Capítulo 4

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"Anos atrás"

-Como Valerie tem se saído?- Lion perguntou.

Laurent continuou parado à porta, observando a movimentação dos médicos na emergência, Valerie estava entre eles, atendendo de forma rápida um dos pacientes atingidos pela bomba que foi jogada no portão sul.

-Muito bem, ela não faz nada além de vir para o plantão e voltar para a residência que cedemos para ela. Além disso, continua tão reservada quanto no primeiro dia em que esteve aqui - Laurent respondeu.

-Você precisa fazer um movimento, seu humor está pondo todos ao seu redor andando na ponta dos pés, feito bailarinas.

-Não posso colocar a segurança de ninguém em risco só porque encontrei minha companheira.

-Homem, pelo amor! Chame-a para sair, que mal pode fazer?

Laurent considerou o que seu amigo estava lhe dizendo, sabia que Lion tinha um pouco de razão, mas ainda sim, seu pai e todos os linhagens confiaram a segurança deles em suas mãos e era pedir demais arriscar por uma mulher desconhecida, mesmo que ela fosse sua companheira.

-Laurent, você tem todo um grupo dando o suporte que precisar, sabe disso, não precisa carregar cada decisão nas costas. O ataque de hoje não foi sua culpa, o reforço que os humanos mandarão chega amanhã, acho que pode se dar uma noite de folga.

-Não tenho tanta certeza.

-Ouça, você precisa criar um vínculo com sua companheira, o efeito dela em você vai ser muito mais eficaz do que eu diminuindo a estática ao seu redor e, ultimamente, não tem feito muita diferença. Você pode fingir que não tem sentido dores de cabeça com frequência, mas não vai me enganar.

-Tentarei levá-la para jantar, está bem, mas não serei insistente se ela recusar.

-É claro que Valerie vai recusar, fez isso com todos os convites que recebeu, independente dos homens serem humanos ou linhagens.

Lion conteve a risada que ameaçou escapar quando viu o outro linhagem rosnar, ciúme é quase a língua oficial dos machos e fêmeas que encontram seus companheiros. A enfermeira próxima a eles olhou desconfiada para os dois linhagens parados, eles não estavam feridos, mas continuavam ali observando o cenário ao redor.

Valentina viu quando Lion saiu da emergência e deixou Laurent parado no mesmo lugar desde que entrou, seus dias têm sido um interminável círculo de trabalho, evitar Laurent e casa. Não fazia sentido evitá-lo, não conseguiria continuar assim por muito tempo, mas podia adiar o máximo possível. Valentina suspirou quando se jogou em uma das cadeiras da emergência depois que o enfermeiro levou o último paciente, eles não tinham tido muito tempo para levá-los para os quartos, os mais feridos tinham ido direto para a sala de cirurgia e os demais receberam os primeiros socorros ali mesmo. O cheiro de café a rodeou e ela olhou para o copo que Laurent colocou à sua frente.

-Obrigada - Val falou quando aceitou o copo.

-Eu que agradeço, desculpe por chamá-la durante a sua folga, muitos dos nossos ficaram feridos, e nós não somos tão simpáticos quando estamos com dor.

Val bufou enquanto sorria, os linhagens ficam insuportáveis quando sentem dor, perdem toda a educação e bom humor. Ela desfez o sorriso assim que percebeu que ele estava ali, Laurent tinha a capacidade de fazê-la baixar a guarda com facilidade, só precisava respirar ao redor dela pra que todas as suas defesas caíssem por terra.

-O que você me diz, doutora? - Laurent perguntou novamente, quando percebeu que ela estava distraída demais para lembrar que deveria responder.

-Você me perguntou alguma coisa?

-Sim, se está livre hoje a noite.

-Estarei em casa assim que terminar o meu turno. Por que?

-Quero levá-la para jantar e conhecer um pouco da Land.

-Não é necessário, mas obrigada pelo convite.

-É apenas uma refeição e um passeio amigável, doutora, não vou mordê-la.

Val segurou a resposta rápida e negativa que ameaçava sair da sua boca e tomou um gole do café que esfriava em sua mão, antes de assentir. Ela não estava muito certa de que era uma atitude sábia, mas ele parecia disposto a insistir até que cedesse, seria mais fácil aceitar e depois usar argumentos embasados para não repetir a dose.

-Ótimo, passo na sua casa as sete.

Laurent sorriu antes de sair, deixando a médica ainda processando com o que tinha concordado. O par de horas antes de ir buscá-la iria servir para passar em casa e tirar o terno em que trabalhava durante o dia. Valentina se olhou no espelho pela segunda vez, contrariando toda a sua experiência anterior com o sexo masculino, ela não estava assustada com o linhagem, apenas ansiosa, mas ainda disposta a manter uma distância segura. O vestido azul escuro era leve e solto, não revelava muito do seu corpo, mas a fazia se sentir feminina e, a melhor parte, cobria o ferimento na costela esquerda. As sete horas, com uma pontualidade britânica, Laurent tocou sua campainha e ela calçou a sapatilha antes de sair porta afora. 

-Você está linda - o linhagem elogiou.

-Obrigada e você está... Sem terno - ela riu.

-Ótima observação.

Era a primeira vez que ela o viu vestido de forma casual, a camisa de manga longa puxada até os cotovelos marcando cada linha de músculo e mostrando as linhas de tinta das tatuagens. Laurent caminhou ao lado dela pelos dois quarteirões, ele poderia ter dirigido, mas Val parecia prestes a correr dele sempre que estavam a sós. 

-Por que medicina, doutora? - Laurent perguntou durante a sobremesa.

-Meus avôs eram médicos, quis seguir o exemplo de seres humanos que eles eram, nunca conheci pessoas mais honestas e amorosas.

O linhagem sorriu com a informação, esse foi o primeiro deslize que ela cometeu, tinha dito ser órfã e não ter conhecido nenhuma família, mas citou seus avós. Deixou esse fato de lado, não queria arruinar o jantar e o clima agradável que eles conseguiram criar, mas anotou mentalmente que precisaria conversar com ela depois que construísse uma relação mais sólida.

-Não sei como você consegue dar conta de todos na Land - Val desabafou enquanto caminhavam de volta para sua casa.

-Eles são minha família, minha responsabilidade. Erros foram cometidos a alguns anos e quase perdi os mais próximos, não vou permitir que aconteça de novo, doutora.

-Você pode me chamar pelo meu nome ao invés de doutora.

-E irei, quando me disser seu nome.

-Já disse, está no meu crachá e nos documentos que você leu.

-Não, doutora, quis dizer seu verdadeiro nome, não o que você usa para se esconder.

Laurent deu um beijo na bochecha dela antes de desejar boa noite e sair, deixando Valentina na porta porta de casa. Ela deveria saber melhor sobre ele pra entender que não se deixaria enganar tão fácil.

Linhagens - LaurentOnde histórias criam vida. Descubra agora