Na sala de aula

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Ochako o encara. Dá pra ver seu rosto no reflexo dos olhos heterocromáticos, que a encaram de volta com intensidade.

— Eu não sei de mais nada sobre mim além do fato que te amo.

Ele suspira, como se estivesse se segurando para não perder a paciência.

— De novo.

— Sério?

— Sim, você está hesitante. Existia alguma indicação no roteiro de que era pra você hesitar?

— Não, mas-

— Então vamos de novo. Fale com certeza, você está diante de Henry, a única pista que tem sobre quem você era antes do acidente, por que está falando com ele como se tivesse medo?

— Não é medo, é-

Constrangimento. Porque falar "eu te amo", mesmo que seja numa peça de teatro, ou melhor, em um ensaio para tal peça, mesmo que não signifique nada, ainda é constrangedor pelo simples fato de que o Todoroki é muito... ele é... um tanto... bonito. E ter um garoto bonito encarando-a lhe faz sentir anormalmente consciente de si mesma, de sua aparência, expressões, linguagem corporal, tudo parece estar sendo minuciosamente estudado por esse par de olhos, e Ochako sente que queria ser um material de estudo melhor, por algum motivo.

Ela não perdeu tempo e, assim que fechou a rota da Tsu, — com 100% também, sabe-se lá de onde veio o resto da porcentagem necessária — a garota decidiu qual seria sua próxima rota: o senpai meio frio do clube de teatro. Ochako se sente muito esquisita perto dele, mas entre esse garoto e o Monoma, bom... a escolha é óbvia. A rota da Tsu foi cansativa, ela não está pronta para aguentar mais grosserias gratuitas, e o loiro basicamente é composto disso. O Todoroki também não é lá o cara mais cortês do mundo, mas dá pra manter uma conversa com ele sem querer revirar os olhos constantemente.

Na verdade, por mais esquisita que se sinta perto dele, é surpreendente o quanto interagir com esse garoto pode ser confortável, às vezes. Dos pretendentes, é com quem ela menos se preocupa em escolher as palavras por medo da intimidade cair. Ela está em 36% há um bom tempo, mas é bem tranquilo trocar ideias com ele, quase como... conversar com o Todoroki original, que às vezes é meio rude sem querer ou perceber, mas mostra genuíno interesse em ouvi-la e um grande respeito por tudo que ela tem a dizer, mesmo que não concorde.

Então se é pra sofrer, que seja mais pra frente. Ochako deixará o Monoma por último e se preparará mentalmente para não querer esganá-lo a cada "ora, ora" ou sorriso ladino que ele solta. O Todoroki pode ser cansativo também, mas... dos males o menor, ou algo assim.

— Você não tem problema nenhum em dizer o que pensa quando está fora do palco, por que seria diferente em cima dele?

— Porque é completamente diferente! Tem essas luzes, vai ter... vai ter uma plateia, e você-

— Eu?

— Você fica me olhando!

— Eu tenho que te olhar.

— Sim, mas você fica me olhando com- não sei!

— Ok. — ele a segura pelos ombros, fazendo Ochako prender a respiração por um segundo, antes que possa questioná-lo, ele a vira para ficar de costas pra ele — Sua fala.

— M-mas aí não-

— Olha pra frente. Sua fala.

Ela se segura pra não respirar fundo em frustração e olha pra frente, notando o Bakugou apoiado contra a parede, como ele sempre fica quando está cumprindo suas funções no clube de teatro — as quais não são nenhumas quando os atores estão passando roteiro. E mesmo que não queira ou nem saiba porquê, a lembrança do momento no festival em que agiu sem pensar e tocou no rosto dele volta com força plena à sua memória. Por que ela fez aquilo tão sem pensar? Por que não consegue esquecer a textura da pele dele — surpreendentemente macia — contra a ponta de seus dedos? Por que achou a reação dele tão... adorável?

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