jogou para trás caindo no chão. Era um pequeno e gracioso jacaré de pele verde escura, que pareceu tão curioso quanto o garoto o olhando.

— Pirralho, aconteceu algo? — Perguntou Antony preocupado, indo rapidamente para a sala.

— Tá... Tá tu.. tá tudo bem! — Respondeu Guga sem piscar ainda no chão e olhando para o jacarézinho.

— Esse é o Lilo, não te apresentei a ele ainda. Diga oi ao nosso convidado! — Falou Tony achando hilária a reação de Guga ao seu pet. — Não se preocupe, ele tem medo até mesmo da própria sombra.

Ao se levantar, Guga acabou assustando o pequeno réptil, que logo se escondeu na cozinha de Tony.

— Viu só? Sempre medroso. — Falou Tony, caçoando de Lilo.

Pouco depois, um zunido agudo veio da direção da porta de ferro por onde os dois entraram.

— Ora, ouviu isso? Acho que o conselheiro chegou — falou Tony abrindo um grande sorriso, entusiasmado.

Novamente, Antony fez o mesmo movimento com os polegares e o portão de aço veio mais uma vez ao chão após o submarino emergir, deixando Guga meio zonzo com o impulso ao sair debaixo da água, precisando se sustentar nas paredes para não cair.

— Conselheiro Aron, seja bem-vindo meu velho amigo! — Falou Tony com muita felicidade para o conselheiro.

— Tony, quanto tempo! - respondeu o conselheiro de voz rouca, dando um abraço caloroso em seu amigo. — Olá Gustavo!

Guga observava espantado o quão curioso era o conselheiro e impressionou-se também com o fato dele já saber o seu nome. Era um homem de vestes maltrapilhas, alto, negro e que, apesar da barba branca, aparentava ser ainda um homem de meia vida, o que deixou o garoto confuso quanto a idade que aquele misterioso homem poderia ter.

Após Aron entrar e acomodar-se na poltrona, Tony ofereceu torradas e café para o garoto e para o seu velho amigo. 

— Guga, ainda está de pé? Sente-se, deve estar cansado — Falou Antony à Guga.

— Eu... Eu tou bem de pé senhor — disse Guga, olhando assustado a poltrona.

— Acho que ele não tá muito acostumado com as coisas daqui ainda, Antony. Acredito que esta poltrona seja bem diferente das de onde você veio, não é? — Perguntou Aron, olhando nos olhos Guga.

Gustavo meneou a cabeça tímido, confirmando o que o conselheiro havia lhe perguntado.

— Verdade Aron, tanto tempo aqui depois que morri que me esqueço de como era quando eu estava vivo — comentou Tony, passando a mão na sua cabeça, sorrindo e envergonhado de ter se esquecido de tal fato.

Na hora que ouviu isso, Gustavo não aguentou ficar de pé e sentou-se na poltrona na mesma hora chocado com o que ouvira de boca aberta. Nem sequer lembrou-se de que a mesma tentara sugar a sua mão alguns minutos atrás. Seu corpo agora sentia um misto de relaxamento com a cadeira macia a massageá-lo, o envolvendo, e desespero, por supostamente estar entre os mortos.

O chapéu de Antony CobrichOnde histórias criam vida. Descubra agora