VI

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Robert estava certo: Alejandro realmente era um homem de sorte.

Pouco tempo depois de ter sido deixado sozinho no salão, Alejandro percebeu que empregados iam e vinham aos montes, acendendo velas e as dispondo por todo o ambiente, removendo os panos pretos que cobriam as janelas, trocando toalhas de mesa e substituindo garrafas vazias por exemplares cheios.

Os vitrais, agora descobertos, revelavam as cores da noite se infiltrando suavemente pelo ambiente. As portas estavam oficialmente abertas.

Conforme a noite caía, sujeitos dos mais variados ares lotavam o salão. Alguns se esgueiravam sutilmente cassino adentro enquanto outros anunciavam sua entrada de forma espalhafatosa. Mulheres vestidas, pelo que Alejandro calculou — com base nas análises sobre moda que havia feito andando pela cidade — indecentemente e homens que pareciam ter saído do elenco de uma peça de teatro bastante alegórica. As cores da noite pareciam ser mais vibrantes, e as vozes, altas na mesma proporção.

À medida que bebidas e mais bebidas passavam a ocupar as mesas, o sutil burburinho se transformava num alto falatório. Algumas vozes eram indistinguíveis no ambiente barulhento, enquanto outras se sobrepunham até mesmo aos eventuais urros nas mesas de jogos, como os guinchos constantes de uma mulher de meia idade irritantemente estridente.

Num súbito impulso, Alejandro se levantou de sua cadeira e andou pelo salão, sentindo-se completamente deslocado, como se toda a coragem que o havia tomado bruscamente o tivesse deixado com a mesma rapidez. Era como se todos os olhos estivessem voltados a sua pessoa, mas a verdade é que ninguém sequer havia notado sua presença. Com as pernas levemente bambas, tomou um assento à frente do bar que se prolongava de uma ponta à outra do salão e ali ficou, como se calculando seu próximo movimento.

Numa mesa no extremo oposto do salão, um grupo de jovens soltava gargalhadas incessantemente enquanto um deles, ao que parecia, contava uma história hilária. Logo ao  lado, homens ligeiramente mais velhos, sentados – talvez – muito confortavelmente, desembolsavam bolos de dinheiro e os entregavam para mulheres vestidas escandalosamente, as quais se escoravam nos sujeitos e sorriam à vista dos montantes que lhes eram oferecidos com os olhos brilhantes; Alejandro desviou os olhos dessa mesa. Mais à esquerda, mesas de jogo cobertas por toalhas de veludo concentravam boa parte do barulho no salão. Em uma das mesas, um grupo de senhores fumando cigarros murmuravam entre si um pouco mais alto do que se deram conta com expressões sérias num jogo de roleta. Em outra, um grupo maior direcionava sua atenção a um jogo de cartas com fichas circulares; a atmosfera, no entanto, era mais leve ali: jovens segurando taças de champanhe alternavam entre momentos de concentração silenciosa e de gargalhadas estrondosas que explodiam esporadicamente. Na última mesa que observou, dados rolavam de forma curiosa, contudo não havia cartas ou qualquer outro item acompanhando o jogo. A dinâmica das jogadas capturou sua atenção de modo que Alejandro nem se deu o trabalho de reparar nos jogadores que lançavam as peças.

— Alejandro Estravados, estou certa? — perguntou uma voz melódica, antes que ele se virasse em um sobressalto.

Uma jovem de olhos escuros, que não poderia ter mais de dezenove anos, sorria em sua direção. Ela curiosamente também vestia calças e não parecia se importar com os fios de cabelo castanho que espetavam para fora de seu coque mal feito.

— Sim?

— Estava ansiosa para te conhecer. Robert me contou bastante sobre você... — Como alguém que havia acabado de conhecer poderia saber tanto sobre ele? E ainda por cima ter comunicado tudo à moça no intervalo de tempo entre o instante em que tinha deixado o salão e este momento? Não havia se passado mais de vinte minutos.

— Alejandro? — ela chamou, estendendo uma mão na frente de seu rosto.

— Perdão, senhorita. Temo não tê-la escutado. Eu estava...

O Cisne do SubmundoOnde histórias criam vida. Descubra agora