Vazio

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CAPÍTULO 6

Estava escuro, ou talvez era apenas o nada... Sim, não era escuridão que me cercava, e sim o completo vazio.

Eu não estava morta, mas, ao mesmo tempo não estava viva. Não possuía mais um corpo, ou ao menos, não tinha um que poderia chamar apenas de meu. A muito tempo a minha alma deixara de ser individual, corrompendo-se com aquilo que eu mais temia e repudiava.

Minhas pálpebras abriam e as pupilas novamente se acostumavam com a escuridão ao meu redor, o sensação da falta de calor não se demorou para mergulhar-se em meu corpo, e o duro chão rochosa do qual eu estava deitada de costas não podia ser chamado de auxílio em um momento como esse. O som das goteiras rebatendo nas paredes formando um eco com a mais simples vibração no ar, era algo ao qual eu já estava familiarizada por estar a tanto tempo dormindo em lugares ocos e sem vida.

Na entrada da caverna, a pálida luz adentrava para iluminar a fina camâda pele morta empoeira em meu corpo. Nada mais do que o som fraco das batidas cardíacas do meu coração era escutado por mim, o vento era bloqueado pela enorme passagem de montanhas que eu havia cruzado para chegar onde estou.

Levantando-me, batia a poeira para longe do meu corpo coberto pela carapaça do Vazio que me acompanhou desde criança, e olhava ao longe para até onde a magnitude da antiga e falecida Icathia poderia mostrar-me.

O que eu procurava agora, era algo ao qual eu buscava já temendo o imprevisível. Icathia por mais isolada do restante do mundo que estivesse devido ao seu cataclisma gerado a milênios passados, não parecia tão morta quanto as histórias retratavam.

A muitos anos eu deixara de ser exclusivamente humana, e a minha conexão com o Vazio ficava cada dia mais intensa. A ligação que meus intintos conseguiam sentir exalando das entranhas dessas terras, era tanto humanamente aterrorizante quanto aconchegantemente vazio. Essa sensação era tão confusa quanto possa parecer ao expressa-la.

Uma única vez tive o deslumbre de topar surpreendentemente com um grupo de saqueadores ousados que pelo visto não sabiam ao certo com o que se metiam ao tentar me atacar, ou por andar neste lugar. Após te-los subjugado facilmente em um embate que durou alguns segundos, percebi que eles estavam sim com medo de mim, porém, a fome que eles sentiam conseguia sobrepujar qualquer raciocínio lógico que fossem capazes de ter.

Tristemente, era algo comum. E mesmo que para minha pessoa aqueles sujeitos fossem insignificantes, eu decidi carregar comigo seus devidos nomes quando os confrontei em um diálogo.

Eram três deles ao todo. Portavam roupas rasgadas e fedendo a podridão por não terem encontrado água a dias para beber ou se lavar, todos depois de terem visto que não teriam chances de me abater, tentaram correr pelas suas vidas. Entretanto, eu fui ágil o suficiente ter conseguido prende-los na própria armadilha que armaram para me pegar.

— Nos mate logo e pare de perder seu tempo, filha do Vazio. — Um deles pestanejou. As forças de todos não estavam mais presentes, ao passo que paravam de se debater com as cordas enroladas em seus torsos e braços, pareciam desistir enfim de qualquer ideia a escapatória.

Com uma sentença tão direta como a que me foi dita, o máximo que eu podia era serrar os dentes em desgosto e desaprovação da afirmação equivocada dele.

— Eu sou humana, não pertenço ao Vazio. — O respondia.

— Pode tentar mentir para si mesma o quanto quiser, não passas de um monstro. — O repúdio era evidente na vibrante entonação de suas palavras, imagino o que homens como eles devem ter passado para chegar nesse estado.

— Porque vocês querem tanto morrer? Não pensaram em se abrigar em Ixtal, ou nas cidades costeiras do norte?

Nenhum deles a princípio se sentiu confortável o suficiente em responder a questão jogada em suas costas. Até que um deles, o aparentemente mais velho colocou seu rosto para cima, mesmo sendo difícil distinguir a idade entre eles já que o estado de todos era deplorável demais.

Discordes ÁridosOnde histórias criam vida. Descubra agora