Na saída do clube

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 — Eu não sei de mais nada sobre mim além do fato que te amo. — ela diz a fala pelo que deve ser a quarta vez hoje.

— De novo. — o Todoroki ordena pela quinta vez.

— Eu não sei-

— Para. — ele a einterrompe — O que é isso?

— O quê?

— Sua postura. Ajeite-se.

Ochako respira fundo e mantém a coluna ereta.

— Melhor?

— Quase nada.

— Mas...

— Essa é você agora. — ele a afasta um pouco e faz uma imitação que com certeza a faria rir se não estivesse tão pouco interessada nisso — Não há necessidade de tensionar tanto os ombros. Você está diante do homem que ama, aquele que você acredita ter todas as respostas para os mistérios de quem você era antes do acidente. Olhe para esse homem com devoção e ardor. — é um tanto irônico que ele diga algo tão apaixonado enquanto mantém essa expressão neutra.

Ochako sente que sua habilidade em atuação, antes mínima, agora é praticamente nula. Ela decorou o texto da tal peça de cabo a rabo, sabe não só suas falas, como as do Todoroki e de alguns personagens com papéis menores também, lembra-se de todas as indicações de quando andar, levantar, sentar e tudo mais, mas... está cada vez mais incapaz de interpretar esse texto com a atuação que pede.

Vai ver é a inquietação diante da cena estranha que viu há alguns dias envolvendo sua assistente no jogo, Ochako revisitou essa lembrança diversas vezes em busca de qualquer sinal que aquele bloco de concreto teria sido o responsável pelo sangramento da garota, mas não foi, e ela tem certeza disso. Então... o que houve? A morena tentou mandar mensagens que não envolvessem querer saber sobre seu atual status com os pretendentes, mas todas retornaram, como se o destinatário não existisse. E quando a chamou, não para perguntar nada sobre o jogo, e sim sobre ela, a garota de marias chiquinhas apareceu com seu costumeiro sorriso, dando respostas prontas como se nem estivesse ouvindo os questionamentos de Ochako sobre ela estar bem e sobre o que aconteceu antes.

Pode ser também porque ela está de volta ao clube de teatro, o que significa inevitavelmente ver o Bakugou. Ela chegou a se esbarrar com ele, não literalmente, nos outros dias, mas ela ainda estava na rota do Monoma, então o clube de teatro não era prioridade e a própria não estava permanecendo ali além do necessário.

Agora é diferente, Ochako tem que estar aqui para se aproximar do Todoroki, e esse é o único lugar em que vê o Bakugou sem ter que procurá-lo, ou ele ter que procurá-la — não que qualquer uma das duas coisas fosse acontecer. Ele está lá, no canto em que costuma ficar enquanto ajeita as luzes ou puxa as cortinas. Seus olhos vermelhos acompanham o que se desenrola no espaço num misto de interesse e desatenção, e ela nunca se sentiu tão incomodada em não saber o que ele pode estar pensando.

— Ok... me desculpa.

— Está dormindo bem? Você parece exausta. — pode tanto ser uma constatação preocupada quanto um apontamento carregado de julgamento, não dá pra saber com ele.

— Sim, eu só... vamos de novo. — ela limpa a garganta e se inclina para a frente, buscando seu próprio reflexo nos olhos heterocromáticos. Ochako sente que se o encarar como se não estivesse vendo-o, poderá entregar sua fala com mais naturalidade — Eu não sei de mais nada sobre mim além do fato que... te amo.

Silêncio. E Ochako sente como se seu rosto estivesse tremendo, pronto para ceder em vergonha de dizer algo assim para um garoto que tem essa cara extremamente agradável ao olhar.

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