1.4 A PROPOSTA

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Cheguei ao trabalho apressada em meus saltos 15 centímetros. Eu estava 10 minutos atrasada, como sempre. No entanto, foi só pisar na redação que meu coração parou de bater forte no peito — por receio de receber uma bronca — e eu pude usufruir da educação que minha mãe me deu para pelo menos dar um "oi" aos conhecidos a caminho da minha mesa.

Havia um post-it colado na tela do meu computador, dizendo que eu devia encontrar Zara em sua sala dali a meia hora. Sabendo que não teria tempo o suficiente para começar a pensar no meu próximo texto, ainda mais considerando a ansiedade para saber o que ela queria, resolvi só checar as estatísticas de aprovação do último. Eu escrevia semanalmente para a revista Brilho uma coluna intitulada Amor & Sexo. Ela costumava ser uma das mais lidas, não só dentro da revista, mas entre os concorrentes também, e aquilo era uma realização e tanto para mim.

No entanto, ultimamente, meus números estavam caindo sem que eu soubesse identificar o motivo.

Preferi não compartilhar com ninguém meu receio quanto aquilo, sabendo que ainda assim era uma coluna famosa e eu não teria porque levar um puxão de orelha tão cedo, mas como a perfeccionista que eu era, ficava difícil não querer ir ao cerne do problema.

Por isso, eu estava, ultimamente, obsessiva em ler os comentários no site ou e-mails direcionados a mim. Ficava procurando entre pilhas de elogios ao meu modo de escrever e atitude desapegada até achar algum xingamento. Os das últimas semanas gritavam em caps lock que eu não devia amar ou transar há séculos, e que por isso deveria desistir de escrever algo com essa temática.

Tudo bem, eram bem ofensivos, mas faziam parte de um todo maior.

Dessa vez, consegui encontrar algo melhor: Uma crítica construtiva. A pessoa se identificava por um codinome complicado e cheio de números, mas me dizia que apesar de amar a coluna, acreditava que eu estava sem motivação para novos temas ultimamente.

O que, em palavras infinitamente mais delicadas, era dizer o mesmo que os comentários negativos.

Eu era bem cabeça dura no geral, mas depois que você escuta a mesma coisa muitas vezes, a teimosia atinge um limite. Eu tinha acabado de terminar meu relacionamento justamente porque não amava mais ele e não gozava em suas mãos há tempos. Ou seja, minha vida realmente andava sem muito Amor & Sexo.

Eu odiava estar errada, mas era bom que eu não tinha tempo para isso agora de toda forma. O relógio mostrava que já estava na hora de ir para a sala da minha chefe, e assim eu fui.

Ela estava sentada com toda a sua postura imponente na cadeira de respaldo alto, conversando baixo com seu subordinado direto, Alek.

Deixem-me usar um tempinho para falar de Alek. Ele era alto, negro, de olhos claros, malhado, e o maior pedaço de mal caminho que já pisou na redação. Não havia uma única cabeça feminina que não virasse para admirar o caminhar despreocupado dele pelos nossos corredores. Trabalhava como supervisor de metas da revista, e cumpria sua função extremamente bem, mantendo seus lindos olhos verdes em cima dos jornalistas mais visados para garantir a melhor performance possível. Era misterioso, ardiloso e de um charme invejável. Juro... Ele era bom demais pra ser verdade.

Por isso que era bastante embaraçoso quando eu precisava encontrá-lo assim, em reuniões casuais com a minha chefe. Meu sangue parecia migrar do cérebro e de repente eu não tinha mais a menor facilidade com as palavras, como era de se esperar de alguém que optou por uma carreira no jornalismo.

— Zara, chamou? — Perguntei, tentando forçar meus olhos a permanecerem nos intrigados da minha chefe, e não nos pecaminosos do meu superior.

— Sim, querida. Sente-se, por favor. — Eu fiz o que ela pediu, ficando bem à sua frente. — Rebecca, você tem visto o que as pessoas têm dito sobre sua coluna nos comentários?

— Eu tenho dado uma olhada, sim.

— Bom, então não é surpresa que eu esteja preocupada com você, estou certa? — Zara levantou as sobrancelhas, e parecia querer que eu chegasse a uma conclusão junto com ela. Aquilo nunca aconteceria com Alek ali do lado, roubando grande parte da minha capacidade lógica.

— Preocupada? — Ecoei, esperando que ela me ajudasse a entender. Ela suspirou, como se tivesse entendido que seria um pouco mais complicado, e rodeou sua mesa, acabando por apoiar-se bem na minha frente.

— Sabe, eu fiquei com a sua festa na cabeça. Aquele papel dos garotos que você tinha interesse quando adolescente... E isso me deu uma ideia. Pareceu, na verdade, a motivação ideal que você precisa para voltar a bombar a sua coluna. — Compartilhou, os olhos brilhando, visando o sucesso. Fiquei um pouco incomodada só de lembrar de toda a saia justa que passei por causa daquela bendita lista, mas não cheguei a negar. Para falar a verdade, não tinha ainda compreendido como ela esperava que eu fizesse aquilo.

— Como um especial. — Alek respondeu, quase como se lesse minha mente. — Um especial de 12 semanas.

— Exatamente. Você iria atrás dos outros homens contidos ali, e escreveria a respeito dos reencontros na sua coluna semanalmente. — Zara completou, parecendo a cada segundo mais animada com a ideia.

— São várias oportunidades diferentes de você transar ou se apaixonar, e empacotado em uma temática cativante que deve prender os leitores até o fim. A gente acredita que é tudo que a Amor & Sexo precisa agora.

Eu estava embasbacada, minha boca só não estava no chão porque eu ainda tinha algum controle sobre as minhas expressões faciais. A Rebecca adolescente estava gritando no meu ouvido que era bom eu nem considerar aquela palhaçada, para não envergonhá-la, enquanto que a Rebecca jornalista estava com seu coração acelerado ao reconhecer uma boa pauta.

Pauta aquela que envolveria sair com completos desconhecidos nos próximos 3 meses, sem pausa. E, antes que a minha vagina começasse a achar interessante a ideia, eu precisava lembrar que tinha uma chance considerável de pelo menos metade deles não estarem mais disponíveis, bonitos ou interessantes, afinal fazia muito tempo desde que aquela lista foi feita.

— Eu não sei, gente... Eu nem conheço mais aqueles caras, nós não nos falamos há mais de 10 anos. Eles nem se devem mais lembrar de mim. — Tentei argumentar, só para ganhar tempo enquanto entendia se aquilo fazia ou não sentido para mim. A minha coluna costumava ser muito confortável, nada do que eu fiz por ela desde que a criei chegava perto do desafio que aquele especial poderia ser, pessoal e profissionalmente falando.

— Você não precisa nos dar uma resposta agora, querida. — Zara disse em seu tom sempre tão materno. — Mas pense com carinho, e tenha em mente que você receberia um bônus bem generoso por esse especial. — Um bônus... Hm. — Nós voltaremos a nos falar, Rebecca. Por hora, está dispensada.

Saí da sala com a cabeça cheia, centenas de argumentos pesando os benefícios e os males de aceitar aquela proposta. Não precisei dar mais de três passos para ter certeza de que precisava de ajuda para decidir. Ajuda de meus amigos e, principalmente, ajuda de um bom copo da minha amada tequila.

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