sette

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Nem sempre me senti uma pessoa confiante, nem achava que tinha a capacidade para me assumir como uma mulher independente e com as responsabilidades que tenho em cima dos meus ombros. Comecei a criar o meu sonho aos 24 anos quando, numa aula de desenho abstrato, desenhei o meu primeiro par de sapatos. Excêntricos, com demasiados brilhos e pedras, mas naquele desenho estava a representação daquilo que passou a ser a minha grande paixão.

Vivi dias muito longos, dias sem tempo para comer ou dormir, mas hoje sei que dentro do pior, aqueles foram dias felizes.

- Em que é que pensas? – respirei fundo, olhando-o. Estamos sentados num muro, com o Coliseu mesmo ao nosso lado e, surpreendentemente, conseguimos estar sozinhos, sem turistas a quererem tirar fotos ao monumento.

- Desculpa – acho que fiquei parada demasiado tempo a pensar – já há algum tempo que não parava assim, para ter tempo de pensar.

- Eu sabia que Roma te ia fazer bem – ele riu-se, agarrando a minha mão.

- Tu sabes muitas coisas – pus a minha mão por cima da dele, olhando à nossa volta ao estranhar estar mesmo tudo muito sossegado – é tão estranho isto estar assim muito sossegado…

- Cada vez que aqui venho tenho sempre essa sorte – ele olhava-me e é-me difícil perceber o que lhe possa estar a passar pela cabeça.

- Que foi?

- Porque é que não queres uma relação? – até era de estranhar ele, até agora, ainda não ter feito esta pergunta – não pode ser só por causa do trabalho…

- A pergunta que vale milhões – larguei a mão dele, sentindo uma enorme vontade de ser honesta com ele neste momento – nos últimos quatro anos tornou-se a melhor desculpa que consigo dar às pessoas - levantei-me, virando-lhe costas e encarando o Coliseu - é claro que eu já imaginei ter um casamento, uma família minha… - claro que já. Há cinco anos atrás eu imaginei isso mesmo; voltei a virar-me para ele – mas para quê? Para ter noites em que durmo no escritório e não vejo ninguém da minha família? Para sofrer com desilusões atrás de desilusões? Vou apaixonar-me e, um dia qualquer, a pessoa decidir que não precisa mais de mim? – parei de falar ao perceber que estou a falar daquilo que me aconteceu e que não quero, de todo, que o Giulio compreenda que é ao meu passado que estou a fazer referência.

- Afinal há aí um desgosto de amor – não me questionava, fazia aquela afirmação com os seus olhos presos aos meus e uma grande dúvida estampada no rosto.

Não quero falar sobre o meu passado, mesmo que tenha acabado de o fazer. Sei que é assunto para uma longa conversa, mas com o qual eu não estou nada à vontade por me deixar completamente vulnerável.

- E que tal irmos até à Fontana? – coloquei a minha mão à frente da testa, estando a ficar encadeada com o sol.

- Vamos – ele levantou-se, esticando os seus braços na minha direção. Coloquei as minhas mãos nos ombros dele, ao mesmo tempo que ele rodeou as minhas pernas com os seus braços e me fez sair daquele muro.

Assim que me colocou no chão, deu-me um beijo na testa e começámos a andar em direção da Fontana di Trevi. Era, ainda, uma caminhada longa mas que se fazia facilmente.

- Em relação a amanhã – olhei para ele conforme íamos andando – almoças comigo e com o meu irmão?

- Não sei se será boa ideia, Giulio - detive-me um pouco, fazendo com que ele parasse e me olhasse – é um fim de semana sem compromissos…

- Estou a ver – aproximou-se de mim, cruzando os braços – podemos abrir uma exceção a partir de agora - ri-me, aproximando-me ainda mais dele.

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