o vento do leste

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— Boa tarde, Justin! — cumprimentou nominalmente Florence, uma baixinha simpática e espevitada, recepcionista do Val’s Restaurant and Lounge, habituada à assídua frequência dos Thompson no estabelecimento, recebendo um sorriso como resposta. Ao perceber que ele estava acompanhado, estendeu a saudação ao outro cliente: — Boa tarde! Sejam bem-vindos! Vocês querem uma mesa?

— Não! — precipitou-se Gabriel, encabulado. De imediato, recebeu um olhar meio sarcástico, meio interrogativo de Justin. Tratou de emendar: — Digo, queremos, sim. Mas não estamos juntos...

— Como sempre, o restaurante está lotado nesse horário — disse Justin, percorrendo com os olhos as mesas ocupadas em seu campo de visão.

— Me perdoem, mas no momento nós só temos uma mesa disponível — revelou Florence, em seu rápido raciocínio.

     Gabriel e Justin entreolharam-se. Havia no ar um misto de contentamento, medo e desejo. O destino, por sua irrefutável existência, exibia-se patente ao delinear aquele reencontro e agora parecia dominar todos os movimentos daquele cenário, como que os conduzindo à aproximação.

— Por favor, pode ficar com a mesa — disse Gabriel, em genuína civilidade, mas tomado em seu íntimo pela expectativa de que sua oferta fosse negada.

— Não. De forma alguma — rejeitou Justin, coração à boca e mãos metidas nos bolsos da calça jeans para esconder o visível tiritar e aquecê-las, geladas pelo suor que vertiam sem cessar. — Fique você com a mesa — desviou o olhar para baixo e depois para a grande porta de saída.

— Não se preocupe. Eu posso comer em outro lugar — insistiu Gabriel naquela falaciosa fleuma.

     Sagaz observadora, Florence compreendeu que era necessário tomar alguma medida para solucionar aquele impasse e abrir um novo flanco capaz de aliviar o visível falso mal-estar.

— Você é novo aqui na cidade, não é mesmo? — questionou Florence, certa da resposta que receberia, não apenas pelo inglês carregado, mas pela aparência daquele estrangeiro.

— Sim. Estou passeando — revelou Gabriel, entre o chiste da recepcionista e o olhar atento de Justin. — Vim conhecer Holden por indicação de uma amiga. Vou passar o final de semana. Acabei de chegar. Ela também me sugeriu parar aqui para comer. Disse que vocês têm um salmão fantástico!

— Espero que goste da nossa pequena cidade... — Justin emanou um sorriso brando, pacífico. “Ele vai passar o final de semana aqui!”, era o que realmente dizia seu pensamento,em festejo.

— Tenho certeza de que você vai gostar! — afirmou Florence, categórica.

— Então, já que é sua primeira vez, por favor, fique com a mesa — insistiu Justin, já com um tom de voz abrandado.

— De jeito nenhum! Eu posso esperar vagar outra...

— Por que vocês não dividem a mesa? — interveio a recepcionista, certa de que, se não o fizesse, a querela poderia ser prorrogada, desnecessariamente, por longo tempo. — Não é mais simples assim?! Algum problema pra vocês? — E continuou, assertiva: — Assim, Justin, você pode fazer companhia e apresentar a cidade ao... ao...

— Gabriel. Meu nome é Gabriel.

— Ao Gabriel — concluiu, estendendo a mão em cumprimento. — Meu nome é Florence. É um prazer conhecê-lo. E seja muito bem-vindo a Holden e ao Val’s Restaurant!

— Obrigado. O prazer é todo meu — sorriu, cumprimentando a moça. Virou-se para Justin e propôs um desfecho: — Bom, por mim, podemos dividir a mesa. Isso se você não se incomodar.

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