Capítulo 2 - Choque de Realidade(s)

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Cuidadosamente, Harry retirava o plástico bolha de mais uma taça de vinho decorada com fios de ouro ou tinta para vidro, ele não saberia diferenciar. Liam não tinha cara de Sommelier e muito menos de alguém que era tão cuidadoso e quase que acumulador de utensílios de cozinha modernos e louças importadas.

Mas ninguém leva os maiores traços de loucura de personalidade estampadas na cara, né? Harry estava definitivamente surpreso e se perguntava o quanto realmente o conhecia.

— O quê? - Liam amassa outra caixa esvaziada, percebendo a paralisia do outro ao observar o objeto.

Harry olha para ele com semblante confuso e levemente inquisidor.

Liam sorri de canto, pegando outra caixa com muito cuidado.

— Minhas irmãs. Elas sabem que eu curto muito vinho, então me dão uma taça para cada dia da semana.

Harry balança a cabeça em afirmação sarcástica.

— Família de bêbados, isso explica muita coisa.

Liam ri, abrindo outra caixa de pratos e os guardando no novo armário da cozinha.

— Eu não sabia que a Anne era traficante de café também não, cara.

Liam sorri sacana, apontando com a cabeça a montanha de cafés que Harry havia trazido de sua casa e amontoado no sofá sem nem ter tido o trabalho de organiza-los. A variedade dos grãos, das especiarias complementares e das origens de produção e cultivo era inacreditável. Tudo bem que Liam era um verdadeiro ignorante quando o assunto eram bebidas quentes, mas... um café torrado com especiarias aramaicas vindo da Síria?

Sério?

Harry ri, finalmente amassando violentamente a caixa que esvaziara.

— Cada um com seus vícios hereditários. - ele olha para o lado e vê as várias caixas que ainda esperavam para serem esvaziadas - OLHA AQUI, chega de vidro! Se tiver mais, vou quebrar na sua cabeça, irmão.

Harry puxa outra caixa, desta vez mais pesada que as outras, e rasga a fita superior com uma faca.

Liam paralisa, segurando um dos pratos de louça importada firmemente em uma das mãos.

- Shh! - Harry o olha alarmado - O que foi isso?

Harry para alguns segundos, tentando identificar algum som no ambiente.

Nada.

- Fui eu abrindo a caixa.

Liam põe o prato no granito, apoiando as mãos na beirada da pia.

- Não. Cala a boca.

Harry levanta as sobrancelhas em desdém, atingido pela rigidez.

Liam tinha um jeito bem ríspido às vezes, reforçado por sua profissão de bombeiro que exigia muita precisão e pensamento rápido. Ele parecia uma máquina em momentos de crise.

Harry percebe que seus ombros tinham se elevado levemente em tensão e que seus punhos tinham se fechado na beirada da pia, em uma espécie de canalização e alívio externo da pressão emocional interior. Seus olhos estavam arregalados e profundos como quando ele sente um pressentimento ruim, quando, segundo ele, sua intuição alarmava algum problema.

Harry mantinha esse constante questionamento se Liam era apenas um bombeiro traumatizado ou se realmente tinha algum tipo de espiritualismo extra-sensorial.

Um simples alarme de ambulância, um choro de criança, um grito de mulher ou apenas bêbados se estapeando de madrugada na rua já eram sons que o despertavam para um outro estado de espírito completamente diligente. Pensando assim, é óbvio concluir que Liam é apenas mais um traumatizado com o próprio trabalho, mas Harry tinha um olhar mais delicado acerca disso. Liam não costumava errar sobre essas coisas. Na verdade, desde o começo de sua amizade com ele, se tivesse errado 2 vezes sobre algum de seus pressentimentos, era muito.

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