iv. m suposto guaxinim.

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horas antes

Era de manhã bem cedo. Umas sete horas pra ser mais exata, e eu estava descendo as escadas enquanto coçava minha barriga meio rechonchudinha para tomar café da manhã. Por ser muito cedo, eu me encontrava um tanto quanto desnorteada, tropeçava nos próprios pés e bocejava a cada cinco minutos. Meus cabelos estavam com nós dignos de escoteiros e meus olhos ainda ardiam devido o longo tempo no escuro.

Passando pelos labirintos de corredores da minha casa logo chego ao meu destino. Ao atravessar o ambiente já fui recebida com "bom dia" de Melody ─ a empregada ─ e Daisy que me encarava torto. Meus pais estavam lá e pareciam não ter me notado ainda.

Juntei-me à eles na mesa e esfreguei os olhos para acostumá-los ainda mais com a luz.

─ Bom dia. ─ Murmurei encarando a mesa farta. Haviam frutas, alguns legumes crus e uma mistura de café da manhã oriental e ocidental. Meu pai costuma ser bem tradicional quando se trata de comida, portanto estava degustando de uma sopa de missô e minha mãe tomava uma xícara de café.

Koji estava mais por dentro do café ocidental, comia pão com ovos e bacon. Já eu, não sabia se estava realmente com fome, sentei ali apenas para não fazer desfeita e ter que ouvir um monte depois de Melody e Daisy.

─ Não vai comer, filha? ─ Youko Saito, mais conhecida como minha mãe, perguntou enquanto baixava sua xícara de café para me encarar. ─ Você está muito pálida.

Claro, eu não saio de casa.

─ Deve ser impressão sua, mamãe ─ Falei em um timbre baixo e estiquei meu braço pra pegar uma única fatia de pão. ─ Eu estou bem.

Ela murmura algo e novamente se concentra em seu café.

Mastigo aquele pão, o sentido descer seco pela minha garganta e quase o colocando para fora novamente. De fato, não estava com um pingo de fome.

─ Acrescente no seu horário: tomar um banho de sol às oito e meia, todo dia depois do café. Começando hoje. ─ Ela ordenou.

─ Sim, senhora. ─ Assenti com a cabeça engolindo totalmente o pão, mas não me retirei da mesa.

─ Com licença, mas você foi dormir que horas, aliás? ─ Daisy pronunciou.

─ Cedo, como sempre. ─ Respondi.

─ Cedo que horas? ─ Ela insistiu.

De verdade, eu havia ido dormir cedo ontem à noite depois da discussão que tivemos. Por um momento havia me esquecido, logo senti meu estômago embrulhar e ameaçar expulsar as migalhas de pão que eu havia ingerido.

─ Bom... Eu acordei algumas vezes devido aos barulhos que estavam acontecendo do lado de fora da casa. Então eu acordava assustada e voltava a dormir...

─ É verdade ─ Koji se manifestou. ─ A noite foi turbulenta, talvez fossem alguns guaxinins encrenqueiros.

─ Então vamos torcer para que isto não se repita. ─ Daisy disse por último e eu assenti com a cabeça.

Meu pai era calado, ele costuma se concentrar mais em comer do que conversar. Diferente da minha mãe que quando cisma com algo, vai até o fim.

─ Acho que está na hora de eu ir tomar o meu banho de sol... ─ Levantei da mesa. ─ Obrigada e com licença.

Por pouco não havia vomitado, eu vi a minha vida passar diante dos meus olhos naquele momento que Daisy falou sobre dormir, não que tivesse alguma relação, eu só temia que ela abrisse o bico sobre o que aconteceu ontem antes do jantar.

Fui até o bebedouro e andei até o meu quarto como um copo d'água cheio em mãos. Afasto a porta de vidro que dá acesso à minha varanda particular e fico por lá, recebendo os raios solares.

🌱 presente . . . . Ꮺ

Eu me encontrava descendo as escadas novamente e minha família ainda estava reunida na mesa.

─ Aonde vai, mocinha? ─ Daisy questiona.

─ Lá para fora... ─ Falei calçando os sapatos. ─ Acho que vou aproveitar e andar um pouco pelo quintal. O que acha?

Minha mãe pareceu feliz com a ideia e assentiu com a cabeça.

─ Certo, não demore muito, filhota. ─ Ela disse e eu abri a porta já com aquele destino em mente.

Olhei para a janela de casa na tentativa de ver se alguém estava me espiando e visto que não, não havia ninguém, abri o portão de ferro no maior silêncio que pude e caminhei até o local onde eu acreditava estar o estranho objeto.

Algumas pessoas estavam caminhando com suas roupas de ginástica e outras pedalavam alegremente. O meu bairro é muito familiar, pouco perigoso e é localizado ─ digamos assim ─ na parte nobre da cidade.

Eu olhava por todos os cantos que eu achava que podia estar o objeto, mas não havia nada. Eram apenas sacos de lixo como eu suspeitava, por um lado eu suspirei aliviada porque no final das contas não se tratava de um corpo ou algo do tipo. Rolei os calcanhares para voltar pra casa e percebo de canto de olho um lugar que eu ainda não havia reparado.

Ao passar calmamente por lá, minha visão é preenchida com a silhueta familiar que eu havia visto mais cedo. A figura se encontrava no final do beco e estava imóvel.

Ok talvez agora seja realmente um corpo morto.

O que eu devo fazer? Me aproximar? Chamar a polícia? Sair daqui?

Minhas pernas tremiam de medo ou de ansiedade, quem podia saber? A escuridão do beco não me permitia ver algo além de sombras e mais sombras.

Qualquer coisa eu posso usar a minha individualidade para me defender, certo? Não seria contra as leis... Mas e se as autoridades começarem a se questionar o porquê de uma garota estar entrando em um beco sozinha às oito da manhã? Eu não teria escapatória e muito menos pontos ao meu favor.

Droga, você pensa demais. Vá logo de uma vez.

Me senti desafiada por mim mesma e já em uma leve posição de batalha coloquei meu primeiro pé para dentro do beco e para a minha surpresa a figura deixa de ser apenas sombras e passa a ter uma feição familiar.

─ Hawks? ─ Sussurrei ao reconhecer aqueles cabelos loiros bagunçados e o seu rosto, que estava com algumas feridas leves.

Ele estava depenado, é meio engraçado falar isso mas é a verdade, suas asas não estavam tão visíveis como de costume, o que me fez pensar que ele estava imóvel justamente por isso. Seu rosto mantinha uma expressão tensa e seus óculos estavam quebrados. Não havia muito sangue exposto mas acredito que não deixava de ser uma situação preocupante.

Me aproximei dele e fiquei de joelhos para ficar justa ao seu tamanho naquele estado. Nossos rostos estavam próximos e, mesmo que com receio, passei a mão na sua testa e a guiei até a sua franja na tentativa de tirar os fios loiros que cobriam o seu rosto.

Ardia em febre.

Ele havia se mexido e o susto me fez tirar as mãos de perto dele.

Então o guaxinim na verdade era o Hawks. Que engraçado.

Mas afinal, por que ele ainda estava ali? E o que eu poderia fazer para ajudá-lo?

Minha casa fica há apenas alguns metros daqui e se eu...? Tive esse pensamento intercalando o olhar entre minha residência e o rapaz ferido na minha frente.

Uma ideia muito arriscada veio em minha mente agora, mas eu não poderia hesitar. Precisava ajudá-lo.

✔| 𝓐 𝓦𝐇𝐎𝐋𝐄  𝓝𝐄𝐖  𝓦𝐎𝐑𝐋𝐃 ‹𝟹 hawks.Onde histórias criam vida. Descubra agora