Capítulo 7

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Eduarda Ramos

Estava dormindo profundamente e sonhando que estava dentro de um filme de ação. O meu sonho, desconfio, foi por causa do meu dia de ontem. Então, enquanto eu chutava a bunda de alguns bandidos, acordei assustada com Daniel me sacudindo e falando: 

— Acordaaaa, dorminhoca, que nós já estamos super atrasados. 

Levantei e vi que já eram sete e quarenta. Caramba, esqueci de colocar o celular para despertar!, percebi.  Corri para o banheiro e me arrumei o mais rápido que consegui. Depois que saí, meu amigo me forçou a comer alguma coisa, então enfiei umas torradas para dentro da boca. Depois, escovei os dentes, passei um rímel, um batom e pronto. A maquiagem ia derreter ao longo do dia, então não quis me dar ao trabalho de fazer alguma decente. 

Saímos de casa mais atrasados do que o normal mas, por incrível que pareça, Dani não se estressou dessa vez. Chegamos na empresa e ele foi para o seu andar e eu para o meu. Depois de já ter me trocado e posto a roupa de ginástica, me encontrei com Leandro, o meu instrutor.  

— A senhorita está atrasada, Eduarda — foi a primeira coisa que disse ao me ver. 

— Eu sei, me desculpe. Foi difícil acordar essa manhã, acho que cansei demais no treinamento de ontem — me justifiquei. 

— Não quero saber o motivo. Nós não toleramos atrasos aqui. Já pensou se a senhorita já estivesse trabalhando para o senhor Saurin e ele lhe chamasse para uma emergência e você se atrasasse? Quando chegasse, ele já teria sido sequestrado e você teria falhado. Atrasos como o seu podem custar a vida de outras pessoas. Espero que não se repita. 

— Não vai — garanti, de consciência pesada. 

Leandro sabia como fazer qualquer um se sentir mal. Mas, claro que eu não me abalei por muito tempo, pois depois acabei me distraindo com tudo o que tive que fazer. Após todos nós nos alongarmos, meu instrutor me fez lutar novamente com os "seu homens", como ele adora ressaltar. No entanto, não nos prendemos a isso por muito tempo, porque ele decidiu que hoje iria me ensinar a atirar. Confesso, era a parte para a qual eu estava mais ansiosa. Sempre quis aprender.  

Sendo assim, fomos para um outro espaço, ainda no andar do subsolo. Era uma sala fechada, e, para a minha surpresa, era tudo virtual. Como se fosse um videogame só que muito mais elaborado. Fiquei um pouco confusa, pois havia pensado que usaríamos armas e alvos reais, afinal, vou realmente usar isso, não? Então, resolvi perguntar ao meu instrutor, apesar de ele se estressar toda vez que pergunto alguma coisa que ele considera estúpida. 

— Leandro, pensei que fôssemos fazer um treinamento real e não simulação — falei. 

— E eu pensei que você nunca tivesse pegado numa arma em sua vida — debochou.

— Nunca peguei mesmo — respondi. 

— Pois então. Não queremos todos morrer, portanto, vamos começar por aqui e ver como você se sai. 

— Mas isso aí simula alguma coisa mesmo? — perguntei. 

— Senhorita, esse é um simulador de alta tecnologia criado pela nossa empresa. Somos especializados nisso. É lógico que funciona. E, além disso, usamos armas reais. 

— Armas reais na simulação virtual? Mas, como? — perguntei, confusa. 

— Trocamos as balas por ambulas de gás carbônico. Quando se aperta o gatilho, elas liberam um laser que é captado pelos simuladores. E o melhor de tudo é que é extremamente real, só  o recuo da arma não continua o mesmo. Com as ambulas o recuo é um pouco menor. Depois que eu tiver visto como você se sai aqui e ter lhe ensinado o básico, passaremos para uma simulação não virtual.  

— Ah, tudo bem então. 

Peguei a arma que ele me deu e tentei imitar a posição que ele fez. Não satisfeito com o que eu tinha feito, ele mesmo posicionou minha mão e braços do jeito certo, enquanto explicava: 

— Seus pés devem estar abertos na largura dos ombros, com o pé oposto à mão dominante um passo a frente do outro pé. Fique com o corpo reto, mas levemente curvado para frente, mantendo o equilíbrio. O cotovelo de seu braço dominante deve estar quase completamente reto. Já o cotovelo do braço não-dominante deve estar levemente flexionado. 

E, conforme ele ia explicando, eu fui fazendo. Confesso que nunca pensei que fosse tão difícil se posicionar para atirar. Quando falei isso para Leandro, ele tranquilizou-me dizendo que logo eu estaria fazendo automaticamente. 

— É só uma questão de costume —  disse. 

Depois de dar o primeiro tiro, voltei com um recuo pelo qual eu não esperava. Foi maior do que havia imaginado, mas não me machuquei. Também descobri que não tinha uma mira tão ruim assim. Pelo menos o tiro atingiu dentro de uma área aceitável, apesar de não ter sido nem de perto o alvo. Meu instrutor parecia impressionado. Comentou que, para uma primeira vez, eu havia me saído bem. Quando fui preparar o revólver para um segundo tiro, apontei-a para o lado, o que fez Leandro quase me estrangular.  

— Jamais — disse ele — aponte a arma para qualquer lugar que não seja o chão ou para o alvo. É assim que acidentes acontecem e matam pessoas inocentes. Inclusive um amigo ou um parente.  

Desse modo, fui aprendendo todas as regras do que devia e não devia fazer na hora de usar uma arma para atirar. Fui pegando o jeito aos poucos. Quando meu instrutor se deu por satisfeito na simulação virtual, passamos para uma outra sala fechada, totalmente a prova de som. Coloquei um óculos de proteção, e um protetor de som no ouvido também. Ganhei outro revólver dessa vez, pois seria uma simulação real e o recuo de cada arma com a bala e com a ambula de gás carbônico eram diferentes. 

Os tiros que eu estava dando com o revólver estavam, com o treinamento, indo mais perto do alvo. O segredo, pelo que entendi, está no equilíbrio e na tranquilidade, usados hora certa. De equilíbrio eu entendia, afinal, a luta também era baseada nele. Deve ser por isso que não foi tão difícil para mim aprender a me posicionar e atirar. 

Leandro explicou-me que cada arma é diferente e me ensinou a manusear as mais importantes. Também me alertou que, antes de usar qualquer tipo delas, precisava saber qual é o recuo de cada uma, pois assim evitaria me machucar e poderia calcular o alvo com mais precisão.  

E assim aquela semana se passou. Fiz grandes progressos. Precisei ir ao cartório naquela mesma semana para conseguir uma licença de porte de arma. A burocracia brasileira me irritou, mas eu sabia que não havia nada que pudesse ser feito quanto a isso. Após muitas filas, muita espera, muitas assinaturas e muito estresse, consegui a licença da qual precisava tanto para o porte quanto para o uso de qualquer arma.  

Os progressos foram tão grandes, tanto na luta e auto defesa quanto no tiro ao alvo, que eu já estava me sentindo a própria agente. O que eu certamente seria. Naquela semana, além dos treinamentos, conheci os homens dos quais eu seria a "chefe" e administraria. Essa, eu estava certa, seria a parte mais fácil para mim. Como minha mãe sempre me disse, sou uma estrategista nata.  

Todos os homens eram grandes, fortes e bem treinados. Além disso, pareciam muito disciplinados. Achei engraçado pensar que, em pouco tempo, eles seguiriam ordens minhas; uma mulher que é três vezes menor do que eles e que é uma iniciante no negócio. Espero que eles não fiquem muito chateados com isso, pensei. Isso poderia me trazer problemas muito desnecessários.  

Apesar de ter me simpatizado com todos eles, com quem o meu santo mais bateu foi Rodrigo. Ele parecia jovem, e disse que é um ex-servidor do exército. Tratou-me logo de cara com muito respeito. Ele me lembrou muito de Lucas, o irmão de Daniel, no jeito. Pelas coisas que contou-me, também gostava de servir aos outros e protegê-los. Foi assim que ele foi parar no ramo de segurança, explicou-me. Depois que saiu do exército — porque o exército brasileiro não é exatamente ativo, ao menos não sempre — quis atuar em algo que fizesse diferença na vida das pessoas. Ele realmente levava a sério a sua profissão, e já o admirei logo de cara só por isso.

Vida dupla: uma identidade secretaOnde histórias criam vida. Descubra agora