Quando você não estuda para uma prova objetiva (aquelas em que se marcam x, caso não saiba) é quase certo que você tem, pelo menos, quatro opções que poderiam ser a alternativa correta. Matemática nunca foi o meu forte, eu confesso, então não me arriscarei lhe oferecer a porcentagem correta, mas não é esse o ponto que quero tratar. Só quero dizer uma coisa: é arriscado. Principalmente se você não tiver nenhuma noção da matéria correspondente. Mas, guiados pelo desespero, a gente chuta. A gente lança os dados e seja oque Deus quiser. De maneira pretensiosa, penso que nosso impulso de chutar vem do pensamento de "Não tenho nada a perder" junto com afirmação da nossa vontade de tentar. E nesse momento, eu me sentia bizarramente desse jeito. Lancei os dados, torcendo para que o resultado fosse satisfatório. Mas o risco que eu corria era bem maior do que tirar uma nota ruim. E o preço caso eu consiga é demasiadamente pequeno. Sendo assim, por que me arrisquei tanto?
Apenas por capricho.
Sim, não devia haver outro motivo.
Eu queria resolver aquilo, então me dei o luxo de arriscar tudo, inclusive a paz da minha família, por um prêmio baixíssimo.
Mas pense.
Se queria apenas cumprir um capricho meu, não deveria estar feliz? Se ganhasse ou perdesse, seria consequência da escolha que eu fiz.
Mas, como eu já ressaltei com ardor na breve introdução desse fracasso, julgo que a ignorância é um privilégio. Se eu não me desse conta dos riscos, arriscar seria simplesmente muito divertido. Talvez essa afirmação venha do meu simples e puro egoísmo, na verdade, com certeza é originado dele, mesmo assim, considero que um capricho deixa de ser um capricho quando a gente se sente mal por conta dele. E eu me sentia mal.
Como somos da mesma sala, foi muito fácil colocar um bilhete na bolsa dele sem que ninguém visse. Eu sei, você deve estar pensando "quem usa um bilhete quando se pode simplesmente mandar uma mensagem para o cara?". Em quase todos os casos, você estaria certo e eu faria papel de bobo, mas, nesse em específico, não. Nícolas é um daqueles caras que não se importa em deixar o celular a mostra e como sempre tem crédito, é fácil que seu aparelho passe pela mão de seus amigos. Para o meu plano dar certo, não podia contar que os amigos dele viriam ao meu encontro também. Escrevi um bilhete rápido, dizendo-lhe: Sei das medalhas e talvez eu possa te ajudar. Me encontre na biblioteca depois que a aula acabar.
No horário combinado, eu estava lá, tentando distrair-me com uma cópia do primeiro volume de Harry Potter, um dos únicos livros ficcionais da nossa biblioteca limitada. Havia uma moça atrás de uma bancada jogando paciência no velho computador e se enfurecendo toda vez que tinha que parar com o joguinho para tirar um xerox ou coisa parecida. No mais, a biblioteca era composta por duas mesas, com quatro cadeiras ao seu redor, e uma estante de livros, como já era o esperado. Fiquei na mesa da janela, eufórico, quase saltando toda vez que alguém abria aquela porta.
Nícolas chegara de repente, caminhando diretamente até mim. Sua cara estava péssima. Olhos eram abatidos e o cabelo, sempre espetadinho, ficara um emaranhado estranho e arrepiado. A postura estava péssima também, parecia que o garoto não se lembrava mais como era olhar para cima.
— Você que me causou essa merda!? — ele falara, um pouco alto demais... A moça desviou a atenção de seu joguinho tão importante para recriminá-lo com um "shhhh". Mais baixo, ele continuou a falar. — Se foi você, pode desfazer essa porra já. O que você quer? Dinheiro? Pois eu tenho de sobra. Alguma garota? Com um estalar de dedos, qualquer uma ficaria com você. Só quero resolver essa porra de uma vez. Vamos, peça! — ele estava mesmo desesperado. Sequer questionou se eu estava falando a verdade ou não.
— Olha, você está entendendo errado, Nícolas. Eu não sei como causar essa merda, apenas a enxergo. Mas se você manter a calma e conversar comigo, talvez eu até consiga resolver. Mas tem que ficar calmo.
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Nossa coleção de fracassos
Novela JuvenilDepois de um fatídico encontro com um esteriótipo de hippie, que ocorrera durante o passeio escolar que visava inaugurar o ano, Martim, um adolescente comum e sem tantas aspirações ambiciosas sobre seu futuro como as de seus colegas de classe, acaba...