»Capítulo 10

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ɴᴏᴀʜ ᴜʀʀᴇᴀ

Pisco os olhos, dando como desculpa o brilho violento dos néons para evitar o olhar de minha mãe. Estou de novo no hospital, como se jamais tivesse ido embora e, pela segunda vez em menos de uma semana, estou quase feliz com isso.

Hoje é quarta-feira, dia de visita, até agora idêntico à segunda-feira. Trabalho, sorriso bobo notado pelos colegas, desvio para ir buscar mamãe, pausa diante do quarto 55, tentativa de minha mãe de me fazer entrar no quarto de meu irmão.

Finjo não ver nada. Ainda tem o dissabor de minha tentativa de segunda-feira. E não estou com clima para recomeçar.

Além do mais, tenho coisa bem melhor a fazer...

Me dirijo ao quarto 52. A foto continua em cima do número do quarto. Agora que os amigos dela me explicaram, duvido que Any ame essa geleira em particular. Ainda tenho dificuldade de entender sua paixão, considerando especialmente para onde ela a trouxe.

Me apoio na maçaneta e congelo. Uma voz lá dentro, uma voz que, por sinal, acaba de se interromper ao ouvir o barulho do trinco. É a voz de uma moça, estou certo disso. E não é a da Joalin da primeira vez. Ouço uma cadeira que recua, depois barulho de passos hesitantes.

Solto a maçaneta buscando uma saída rápida, devo estar de dar pena.

Quem quer que seja, não estou disposto a explicar as razões de minha presença aqui. Inventar outra mentira ou dizer uma meia-verdade. Estou cheio disso. Queria apenas descansar um pouco num lugar tranquilo. Ninguém na posse de suas faculdades mentais aceitaria essa justificativa.

Quer dizer, ninguém, exceto Joalin e o namorado. Lamar não tinha cara de ter gostado muito da coisa.

A escada está muito longe para eu me refugiar ali. Essa moça certamente me verá correndo assim que abrir a porta. Ridículo. Mas a possibilidade de eu me jogar numa cadeira a poucos metros daqui também é. Mas, mesmo assim, funciona. Faço o tipo entediado, nossos olhares mal se cruzam. Ela parece uma estudante de uns vinte anos, que observa o corredor com incredulidade antes de se conformar.

Meus ombros relaxam e eu me afundo um pouco mais na cadeira. Eu estava dizendo que me achava ridículo, mas devia dizer medíocre. Acompanho minha mãe em sua visita a meu irmão no hospital e só desejo uma coisa, me ancorar no quarto de uma paciente inerte, tudo isso em busca de tranquilidade.

Cometo erro em cima de erro. Com meu irmão, com minha mãe. Com relação à tranquilidade. Não é pelo fato de me recusar a ver um membro de minha família que Any deve sofrer a mesma coisa. A prova é que ela recebeu a visita de seus três amigos na semana passada e agora está recebendo a visita de outra pessoa.

Eu me surpreendo esperando que a pessoa vá embora logo. Acrescento "egoísta" ao lado de "medíocre" e me afundo na cadeira ainda mais.

É a primeira vez que fico parado no corredor do quinto andar. Então olho um pouco em volta.

Primeiro, meus olhos localizam a escada, na qual eu poderia ir me esconder agora, mas finalmente, mesmo sentado no plástico duro, não tenho coragem de me levantar.

Há uma janela no fim do corredor, duas portas basculantes no lado oposto, que devem dar no mesmo corredor asseptizado, e alguns quadros apagados nas paredes.

Não entendo por que eles insistem em usar coisas ainda mais pálidas que o rosa envelhecido das paredes, que já dá ânsia de vômito... Talvez tenham receio de, com cores vivas, chocar as pessoas.

Mas numa UTI seria possível acreditar no contrário. De toda maneira... Não entendo nada disso. Jamais estive em coma, nem em recuperação pós-coma. Não faço a menor ideia do que as cores poderiam ter a ver com tudo isso.

I'm hereOnde histórias criam vida. Descubra agora