A coroa de prata

191 28 68
                                    

A fada voou a toda velocidade, de volta à fortaleza, ouvindo os estrondos consecutivos ficarem mais distantes. Sem ter noção se os três homens do reino conseguiram passar pela barricada, Kyu retornou à biblioteca, onde Eric estava a ler o Livro das Cerimônias apressadamente. Sua aflição não pôde ser curada quando o de cabelo laranja anunciou que o príncipe bastardo avançava contra o castelo. Suas asinhas batiam fazendo um som constante e nervoso. Os elfos ao redor observavam quietos e impassíveis, mantendo a aparência espectral ao aguardar novos pedidos.

O qareen fechou o livro, causando a poeira se dispersar no ar ao seu lado, e olhou para Juyeon, desejando processar tudo aquilo que tinha acabado de ler de uma forma não tão caótica quanto a que lhe ocorria. Juyeon o olhava de volta, um tanto preocupado e ingênuo; não dava tempo de explicar para ele, mas dava tempo pedir-lhe algo.

— Procure os homens que vieram com você. Peça ajuda novamente! Eu preciso encontrar a coroa agora — o azul turqueza dos olhos de Eric era de sincera apreensão e também de lástima por ter que se separar de Juyeon tão cedo após seu reencontro. O camponês sentia o mesmo e já estava nervoso demais para conseguir formular apenas uma pergunta para o qareen; tudo o que tinha de certeza era que confiava nele e devia a ele seus sentimentos e sua própria vida. Inclinou-se rapidamente para selar os lábios nos dele antes que pudesse se afastar com um dos elfos que se dispôs a mostrar a saída mais rápida para a floresta. Foi um beijo amargo pela preocupação que sentiam, mas não menos verdadeiro. Juyeon  percebeu o sentimento lhe perfurar como um espinho.

— Eu amo você, Eric — disse sem desgrudar a atenção dos olhos mágicos do mais novo  — fique bem. Por favor.

— Eu também te amo…

Eric sentiu como se parte da alma dele tivesse ido embora com o garoto alto quando ele empunhou a espada e saiu correndo pela porta da biblioteca, acompanhado pelo elfo. Ninguém havia dito aquelas palavras para si, nem seus pais adotivos, nem seus tios ou os colegas de moradia; nunca havia tempo o suficiente para que algo como aquilo viesse a ser dito, pois Eric estava sempre fugindo. Parecia sempre algo como uma parte oculta do livro de sua própria história. Uma parte oculta que Juyeon acabara de revelar e era a mais pura poesia.

Os olhos azuis do qareen umedeceram; ele suspirou, tentando não se levar pelo choro e lembrando da pequena parte oculta do livro. Três palavras apenas.

— Younghoon — pediu Eric ao elfo mais altivo ali — me leve até a coroa prateada.

Então ambos seguram em passos rápidos, atravessando aquele labirinto de pedra que era o castelo. Enquanto eles andavam entre a luz instantânea das tochas, mais elfos apareciam das sombras, todos com a mesma aparência fantasmagórica, esperando aqui e ali, encostados em colunas, na soleira das portas altas de madeira. Eric percebia seu destino se desenhando em sua frente conforme andava e recordava das informações do livro, ainda tão recentes em sua memória:

Eram dois clãs Qareen que habitavam aquele lugar antigamente. O primeiro, representado pelo símbolo circular que cada um possuía estampado no corpo, representava a maior parte dos antigos líderes e o segundo clã, representado pelo símbolo semelhante a uma meia-lua invertida, os mais habilidosos e dominantes da magia, em todas as suas formas. Pelo pouco que sabia sobre si mesmo, Eric inferiu que pertencia ao primeiro clã e que parte dele tinha sobrevivido com ele até então.

Os dois clãs faziam acordos entre si para eleger seus governantes, aqueles que comandariam o exército de elfos aprisionados. E a coroa era símbolo disso. Quando foi confeccionada após a guerra contra os elfos, o Primeiro Rei a colocou um feitiço que poderia deixar todos eles sob seu comando, fosse esse cruel ou não, pois nada seria questionado. Entretanto apenas um qareen poderia usá-la, eleito ou se fosse o último em seu território.

The CastleOnde histórias criam vida. Descubra agora