" A saudade de amanhã"

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OS TRÊS GAROTOS se sentaram no chão da oficina, um pouco tensos. Yeonjun não se sentia bem sabendo o que o primo caçula andava fazendo nas horas vagas. Ainda mais para Soobin e seu irmão. Isso era inaceitável.

- Cara, o que há com você? A gente só dava umas risadas... - Beomgyu começou, chateado.

- E agora você bate em calouros. - Yeonjun completou, sério. Ele brincava com uma chave de fenda, desenhando círculos no chão de concreto. De certa forma, ele se sentia responsável pelo primo. 

- Eu sei... As coisas saíram do controle - Tae-hyun respondeu, mantendo o olhar para o chão - O que eu faço?

- Bem, poderia começar parando de fazer com que a gente pareça delinquentes infantis. - Beomgyu sorriu de leve - Ir para um reformatório não está na minha wish list.

- Sim. Peça desculpas formalmente para todos. Sua sorte é que o tio e a tia não sabem disso - Yeonjun encarou o primo. Ele não podia falhar com o primo também.

- Eu sei... seria horrível se descobrissem, né? - Tae-hyun sorriu um pouco.

- Ah sim, seria um desastre. - Yeonjun continuou, também sorrindo. E seria mesmo, pois os pais de Tae-hyun costumavam ser bem rígidos - Você fez mais mal do que bem.

Yeonjun repreendia o primo como um pai disciplinaria um filho. Um irmão dando conselhos para o outro. Família. Um cuidando do outro.

- É, eu dei mancada. Mas parecia tão fácil...

- Puff... Virou viciado? - Beomgyu o encarou - Preste atenção, Tae-hyunnie: não é porque é fácil que é bom - Tae-hyun assentiu.

Os garotos ficaram em silêncio. Beomgyu costumava ser o palhaço do grupo, sempre os animando e contando piadas. Mas nas raras vezes em que o loiro falava sério, todos sabiam que era melhor dar ouvidos. 

- Amigos? - Tae arriscou.

- Não. Pelo menos não tão cedo- O azulado do trio respondeu. O silêncio preencheu a oficina - Mas vamos ver - Yeonjun deu um sorriso brincalhão.

Seria estranho olhar para Tae-hyun e se lembrar da expressão de pânico dos irmãos Choi naquele dia. Mas desde que os dois perdoassem o primo de Yeonjun, ele não via problema em fazer o mesmo.

- Ah! Ainda bem, não gosto do nosso trio brigando - Beomgyu fez o que poderia ser um biquinho. Brincando, como se tudo estivesse bem de novo. Mesmo que ainda estivesse algo escondido nas entrelinhas.

- A culpa foi dele! - Yeonjun apontou para o primo.

- Não tenho defesas - Tae-hyun ergueu as mãos em rendição. Os garotos riram. Apesar de todos os erros e defeitos, eram amigos. E todos sentiam falta daquilo.

Yeonjun nunca quis ser um encrenqueiro, na verdade. Só gostava no início, pois achava que estava chamando a atenção da mãe e que ela voltaria.

 Tudo começou porque um calouro os viu passando cola na cadeira da professora de química. E Tae-hyun resolveu que era uma boa ideia ameaçar o garoto. Para começar um incêndio, basta apenas uma pequena chama.

- Então... - Beomgyu sorriu, travesso - Qual vai ser nossa próxima peça?

(...)

Por incrível que pareça, Yeonjun estava nervoso ao se aproximar do balcão da biblioteca no dia seguinte. A senhora Yoon estava trabalhando no computador, e Soobin provavelmente não estaria ali, já que sexta-feira não era dia dos dois trabalharem.

- Yeonjun, querido! - A doce senhora sorriu - Em que posso ajudá-lo? 

- Bem... - Yeonjun coçou a nuca - Eu queria pedir um favor...

- Pode pedir. Para um ajudante meu, qualquer coisa! - Ela saiu de trás do balcão e indicou uma mesa próxima.

 Yeonjun reparou como a roupa da senhora era requintada, nas cores da escola. E como o crachá de bibliotecária reluzia na luz do sol que entrava pelas enormes janelas do lugar que o garoto passara a amar. Ele se sentou na cadeira em frente a da senhora.

- Então? - Ela juntou as mãos na mesa. Atenção total em Yeonjun.

- Como a senhora sabe, - Ele começou, a voz tremendo de nervoso - Hoje seria meu último dia trabalhando aqui. - A senhora Yoon assentiu, com um sorriso.

- E eu... queria saber, se tem como a senhora não me liberar para o diretor.

- Porque você fez algo, e com isso,  você tem que ficar aqui até o final do ano letivo - Ela sorriu, cúmplice - Talvez você tenha destruído alguns exemplares... algo assim, que tal?

Yeonjun assentiu. Era exatamente o que ele tinha em mente. E por algum motivo, a senhora sentada a sua frente parecia estar sempre um passo à frente, como se já soubesse que o garoto iria pedir mais tempo ali. E o motivo por trás disso.

- A senhora poderia deixar isso entre a gente, sem contar para o Soobin? É que... - Yeonjun foi interrompido pela senhora, que pegou em sua mão e assentiu.

 Agora ele estava começando a entender o carinho enorme que Soobin tinha pela bibliotecária.

- Não se preocupe, seu segredo está em boas mãos. 

(...)

Yeonjun e Tae-hyun estavam ajudando Chung-hee com o carregamento das novas bicicletas. Estava frio, e os garotos não viam a hora de irem para casa, a uma quadra de distância. Mas o tio de Yeonjun pretendia fechar a loja tarde, deixando tudo na mão dos garotos para sair com Hayan. Ele achava justo os tios tirarem a sexta para descansar, então não reclamou do vento castigando suas bochechas. Ou seu cabelo.

- Ya! Andem logo, não quero que fiquem no frio! - A mãe de Tae-hyun gritou da porta da loja.

- Hyung, quer pedir pizza? - Tae-hyun perguntou enquanto ajudava Yeonjun a carregar uma bicicleta para a loja - Lia vai chegar tarde, seria uma boa surpresa para ela.

- Você ainda não pode me chamar de Hyung - O azulado o olhou - Mas quero pizza de pepperoni. 

- Ok... - Tae-hyun suspirou. No fundo, Yeonjun sentia falta do primo. Porém, não queria dizer que tudo estava bem. Porque não estava.

Ele percebeu que o tio os olhava de soslaio, como se estivesse se perguntando sobre os garotos e por quê estavam brigados. Era fácil deduzir, já que os dois faziam as refeições emburrados e pararam de jogar videogames juntos, como sempre faziam. Era incrível, como os tios realmente se importavam com os dois adolescentes. Rigorosos, mas amorosos. 

Infelizmente, nada seria o mesmo para Yeonjun. Ele morava com os tios e os primos há dois anos, desde que seus pais se divorciaram.

O pai de Yeonjun, desapareceu do mapa no momento em que os papéis foram assinados. E a mãe tentara viver com o filho do melhor jeito possível por uns meses. Até que ela chegou ao limite. E Yeonjun também.

Sua mãe saiu em uma viagem para ter um ano sabático, mas acabou se tornando uma viagem de dois, e não seria surpresa se fosse estendida para três. Yeonjun sabia que ela já tinha um novo relacionamento, até trabalho.

Na época do divórcio, ele descobriu que poderia perder o controle com muita facilidade. E isso certamente não ajudou na situação. Mas todas às vezes, sua mãe dizia que estava tudo bem, pois também era difícil para ele. Os dois iam para a sorveteira mais próxima e tudo se acalmava de novo.

Então por que ela foi embora? Por que ela não levou Yeonjun junto? Ele se culpava, pensando que, se fosse um filho melhor, sua mãe ainda estaria na Coreia. Ele tinha falhado com ela. E não sabia quando a veria de novo.

Tantas perguntas guardadas em algum lugar da garganta, esperando para saírem para o mundo. Yeonjun queria gritar, mas sabia que não adiantaria. E então ele perdia o controle. A última vez fora na biblioteca.

Depois daquele dia, Yeonjun estava mais tranquilo. E novamente, aquilo tinha o mesmo motivo de todas as coisas que mudaram em sua vida.

Ele só esperava não falhar com o motivo também.

(...)

Muito obrigada por todo o apoio e comentários! Amo vocês :)

The book of you and I • YeonbinOnde histórias criam vida. Descubra agora