1

72 11 1
                                    

Era uma manhã fria de inverno, quando Marjorie saia de casa carregando o seu filho, Kevin, de cinco anos, em seus braços.

Ele estava desacordado e respirando pesadamente como se estivesse sob efeito de algum sedativo que ela provavelmente havia dado a ele para não correr o risco dele gritar ou tentar fugir durante o trajeto.

Ela balançava o garoto freneticamente em seus braços, e olhava o tempo todo pra trás. Parecia estar fugindo de alguém que a perseguia.

Por fim, ela chegou ao seu destino final, um pequeno lago que ficava isolado da cidade.

Marjorie era obcecada por aquele lugar, especialmente por conta da água cristalina que ela acreditava ser capaz de purificar e curar as impurezas da alma, inclusive as que ela acreditava estar presentes em seu filho.

Com as mãos trêmulas e feridas, ela acariciou os cabelos loiros e sedosos do menino, antes de tirar sua roupa o deixando completamente nu, e após isso, ela o expôs ao frio congelante daquela manhã, o sucumbindo a uma possível hipotermia.

Ela vislumbrou a imensidão daquele lago, que apesar de sua beleza, foi responsável por muitos afogamentos por conta de sua frieza e profundidade, tanto que as mães proibiram severamente os seus filhos de brincarem por lá.

Ela olhou nos olhos semi abertos do filho, e se atentou a sua respiração pesada. Ela imaginou que jamais o veria crescer e se tornar um bom homem. Suas mãos tremiam ainda mais enquanto ela tentava sustentá-lo sem forças.

Por fim, decidida, ela deu um último beijo doloroso em seu rosto e o estendeu como em um ritual de sacrifício. Ela olhou para o céu e permitiu que as lágrimas invadissem os seus olhos.

Sua respiração entrecortada oscilava em seu peito enquanto lutava contra ela mesma e sua insanidade, mas quando estava prestes a joga-lo na água, sentiu a presença furtiva de alguém.

—–  Ei você aí? — Gritou o desconhecido.

Marjorie virou o rosto subitamente e viu um policial se aproximando do outro lado.

—– Droga! — Ela soltou

Assustada e relutante, ela jogou a criança no lago e depois voltou correndo pelas águas até por fim alcançar a superfície e ganhar mais flexibilidade em sua fuga.

O policial ficou dividido entre ir atrás dela ou salvar a pobre vida inocente que estava sendo engolida pela água fria e congelante.

Por fim, ele desacelerou os passos, e em um ato heróico, ele voltou atrás, tirou rapidamente a jaqueta que estava usando e pulou na água, sentindo o seu corpo enrijecer por conta da frieza da mesma. Minutos depois ele reapareceu com o menino em seus braços.

Tremendo e ofegante, ele ficou horrorizado com que acabara de presenciar, mas reconheceu que não tinha tempo para questionar a tamanha frieza daquela mulher que mal se comparava com a frieza daquele lago. Precisava salvar aquele menino. Então ele tentou de todas as formas possíveis, reanimá-lo enquanto o frio adormecia tanto seus membros quanto os do garoto que já estava com os lábios azuis.

—– Vamos lá, garoto, você não pode morrer — Ele disse com o queixo batendo e ofegando.

Ele fez de tudo pra salvá-lo, até que em um momento se sentiu covarde e amedrontado ao vê-lo o garoto ficar pálido e ainda mais frio diante de si. As lágrimas logo vieram aos seus olhos e a impotência o fez ficar tão pequeno, a ponto de se igualar ao tamanho do garoto do qual ele não conseguira salvar.

Mas antes de enterrar o rosto nas mãos e lamentar pelo ocorrido, ele escutou uma tosse seca, e quando olhou para a criança percebeu que ela estava expulsando toda a água que havia engolido.

Ele abriu um sorriso esperançoso e rapidamente correu na direção do garoto, usando a sua jaqueta seca para cobri-lo.

—– Graças a deus — Ele suspirou aliviado, enquanto procurava pelo celular no bolso da jaqueta, e quando finalmente o encontrou, ela discou o número de emergência.

....

Uma coisa, Lian Gordon sabia, que ele fora um herói na vida daquele pequeno garoto que agora, recuperado, o olhava serenamente como se o conhecesse, mas ele não tinha a menor ideia de qual era o próximo passo a se tomar, então pensou que um orfanato seria uma boa opção, já que ele estava divorciado e lidando com o processo da guarda dos filhos, e não podia ficar com ele.

Ele achou que seria um bom recomeço para um garotinho que passou por algo tão terrível, ter do lado pessoas amorosas que quisesse realmente cuidar dele.

—– Olha, você vai para um lugar legal, onde tem muitas crianças iguais a você, onde vai poder brincar e se divertir - Ele disse se ajoelhando diante do menino que o encarava com aqueles olhos verdes e confusos, mas a expressão do garoto não era de uma criança aliviada por não estar mas com a mãe que o maltratara. E sim de uma criança triste e aborrecida por não entender muito bem o que estava acontecendo. Tudo que ele queria era voltar para casa.


No orfanato ele foi bem recepcionado, alimentado e colocado pra se juntar às demais crianças que tinham a mesma idade que ele.

-—– Tão pequeno — Disse uma das mulheres que o observava mordiscar um sanduíche de longe.

—–  Pois é, não acredito que uma mãe possa ser tão cruel assim, tentar afogá-lo, que coisa horrível — Disse a outra quase que sussurrando.

—– Bom, existem mães e mães, eu acredito que uma mãe de verdade nunca faria algo assim, o que essa criança fez? não pediu pra vir ao mundo — Correu os olhos em volta - Nenhuma delas.

—– Melhor não contar nada para os novos pais, essa criança não merece pena, merece um lar, amor e carinho, e também do jeito que estão os pais adotivos hoje em dia, nem vão querer adota -lo, se souberem.

—– Verdade, vamos só dizer que a mãe o deixou aqui,que o abandonou.


Depois que entraram no acordo, elas se retiraram, enquanto o garotinho acompanhava minuciosamente os seus passos com os olhos, até elas finalmente sumirem de vista.

E então ele esmagou o sanduíche com as mãos e jogou na lixeira que tinha ali perto.

Mais tarde, depois de perguntar centenas de vezes sobre quando a mãe voltaria para busca lo, ele parou de perguntar e simplesmente se fechou em um silêncio mortal, assim ficando difícil para qualquer pessoa decifrar suas emoções.

Ele ficava o tempo todo olhando para o portão, esperando que a próxima mãe que iria entrar, seria a dele, pedindo perdão como todas as vezes que ela fazia. Mas depois de esperar por tanto tempo, ele desistiu, e se forçou a conviver naquele lugar, que estava muito longe de ser a sua casa.

O garoto, tão pequeno, não entendia como aquelas crianças viviam ali sem sentir falta de suas mães, quando ele simplesmente não conseguia dormir sem um beijo de boa noite.

O Garoto do Lago ( Conto)Onde histórias criam vida. Descubra agora