» Capítulo 06

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ɴᴏᴀʜ ᴜʀʀᴇᴀ

–Onde você estava?

– Dando uma volta.

– Ah!

Minha mãe abaixa a cabeça e olha para os sapatos. Deve conhecê-los de cor, de tanto que os usa de um mês para cá.

– O que você ficou fazendo? – ela prossegue.

– Dormi.

– Sério?

– Seríssimo.

Não menti, mas sei que o interrogatório ainda vai avançar um pouco. Melhor eu pesar cada palavra para não ter de revelar toda a verdade.

– Você conseguiu achar lugar para dormir? – Ela se admira.

– Achei. Um lugar bem calmo.

Eu continuava sem mentir. Até acrescentei uma informação, esperando que ela parasse ali, e foi realmente o que aconteceu.

Minha mãe adora fazer perguntas, mas também se dá muito facilmente por satisfeita. Não sei se isso vem da resignação que sente em relação a meu irmão. Também não sei exatamente do que ela realmente se ressente, além da tristeza que transpira em cada um de seus gestos e olhares.

Eu me sinto indigno. Minha mãe está completamente arrasada ali ao meu lado, e não faço nada além de dormir na casa dela três vezes por semana. Ela também não faz nada por mim, mas seria muito egoísmo de minha parte pedir-lhe que se ocupasse de mim em um momento como este.

É minha vez, então.

– E você, como está?

Minha pergunta a pega de surpresa, tanto que ela para de andar mesmo faltando não mais que quatro metros para chegar ao carro.

– Por que você está me perguntando isso?

– Já passou da hora de perguntar, né? Então, como você se sente?

– Mal.

– Isso eu já sei. Agora elabore, mamãe.

Ela me olha como se quisesse descobrir o truque de um comercial. Como quando eu tinha oito anos e ela vasculhava o malfeito em minha carinha angelical.

– Seu irmão é um assassino pós-balada, mas não deixa de ser meu filho.

Isso é um balde de água fria em cima de mim. O tom de minha mãe é o mais neutro possível.

Durante todo esse tempo, achei que estivesse fragilizada e que não soubesse o que fazer com suas emoções. Eu estava, infelizmente, muito enganado! Minha mãe é a pessoa mais forte que conheço; ela só chora um pouco facilmente demais.

– Como é que você consegue conciliar os dois? – pergunto a ela.

– Pelo amor que tenho por ele, que é exatamente o mesmo que sinto por você.

– Esse amor é suficiente para perdoar-lhe?

– Não sou eu quem tem de perdoar seja lá o que ou quem for...

Conheço essa conversa de cor porque já a ouvi um zilhão de vezes.

– Porque não cabe a você julgar – completo.

Ela confirma com a cabeça.

– Nem você nem eu podemos julgar. Seu irmão já tem muito que julgar a si mesmo. E embora eu tenha passado a infância de vocês dois dizendo para não se julgarem, agora tenho de reconhecer que é bom ele ter muito tempo para refletir sobre isso. Estou o máximo presente para o caso de ele precisar de mim. Só lamento não ter sido suficientemente rigorosa em minha educação para fazê-lo entender que não poderia ter pegado o volante mês passado.

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