obsolescência planejada

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     O final de 2009 determinou alguns caminhos importantes na vida da família Thompson.

Enquanto as folhas amareladas davam lugar à fina camada de neve, a chegada de Gabriel

parecia aquecer as almas e acalmar os ânimos. Uma pessoa pode transformar a vida de todo

um grupo. Na maioria das vezes, basta uma ponte para que muitos atravessem com

tranquilidade as águas turvas. Consagrava-se a real sensação de que um novo tempo se

descortinava aos Thompson. Tudo parecia diferente.

     No entanto, muitas vezes corremos o risco de estar diante de uma espécie de obsolescência

planejada. No universo capitalista, esse é o comportamento adotado por algumas empresas ao

projetar, deliberadamente, produtos que em tese deveriam ser duráveis, mas que são criados

para deixar de funcionar em um período de tempo calculado. Suas origens remontam à época

da Grande Depressão, quando alguns perceberam nesse truque uma forma eficaz de

movimentar a economia, pressionando consumidores a compras sucessivas de produtos com

validade limitada.

     A chegada de 2010 acabou colocando em xeque muitas certezas e revolvendo as águas

aparentemente calmas desse lago familiar. O primeiro problema era evidente: apresentar

Matthew aos Thompson.

— Gabe, eu ainda não me conformo! — dizia Catherine ao telefone. — V ocê não ter

passado o Natal conosco foi imperdoável!

— Cathy, eu não tinha como sair do UMass naqueles dias. Meus plantões caíram justamente

no Natal e no Réveillon. Eu não tinha como ir... — Gabriel já contara essa história diversas

vezes, mas sua sogra parecia não cansar de cobrar-lhe.

— Há algo errado entre você e o Justin? Você pode me dizer. Se eu puder ajudar...

— Não. Claro que não! — ele sabia que havia sim uma questão em curso, mas tinha razões

suficientes para não dividi-la com os Thompson. — Fique tranquila, Cathy! O Justin ficou um

pouco chateado com a minha escala nas festas de fim de ano, mas já está tudo bem!

— E quando vamos nos ver novamente? Que tal outro final de semana em Pine Hill?

— Eu adoraria! Mas aquilo lá deve estar congelando!

— É justamente por isso que eu adoro o inverno lá! Obriga-nos a ficar aconchegados dentro

de casa! — Cathy ria de suas próprias teorias.

— Bom, hoje ainda é quarta-feira. Podemos tentar no sábado, o que você acha? — antes que

Gabriel tivesse uma resposta, o bip da chamada em espera anunciava que Justin estava

ligando. — Cathy, podemos nos falar mais tarde? Justin está me ligando.

— Claro, meu querido! Vamos combinar o final de semana! Tchau!

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