Capítulo dez - Descobertas

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LAURA

Após tomar minha sopa peço para Serafine me explicar o ocorrido, ela diz que só precisa chamar Marcos e quando voltar explicará tudo.
Espero ansiosa. Não sei o que aconteceu e isso me aflige. Sempre tive plena noção de tudo o que me acontecia, bem, pelo menos até o dia em que fui beijada por Felix.
O que será que aconteceu com ele? Será que venceu a batalha? Será que conseguiu proteger nosso povo? E, se venceu, estarás a me procurar? Ah, como sou tola. Talvez nem pense mais em mim, não sinto mais aquele calor que eu sentia sempre que pensava nele, um calor que me dizia que ele sentia algo por mim, que ele me esperava, que ele não me deixaria partir assim, sem mais nem menos. Mas acabou. Talvez ele seja um homem "de lua", seus sentimentos e pensamentos mudam constantemente, assim como as pessoas para as quais ele possa ter sentido algo. Não sei. Ele é uma grande incógnita para mim, sempre foi.
Meus pensamentos são interrompidos quando uma elfa com aparência cansada e um troll com olhos cheios de carinho, entram em meu quarto. A dupla exótica me olha com algo parecido com aflição. Ou será medo? Medo de que?
- Bem, não há outra forma de dizer isso, você é a enviada da Deusa para salvar o mundo, ou começar outro. Depende de você. - Diz Marcos de uma vez só. Fico sem reação. Afinal, do que ele está falando? Serafine o olha com desaprovação. Ele olha para ela e faz uma cara de assustado. - O que foi? Fiz algo errado? - Pergunta com certo receio na voz.
Serafine se vira para mim com um olhar compreensivo, suspira e diz:
- Para que entenda o que estás a lhe acontecer é preciso que escutes uma história. Estás disposta?
Suspiro. O que eu perderia escutando a tal história? Nada. E, com toda certeza, eu quero entender o que está acontecendo.
- Sim. - Digo simplesmente.
Ela balança a cabeça como se estivesse concordando com algo. Assim como eu, suspira, me olha nos olhos, e toma fôlego.
- Há muitos milênios, antes mesmo de nossos reinos se dividirem e tornarem-se vários, éramos um único povo, unidos pelo amor a terra e pela fé na grande e esplendorosa Deusa. Todos vivíamos em paz. Não existia a relação senhor/servo, todos se ajudavam. Porém, em uma tarde ensolarada, surgiu no céu uma nuvem estranhamente negra. O povo não sabia o que estava a acontecer, o povo tinha medo do que poderia vir de tal nuvem. Passaram então a se abrigar em suas casas o dia e a noite toda. A Deusa, em seus passeios pelas terras, um dia encontrou um senhor desamparado no meio de uma tortuosa tempestade, então foi até ele e perguntou por qual motivo estava sozinho ali. Ele então lhe respondeu, como fosse um profeta, o mal chegou, as guerras virão, e o povo contra o povo se esmagaria, e só quem poderia salvá-lo seria alguém a que esse povo pertencia. A Deusa não acreditou, porém na tarde seguinte, após um encorajamento da Deusa, todos saíram de suas casas para uma grande festa. A nuvem no céu permanecia, e durante o ápice da festa, se derramou sobre o povo. Tal nuvem continha propriedades como: rancor; ódio; inveja; solidão; agressividade; luxúria; mesquinhez; paixão avassaladora; e com esses sentimentos, veio a noção de guerra. A pobre Deusa não sabia o que fazer para acalmar seu povo que estava se matando, não podia impedi-los, afinal havia dado a cada uma de suas criaturas, o livre-arbítrio. Então disse, em sua última aparição, "Minhas amadas criaturas, não sabem o imenso pesar que abala meu coração ao vê-los uns aos outros ferir, porém nada posso realmente fazer. Por isso deixo aqui a semente do amor. E saibam que um dia mandarei um de vocês para salvar essa terra, ou outra construir." E assim, a esplendorosa Deusa partiu para seu trono, de onde protegia todos que sua ajuda pediam, todos que ela mereciam. - Escuto toda história abismada. Sempre tive acesso a todas as histórias, e hoje Serafine me mostrou que estava enganada.
- Onde escutou essa história? - Pergunto extremamente curiosa.
Serafine sorri fracamente e olha para o nada, como se estivesse a se lembrar de uma época feliz. Pelo que essa prover elfa já passou? Parece carregar um peso enorme em suas costas.
- Tem uma coisa que não sabes sobre mim, Laura. - Ela suspira pesadamente, e eu a olho encorajando-a a continuar. - Sou a princesa do povo elfico, meu irmão é Frodo, o rei.
Olho-a espantada. Então ela pode ser a inimiga. Mas... se fosse a inimiga não me contaria assim, na frente de Marcus, alguém que jurou me proteger de tudo e todos.
- Por que? - Pergunto simplesmente, ela entende quais são os "por ques".
- Em seu leito de morte, meu pai me pediu para que impedisse meu irmão de causar uma nova epidemia de guerras. Ele disse que contou uma história par meu irmão, e desde então Frodo tenta encontrar a pessoa enviada, meu pai me disse onde encontrar tal história e disse também que havia o boato de que a escolhida estaria escondida no reino das fadas. Na época ainda não era nascida, sabes que nós elfos vivemos até três milênios, foi uma maldição, um elfo tentou matar a Deusa, bem, já sabemos que não deu certo. Vivi em paz, pensando que poderia ser apenas mais um delírio de meu pobre pai. Mas então, você nasceu, alguns anos depois curou o rei, a notícia se espalhou. Lembro-me de escutar meu irmão dizendo que era melhor esperar. - Suspira. - Pensei que ele não seria capaz de fazer algo tão ruim. Estava enganada. Quando vi Felix se despedindo de meu irmão há algumas semanas, soube que teria que fazer algo. O vi chamando todos os soldados para derrotar "aquele povo imundo", ele pretendia te matar. Então fui atrás, consegui convencer Marcus a me ajudar, e estamos aqui agora.
Respiro fundo. É muita informação. Aparentemente sou a chave para o fim dessa guerra. Só me resta descobrir como fazer isso.
- Vou te dar tempo para pensar. É muita coisa para assimilar. - Diz Marcos, se levanta e sai.
Serafine fica um minuto a mais me olhando. Aproveito e pergunto com medo:
- Meu pai está vivo?
- Sim. - Responde me olhando nos olhos. Vejo tristeza nesses olhos. Me levanto e a abraço. Ela está com muitas dores, e não são só físicas. Não posso imaginar pelo que ela está passando agora. A escuto fungar. Está chorando. - Eu tinha esperanças de não ser você. Se não foce, poderia ter uma vida feliz, como sempre sonhou. - Funga. - Me desculpe.
- Ei, você não tem culpa. Shh. Fica calma. Eu te agradeço por confiar em mim, e por sacrificar tanta coisa por mim. - Digo também com lágrimas nos olhos.
Ela se solta de meu abraço, funga, e sorri. Retribuo o sorriso. Tenho carinho por ela, por incrível que pareça. Ela vai em direção a porta, mas antes de sair diz:
- Ele também.

É possível amar?Onde histórias criam vida. Descubra agora