Correntes

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O elfo se sentou numa fenda na parede de rochas escuras da caverna e tocou o próprio cabelo, vaidoso. Eric não se surpreendia mais ao ver sua figura, cada vez mais realista ao estar ali, no mesmo sonho, pela terceira vez. A caverna tinha mais profundidade, o eco de sua voz se ouvia com mais clareza e dessa vez o qareen pôde notar correntes prateadas ao redor dos pés daquele ser esguio que nunca o deixava dormir na escuridão. Dessa vez ele sabia o porquê.

- O meu povo fez isso com o seu? - De repente as primeiras conversas que teve com o elfo fez sentido.

- Foi o preço que eles "pagaram", sim - Respondeu o elfo pálido, seus olhos amarelados nunca deixavam de impressionar. - Agora sabe sobre si mesmo... Estou surpreso.

- Eu não sei o que fazer... Isso não parece certo - Falava a respeito das correntes. Eric ouvia a própria voz baixa se misturar às gotas d'água que pingavam na escuridão ao redor.

- Quando o momento chegar, seu coração vai se revelar acima de qualquer dúvida. - O elfo fez uma pequena pausa, puxando um pouco para cima a túnica que vestia, olhando meio indiferente para os próprios pés acorrentados. Então pediu que o loiro se aproximasse de si - Nossos desejos cegos são como minha bela roupa que escondeu essas correntes. É preciso despir-se deles.

Então a figura pálida se inclinou, tomando o qareen pelos ombros com as mãos magras e sussurrou uma frase de três palavras em seu ouvido, numa voz tão baixa que poderia ser o mais importante dos segredos. Falou aquilo numa língua por ele desconhecida e Eric esqueceu de como soava assim que acordou. Também teve a ligeira impressão de que nunca mais veria o elfo em seus sonhos novamente; talvez pela maneira que ele o olhou, como quem se despede.

O loiro acordou no fim do dia sem muito ânimo, sabendo que não veria Juyeon por perto e carregado de mágoas pela noite anterior em que trocara sua lealdade pela liberdade do camponês. O que ele escolheria fazer com ela, para Eric era um mistério e talvez continuasse sendo. Doía. Assim como doía saber que, mesmo com seu coração fiel aos momentos que teve com o camponês, a cada hora que passava, o príncipe bastardo parecia ter um propósito justo em mantê-lo ali. Tinha contado sobre os rituais que precisariam ser feitos ao chegar no reino, contou sobre a coroa prateada que ele mesmo sonhara e como sozinho ele não saberia onde achá-la, tal qual os outros tesouros. Disse como tinha medo que Eric não controlasse seus poderes e se machucasse. "O castelo também esconde perigos, se acordados de qualquer jeito podem se tornar fatais" disse Sangyeon antes de se curvar minimamente perante Eric, "me perdoe por esse embate; espero que possamos colaborar. Nunca quis que se sentisse preso, então confie em mim com a verdade".

Após a conversa que tiveram ao lado do riacho, a expressão de Sangyeon não voltou a ser irascível, tampouco a sua voz. Os soldados ao redor o escutavam com respeito a cada ordem dele e deixaram de escoltar Eric como um prisioneiro, até devolveram-lhe uma das facas que usava para prosseguir na trilha. Entretanto, algo pairava no ar e o loiro não sabia o que era ao certo, mas vinha dos olhares tortos do braço direito do príncipe, o nobre também loiro, a quem chamavam de Jacob.

Ele olhava para Eric com desconfiança, e perguntava excessivamente sobre os poderes do garoto, mas sempre através de Sangyeon, nunca diretamente ao qareen. Depois das respostas frias do mais velho, Jacob permanecia a olhá-lo por alguns segundos com a expressão silenciosa, mas que gritava uma frustração que não podia ser comentada. A verdade era que o cavaleiro não entendia a calma repentina de Sangyeon, era como se tudo o que tirava o príncipe do sério de repente parasse de existir e ele virasse uma pessoa completamente diferente. Diferente do jovem insolente que fugia do palácio para passar tempo entre os soldados, que debochava daqueles de sua família enquanto bebiam juntos. A presença de Eric não resgatou o Sangyeon que tanto fazia falta para Jacob.

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