Ainda estavam sentados ao redor da mesa, era mal feita e um pouco perigosa, os fios de madeira desfiados ameaçando cortar a pele de quem se apoiasse ali. Arya já havia bebido um pouco de chá, duas xícaras, grandes e fundas, na tentativa de esconder o nervosismo de seu interior.
— Eu preciso te contar uma coisa, Pratt. — A garota disse, se balançando na cadeira frágil de madeira que rangia a cada movimento seu.
— O que?
— Você sabe que estou trabalhando para o rei, não é? — disse, aflita. — Faço pesquisas na biblioteca com alguns estudantes de saúde.
— Ouvi falar. — Pratt respondeu.
Idra coçou a cabeça, nervoso.
— No meu primeiro dia, conheci uma garota chamada Alícia. Haviam outros estudantes também, mas foi ela que me ajudou. — Arya respirou fundo, tentando lembrar-se da ordem dos acontecimentos. — Me deu alguns livros para que eu começasse a estudar e... em um deles, eu achei uma coisa.
Pratt levantou as duas sobrancelhas.
— Idra achou, na verdade. — disse ela. — Pensei que era só mais uma anotação velha, mas era um papel quase todo queimado, um pedaço de página do meu diário.
O semblante de Pratt parecia o de uma estátua mórbida com buracos nos olhos e a pele engessada. Arya pensou que ele fosse desmaiar quando o soldado abriu a boca e disse:
— Como isso é possível? — Gaguejou. — O q-que tinha escrito?
— Nada. — Idra disse. — Nada de importante, apenas algumas palavras soltas.
— Existe alguma possiblidade de ter sido...
— Alícia? — Ela disse. — Sim, existe. Mas eu duvido, ela é meio esquisita e não tem cara de suspeita.
— E o que vocês fizeram?
Como ninguém respondeu, Pratt continuou:
— Precisamos investigar. Isso não parece ser uma brincadeira.
— Pratt está certo. — Idra falou, andando em círculos pelo pequeno quarto. — Alguém está se esforçando muito para vê-la machucada, aérea, e eu não vou permitir que isso aconteça.
As palavras de Idra, embora fossem sinceras, faziam o coração da menina palpitar. Ela sabia como era estar em perigo, havia sentido em sua pele durante os três dias em que ficara caída na Floresta do Norte. Havia sentido isso inúmeras vezes no castelo, mas nunca se sentiu tão ameaçada quanto no dia em que encontrara o pedaço de papel.
E agora, ela estava ali, discutindo a possiblidade de alguém querer feri-la, física ou emocionalmente. De qualquer forma, as palavras foram como um choque. Alguém estava se esforçando muito para vê-la machucada. A garota sentiu enjoo, uma sensação angustiante se apoderando de seu corpo e deixando seus nervos arrepiados, algo parecido com o que ela sentiu no dia em que foi envenenada.
Era corrosivo e incerto.
— Você está bem? — Idra disse, encostando a mão em seu rosto. — Pegue um pouco de água para ela, Pratt. Acho que vai desmaiar.
— Não vamos encontrar água aqui. Não venho neste quarto há meses e não temos água corrente. — Ele parou por um minuto, pensando no que acabara de dizer.
O soldado suspirou, absorvendo do corpo o poder adormecido e deixando as mãos leves prontas para ficarem molhadas. Uma pequena esfera de água surgiu entre suas mãos, era concisa e impenetrável, flutuava com a leveza de um pássaro. Em alguns momentos, a esfera tremia, instável entre as mãos inexperientes de Pratt e ameaçando se espatifar no chão.
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A Coroa Púrpura
Fantasy! FINALIZADA ! Numa civilização escondida, vivem os Coulor, humanos que - por sorte ou azar - nasceram agraciados pela natureza, segregados por cores e poderes advindos dos quatro elementos naturais: Ocres, Violetas, Escarlates e Cianos. Dentre ele...