03 - A primeira vez que senti falta do meu pai.

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Fiquei horas, sentado em uma pedra olhando a cachoeira, se eu não estivesse tão para baixo eu teria dado um mergulho. Mas eu não sei o que fazer com essa tristeza, não sou esse tipo de pessoa, que fica triste ou angustiado, muito menos triste e angustiado ao mesmo tempo. Eu costumo ficar triste sim, mas por causa da dor dos outros, mas pela minha própria dor, não, isso é novo para mim.

Não tenho essas crises que meus amigos costumam ter com os pais, querer fazer coisas que vão contra a nossa fé, ou ter confusões amorosas, para mim, ser cristão até então sempre foi natural 'e oro a Deus', para que continue sendo assim, e a Bia foi a única garota que eu gostei até agora.

Então aquela confusão de sentimentos, raiva, medo, e sei lá mais o quê, que vez ou outra acomete a galera da nossa igreja, esta coisa de rebeldia adolescente, que eu imagino que seja mais ou menos o que eu estou sentindo agora, 'mas também não tem como eu ter certeza', é novidade para mim, e eu não estou gostando nada disso não estou gostando dos sentimentos ou dos pensamentos que estão me atormentando neste momento.

Eu gostaria de ter alguém com QUEM compartilhar esse sentimento; eu sei que posso compartilhar com Deus, aliás, só Ele para aliviar essa dor que está me esmagando. Mas o que eu queria mesmo era ser como qualquer garoto da minha idade, queria chegar em casa e falar sobre isso com o meu pai. Nunca senti falta dele, nunca o desejei na minha vida, mas hoje eu queria saber dele, queria poder ligar para ele, e chorar minhas pitangas.

A situação com o meu pai, é no mínimo inusitada. Eu não faço ideia de quem seja ele, nem o nome da pessoa eu sei. Na minha certidão de nascimento está pai desconhecido, e essa realidade não é tão verdadeira na vida de nenhuma outra criança como é na minha.

Quando eu era mais novo, eu perguntava muito por ele, acho que toda criança pergunta pelo pai, mas como fui percebendo que minha mãe não me daria informações sobre ele, fui deixando o assunto para lá, e simplesmente meu pai deixou de povoar meus pensamentos, até agora.

Depois de um longo tempo com pena de mim mesmo, resolvi voltar para o dormitório.

- "Oh, meu Deus me perdoe por não cumprir com o compromisso para o qual o Senhor me trouxe até aqui. E me ajude a ficar bem, e que a noite eu esteja pronto, para ouvir a Tua Palavra e compreender o que o Senhor quer de mim, que o Senhor fale ao meu coração, e me ajude a aceitar que meus amigos estão juntos, se essa for a Sua vontade. Eu te amo Senhor, e sempre aceitei a Sua vontade na minha vida, e que continue a ser assim. Por favor! Senhor ponha juízo na cabeça do Ricardo, e não permita que ele magoe a Bia, e que ela também não venha a magoa-lo. Em nome de Jesus, amém". - Fiz uma oração rápida, enquanto caminhava de volta para o dormitório.

Cheguei lá e deitei. Fechei os olhos e fiquei imaginando o que minha a mãe faria se eu dissesse que queria conhecer o meu pai, ela me negava isso quando eu era criança, e eu não poderia ir a lugar nenhum sem ela, e se as mágoas que ela tinha dele fossem maiores do que eu imaginava e por isso ela não me deixava conhecê-lo? Mas talvez agora ela compreenda que eu posso conhecê-lo sem a presença dela, e ela se sinta mais tranquila; ou simplesmente ela pense que eu sou um traidor por querer conhecer um homem, que nunca se preocupou comigo, nunca quis saber nada sobre mim, só Deus para saber disso, o que se passa pela cabeça de um pai que nunca quis conhecer o filho. E só Deus também pra entender porque raios esse filho quer tanto conhecê-lo, depois de tanto tempo. Mas fazer o quê? Eu estou curioso, e gostaria que ele próprio me dissesse qual o problema dele comigo.

Na segunda-feira eu e minha mãe iremos encontrar minha tia Drica e a família dela em Minas Gerais, eu poderia perguntar para ela, mas sei que não vai dar em nada. Eu já fiz isso antes, com todos os membros da família da minha mãe, e eles são categóricos, sempre a mesma conversa.

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