Epílogo

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Por muitos anos, fábulas e canções foram contadas a respeito da Rainha Destinada. Sobre meu reino, minhas guerras e minhas grandes ações.

Um trono que não tinha espaço para dois, diziam. Mas como a maioria dessas histórias é aumentada ou falsa, posso dizer, com certeza que meu trono foi não apenas meu, mas de todos que um dia me amaram. Ao longo do meu reinado, amei, como amei meu príncipe gelado, outras duas pessoas: Orual e Sirene. Mas poucas das histórias contaram sobre meus amores e amantes.

Cheguei a rir de algumas das cantigas, que dobravam ou triplicaram a verdade, alguns diziam que eu era até mesmo a reencarnação de Arret. Alguns diziam que meus poderes cresceram quando engoli os deuses no final da batalha, outros contavam que eu os devolvi mas jamais perdi minha glória.

As histórias se misturavam às de outras rainhas guerreiras do passado, principalmente ao sul onde elas pareciam não passar de contos e lendas. Diziam sobre eu ter liderado grandes exércitos e matado mais do que a espada do melhor general. Mas na verdade, só lutei em outras três guerras no início do meu reinado, coisas como pequenas invasões e insurgências de poder.

Como consequência, para os reinos de fora, me tornei algo misterioso e assustador. Mas por dentro das minhas próprias terras, as pessoas sabiam a verdade.

Antes que meu reinado completasse um ano, restituí os velhos instrutores da Elite, que haviam sobrado. Lince se tornara a capitã de guerra e me jurou que tornaria nosso exército uma força que não seria movida pelo medo, como era nos meus tempos de criança. Sob com aquele olhar felino dela, duvido que alguém questionaria suas ordens.

As vilas foram reconstruídas, aos poucos. Participei de cada momento, ajudei em todas as partes do meu país. Iniciei uma organização de apoio psicológico à todos que foram vítimas da Repersonalização, até que as pessoas pudessem voltar para suas vidas normais, dei apoio e recursos. Abri escolas, centros de música e arte, para que esses fossem frequentados muito antes dos alojamentos se exército. Mandei destruir o Coliseu em Évbad, no qual Josh perdera a asa. No lugar, abri uma imensa biblioteca, onde qualquer um pudesse frequentar sob um juramento de proteção à sabedoria. Nobres e pessoas comuns de diversos cantos do mundo vinham para frequentar e trazer livros à Biblioteca Atswa. A aliança entre mim e Ohnin continuou. Agora com acordos de livre comércio. Eu adorava visitar O Arquipélago da Morte, por causa das praias de areia negra que passei a amar e apreciar e claro, por causa da minha amiga, a minha outra face da moeda, que se tornou importante pra mim. Ohnin adora se gabar que havia visto meu futuro antes de todos.

Agora que Évbad, Mondian e Arnlev se tornaram uma só: Waydah, Os Três Reinos Unidos, mandei que derrubassem os enormes muros de Mondian, revisei todas as leis escritas do reino, fiz pontos de travessia segura no Mar Congelado, construí novas cidades e vilas para aqueles que haviam perdido suas famílias, e cisternas para que jamais passassem por anos de seca. Me tornei conhecedora de agricultura, para que comandasse melhor a plantação em nossas terras, e me certificasse de que nenhuma criança passaria fome enquanto a coroa estivesse sobre minha cabeça e muito depois que fosse passada. Nunca mandei que fossem reconstruidos os palácios das rainhas gêmeas, eles eram um símbolo de um passado sombrio e foram queimados por quem mais permanecera nas sombras. Vivi no Templo ao invés de construir um novo castelo.

E no fim de um ano, quando tudo estava caminhando para os conformes, me sentei a beira do túmulo de Wei-Wei.

Havia cumprido minha promessa, e contei a ele e a Kadash. Passei a fazer isso todos os anos, às vezes, levava alguém comigo.

No primeiro ano, fiz o casamento das minhas mais queridas amigas, Linda e Nona, dois vestidos de noiva e uma festa que durou cinco dias. No segundo ano, Josh e Charslie, um casamento simples, mas uma das coisas mais lindas que já vi, não sabia que eles dançavam. Eles viveram em minha corte por muitos anos antes de saírem à viajar pelo mundo, às vezes os acompanhei, sempre voltavam para a felicidade do meu coração. Marco jamais se casou, mas foi o melhor conselheiro que uma rainha poderia ter.

Waydah agora era um reino mantido e educado quase ao ponto de governar a si mesmo.

Na sacada do meu quarto, observo as estrelas e as luzes do meu reino, ambos se estendendo até o horizonte e além. Arton resmunga alto como um trovão quando tropeço na cauda enorme e peluda, dou uma risada sabendo que o barulho com certeza assustou a todos nos arredores. Eu acordei com o alvorecer, como passara a fazer, talvez para admirar a coisa bonita que meu mundo havia se tornado.

Respiro o ar da manhã, com o cheiro de chuva da primavera. Às vezes, me pego pensando em todas as coisas que resisti e tudo o que meu povo passou. Meu olho que foi esfaqueado na luta, pisca nesses pensamentos como um membro fantasma, uma das minhas esmeraldas se foi como um lembrete constante do que foi perdido. A cicatriz não me deixa menos linda, é o que ouço em voz baixa sempre que deito na cama.

Hoje, como todos os dias, meu coração está inquieto e cheio de alegria, deslizo para as escadas, para o sol. Amando esta parte solitária do meu dia, quando posso sentir a brisa fria no rosto soprando minhas lágrimas pra longe, e observar a vastidão do mundo. O Coração (agora de Waydah) bate como uma canção antiga e doce, que acaricia os ouvidos como as mãos de uma mãe. A sensação e o ritmo.

Eu não tenho mais medo e nem estou sozinha. A culpa e a dor me abandonaram.

O que resta é tudo o que eu mais queria e precisava. O meu destino e meu lar.

Corro para os braços do delicioso café da manhã que me aguarda na cozinha. De longe ouço as risadas que acompanham o cheiro quente doce. Magia e amor fazem meu coração bater mais um dia.

As Crônicas de Rayrah Scarlett - Esperança Em Arnlev [RETIRADA EM 25/08/22]Onde histórias criam vida. Descubra agora