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O sol entrava impertinente pelas fendas da veneziana, despertando-me daquela doce dormência de semi-sono.
Não conseguia entender como podia estar tão cansada, apesar de ter dormido o dia todo no dia anterior.
Vesti-me devagar e com relutância desci as escadas.
Eram nove horas, o cheiro de café inundou toda a casa.
Zach estava saindo de casa para trabalhar.
Entrei na cozinha com a intenção de tomar o desjejum, embora quase nunca o fizesse, mas não havia comido no dia anterior.
-Bom Dia.  -
Sebastian estava sentado à mesa, com o cabelo despenteado e o pijama ainda vestido.  Ele comeu seu copo de leite e cereal com fome e, assim que me viu, correu até mim.
Eu o agarrei e girei em torno de mim como sempre fazia.
-Você dormiu bem?  -
-Ainda!  Deixe-me girar de novo!  -
Eu o satisfiz, até que Jaz quebrou aquele momento de paz.
- Ei, senhor.  Terminar o café da manhã, temos que ir ao Robin.  -
Sebastian bufou e voltou ao seu café da manhã.
Peguei uma xícara cheia de café e um dos biscoitos de mirtilo na mesa.
Fiquei perto da pia, sentindo o olhar gelado de Jaz na minha figura.
- Esse é o seu café da manhã?  -
Eu fiz uma careta.  Desde quando ela se preocupa com minha dieta?
- Eu não estou com fome.  -
Na verdade, eu queria, mas dividir o mesmo quarto com Jaz era constrangedor e perigoso, então decidi parar e comprar algo.
Ele olhou para mim com olhos duvidosos, mastigando lentamente seu biscoito integral.
-Ontem você não almoçou nem jantou.  Como é possível que você não esteja com fome?  -
Dei de ombros.
Mas o que ela se importa?  Eu não matei ninguém.  EU.
-Você gosta de alguém?  -
O café passou por mim e comecei a tossir.
-Que?  -
-Aquele garoto alto?  Aquele ... Qual é o nome dele ... Jesse?  -
-Não, claro que não!  -
-Eu não nasci ontem Kira.  Eu também era jovem.  -
A discussão tomava um rumo absurdo.  Eu tive que sair de lá.
-Você está finalmente perdendo peso e ... olhe para você ... você está usando roupas mais normais.  -
Que diabos ele estava tagarelando?
-Mais roupas normais?  -
-Você nunca usou jeans na vida, Kira.  -
- Eu sou apenas um par de jeans ... o que isso significa?  -
-Você quer se vestir melhor para impressioná-lo.  É normal.  -
Ela certamente não estava.
Coloquei aquele jeans porque foi a primeira coisa que encontrei no armário, certamente não para conquistar alguém.
- Bem ... estou indo.  -
sai correndo da cozinha antes de me contar mais truques de amor.
Caminhar até a casa de Jesse era inimaginável, então tive que pegar o ônibus.
Mandei uma mensagem para avisá-lo da minha chegada, mas ele não me respondeu.
Cheguei na casa dele e toquei a campainha várias vezes.
Fiquei lá fora esperando um pouco, com a intenção de ir para casa, quando vi Mase no jardim dos fundos.
-Mas se!  -
O tio de Jesse ficou surpreso e retornou minha saudação e então se juntou a mim
-Olá Kira.  Tudo bom?  Jesse não se abriu com você?  -
- Já estou aqui há algum tempo.  Achei que não havia.  -
Mase revirou os olhos e balançou a cabeça.  -Ele voltou tarde, como sempre.  Agora eu abro você.  -
Ele entrou na casa e abriu o portão da garagem.
Subi as escadas, onde ficava o quarto dele.
Bati na madeira da porta repetidamente, cada vez mais forte.
- Jesse levanta essa bunda mole!  -
Bati palmas com a palma da minha mão quando ela quase colidiu com o rosto sonolento de Jesse.
-Kira ... -
A sala atrás dele mergulhou na escuridão.  Ele vestia apenas uma boxer preta, um sinal de que provavelmente tinha acordado recentemente.
Uma garota apareceu imediatamente atrás dele.  Ela ficou ao lado dele e olhou para mim com curiosidade.
Ela usava apenas calcinha transparente, mas parecia completamente confortável.  Seu cabelo ruivo claro emoldurava seu pequeno rosto coberto de sardas muito claras.
Evidentemente, interrompi algo.
- Oh ... uh ... desculpe, estou-estou indo ... -
Eu rapidamente me virei para sair, mas Jesse agarrou meu pulso e me puxou para ele.
Eu involuntariamente esbarrei em seu peito nu e fiquei da mesma cor do cabelo da garota.
Afastei-me desconfortavelmente e até Jesse parecia um pouco envergonhado com toda a situação.
-Você não tem que sair.  - disse ele com firmeza.  -Vivienne, até outra hora ok?  -
A garota fixou os olhos em descrença.
-O que?  Você está me perseguindo?  -
- Se você quiser colocar assim ... -
Ela olhou para ele e caminhou firmemente de volta para o quarto escuro.
Eu me vesti rapidamente, calçando meus sapatos quando ele saiu.
- Eu te ligo!  -
-Você nem tem meu número, idiota!
Nem uma vez ela se virou enquanto subia as escadas para sair de casa.
- Mas ... Ele não aceitou muito bem.  - eu disse quando ouvimos a porta da frente bater violentamente.
Ele encolheu os ombros e franziu a testa.
-nah, ela já se esqueceu de mim.  Além disso, não foi tão bom.  -
- Seja o que for, você não deveria tê-la mandado embora.  Eu deveria ter avisado você antes de vir aqui.  -
-Kira.  - colocou as mãos no meu rosto.  -Quantas vezes eu já disse para você não se desculpar por nada.  -
- Verdade, sinto muito.  Não, quero dizer ... É verdade.  -
Jesse riu e me convidou para entrar na sala.
Ele levantou as cortinas, deixando entrar a luz ofuscante daquele sol de julho.
Ele usava uma camiseta verde grama e shorts de basquete que faziam suas pernas parecerem ainda mais finas.
Sentei-me na cadeira giratória da escrivaninha, porque sentar na cama desarrumada não parecia uma boa ideia.
-Como você está se sentindo?  -
-Boa.  Não foi minha primeira overdose.  -
Não me tranquilizou se foi isso que ele pensou.
-Vir jeans ... - disse ele olhando para minhas pernas.
Eu revirei meus olhos.  Era tão estranho eu estar vestindo uma peça simples de roupa?
-Sim, bem ... li outras páginas do diário.  -
Ele se aproximou e sentou-se na mesa cheia de roupas e objetos fúteis.
- Temos novidades?  -
-O homem com quem ela sente que mora no Condado de Hoover é um tabelião chamado Miles.  Isso é tudo que sei.  -
-É muito pouco.  Você trouxe o diário?  -
Ele acenou com a cabeça e abriu a bolsa de ombro para pegar o caderno preto.
Jesse começou a ler em voz alta.

Querido Diário,
Às vezes, gostaria de poder voltar àquele verão há oito anos.  Eu era muito jovem, mas me divertia tanto que me lembro de tudo com nitidez.
Essa tinha sido nossa última viagem.  Tínhamos ido para Santo Domingo, país de origem da mãe de papai.  Meus avós paternos moram aqui desde antes de meu pai nascer, mas ainda temos alguns parentes desconhecidos naquele lugar celestial.
Nunca vi nada mais bonito.  Foi maravilhoso, em minutos eu havia esquecido como era viver em Westerfield.  Férias perfeitas, jantares à beira-mar e muitas gargalhadas.  Papai era realmente um cara engraçado na época.
Mamãe estava ensolarada, ela sempre sorria e olhava para o papai com olhos sonhadores.
Esta é uma das poucas fotos da primeira.  Antes das tragédias.

Jesse me mostrou a foto encontrada no meio do diário.
Também me lembrei daquelas férias.  Fazíamos um todo verão e às vezes no Natal.  Eu me apaixonei por aquele lugar.  A foto retratou toda a família no mar.  Estávamos na água, Morgana estendeu a mão para o abdômen e eu ligeiramente mais abaixo, embora eu fosse maior que ela.  Eu usava óculos Hello Kitty e sorria para a câmera com um monte de suspensórios.
Austin estava segurando uma bola de futebol e parecia entediado, assim como agora.
Jas e Zach atrás de nós se abraçaram e sorriram felizes.
Eles eram tão despreocupados, tão bonitos.  Jaz parecia muito mais jovem, com cabelo descolorido pelo sol e um chapéu grande.
Zach estava ainda mais bronzeado do que agora, ainda com alguns fios de cabelo na cabeça.
Ninguém, vendo aquela foto, jamais teria imaginado o que estava por trás daqueles sorrisos.
-Que tragédias?  - Jesse perguntou.
E agora?  O que eu teria inventado?
Dei de ombros.  -Eu não sei.  Tem que ser subjetivo.  -
Eu esperava que ele não entendesse que eu estava mentindo.
-Você parecia uma família feliz.  -
-Sim ... -
Vendo que eu não queria falar sobre isso, ele continuou lendo.

querido Diário
Ontem ele veio me buscar tarde.  Fomos jantar em um restaurante na Walther Street.
Ele não parava de se desculpar pelo atraso de meia hora, mas eu disse a ele que não havia problema, não era uma tragédia.  Eu podia entender isso, ele tinha ido buscar o filho no treino de futebol.
Ele me disse que tem onze anos, mas não queria me contar mais.  Ele me contou um pouco sobre seu trabalho, embora eu honestamente não tenha entendido muito.  Ele tem seu próprio estúdio em uma mansão no condado de Hoover e passa a maior parte do dia nesse escritório.  Naquela noite, após o fantástico jantar de peixe, ele me deu um dos mais belos colares Swarovski que já vi.  É muito lindo, não consigo parar de olhar para ele.  Eu nunca deixo, eu sempre uso, exceto para ir para a escola.  Ninguém nunca me deu tal coisa.

Jesse fechou o diário e me olhou preocupado.
-Lembro desse colar.  Eu pensei que se ela comprasse, mesmo ela não sendo aquele tipo de joia cara.  Ele sempre o usava, até em casa.  Nós o víamos todos os dias, então ele parou de parecer estranho.  -
Jesse se levantou e começou a andar para frente e para trás pensando consigo mesmo.
Ele parou abruptamente e olhou para mim sorrindo.
- Somos tão estúpidos ... -
-Coisa?  -
-A solução está escrita aqui, Kira!  - disse ele segurando o diário.
-O que você está dizendo?  -
-Está escrito que ele é um notário e tem um escritório no Condado de Hoover.  É tão fácil!  -
-Eu não estou entendendo... -
-Todos os executivos importantes, mesmo notários, estão listados na lista telefônica.  E esse Miles, se for notário como afirma ser, certamente estará na lista.  Era tão óbvio!  -
Se Jesse estivesse certo, encontrar Miles seria brincadeira de criança.
A solução estava mesmo debaixo de nossos narizes e nunca percebemos.
Agora, uma luz de esperança se acendeu em nossos olhos.
Eu ainda poderia encontrar.
- Vamos pegar esse Miles.-

DOLLHOUSE - O diagnóstico || Tradução em português Onde histórias criam vida. Descubra agora