Capítulo 11

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-Então eles querem que vamos lá amanhã?-perguntou depois de lhe contar a conversa com o inspector.
-Sim, mas é melhor não lhes dizer nada porque...-ele interrompeu-me.
-...porque podem não ser os pais e criamos falsas expectativas...-disse meio desiludido. Claro que ele preferia que pudéssemos dizer que são coisas dos nossos pais, mas podem não ser.
-Sim, isso.-respondi.-Temos de ir lá de manhã.
-Sim, a avó fica com eles.-disse sentando-se na cama.
-Achas que há alguma probabilidade de serem coisas deles?-perguntei sentando-me ao lado dele.
-Não sei, espero bem que sim.-disse colocando um braço por cima dos meus ombros deixando-me encostar a ele.-Sabes, o trabalho dos pais é mesmo difícil.-disse suspirando.
-Sim, pois é.-respondi suspirando.-Não admira que estivessem sempre stressados...
-O mais impressionante de tudo é que até nem estavam.-disse fazendo um pequeno sorriso.
-Pois é! Como é que a mãe aguenta as birras do Pete quando é hora de ir para a cama?-perguntei como se não houvesse resposta.
-Ya, e quando a Vans tem aquelas crises de adolescente que ninguém a percebe!-exclamou esbugalhando os olhos.
-E termos de nos lembrar de os levar ao ginásio, ou à natação, ou até mesmo à escola!-exclamei. Sinto-me exausta só de enumerar tudo o que temos feito.
-E teres de fazer todas as refeições, limpar e arrumar tudo. Temos de nos lembrar de tudo!-exclamou. Ficámos em silêncio durante algum tempo.-Temos feito um bom trabalho...-murmurou sorrindo.
-Sim...-respondi sorrindo.-Ah olha a Vans tem um namorado. Antes que te ponhas com aquelas cenas, deixa-a trazê-lo cá a casa.-disse afastando-me dele para o puder olhar de frente.-Assim podemos ver se tens de te preocupar ou não.
-Um namorado? Ela tem quinze anos!-exclamou. Já sabia.
-E qual é o problema? É normal! Não quer dizer que vá desistir da escola por ele ou engravidar! Não vais fazer com ela o que fazias comigo!-exclamei levantando-me.
-Se calhar vou! Viste no que é que deu da última vez que tiveste um namorado...-murmurou.
-Mas qual é o problema das pessoas em lembrarem-me constantemente disso?-perguntei farta da mesma conversa.-Olha, lá porque eu fiz uma má escolha não quer dizer que ela também vá fazer! Deixa-a trazê-lo cá e depois vês se tens de te preocupar! Aposto cinco euros contigo que até tu vais gostar dele.-disse esticando a mão.
-Ok, ela que o traga cá, mas vais perder.-disse apertando-me a mão. Sorri-lhe e saí do quarto dele.
Caminhei até ao meu quarto onde a Savannah também dormia visto que os meus avós tinham ficado no quarto dela. Bati à porta e abri.
-Posso?-perguntei.
-O quarto é teu.-respondeu tirando os fones dos ouvidos.
-Ok...-respondi entrando fechando a porta. Quando me virei para lhe contar da minha conversa com o Keith, ela levantou-se de um salto da cama e veio a correr abraçar-me.-Uow, o que é que te deu?-perguntei.
-Obrigada, obrigada, obrigada!-exclamou apertando-me.
-O que é que foi?-perguntei.
-Eu ouvi-te a pedires ao Keith sobre o jantar.-respondeu com um grande sorriso.-Obrigada!-exclamou abraçando-me novamente.
-Ah isso, não há problema!-respondi preocupada.-Só ouviste isso?-perguntei.
-Sei lá, eu ouvi-te irritada e fui ver e ouvi-te a fazeres a aposta com ele. Depois fugi.-disse sorrindo. Afastou-se para voltar para o telemóvel.-Porquê? Devia ter ouvido mais alguma coisa?-perguntou olhando para o telemóvel.
-Ah não, só queria saber se tinhas percebido bem.-respondi alíviada, sentando-me na secretária.
-Está bem.-disse encolhendo os ombros.-E quando é que fazemos isso?-perguntou ela.
-Não sei, pergunta ao Keith.-respondi. Levantei-me para ir ajudar na cozinha.-Bem, liga lá ao rapaz e diz que pode vir cá. Ah e vai tomar banho!-disse fechando a porta atrás de mim. Caminhei pelo corredor até chegar à sala onde o Peter estava a ver desenhos animados.
-Então, já deste banho à casa toda?-perguntou-me o meu avô da poltrona.
-Porquê? Queres ser a seguir?-perguntei sentando-me no braço da poltrona ao lado dele.
-Não estou assim tão velho.-respondeu tirando os óculos de ler.
-O que é que estás a ler?-perguntei.
-Nada, só o jornal.-respondeu pegando no mesmo jornal que eu tinha comprado.
-O que é que achaste?-perguntei.
-O mesmo de sempre, desastres, futebol e política e as minhas palavras cruzadas.-respondeu.
-O sudoku é meu!-exclamou a minha avó da janela que ligava a sala à cozinha.
-Claro, Marion, todo teu!-exclamou ele.-Isto se eu não me fartar das palavras cruzadas.-sussurrou-me sorrindo. Ri-me com ele.
-Mas e sobre desastres, o que é que viste?-perguntei.
-Um massacre na Alemanha. Algo estranho. Não é um sítio normal para lançar uma bomba terrorista mas...-interrompi-o.
-Terrorista?-perguntei.
-Sim, muçulmanos.-respondeu.-Deu uma notícia na televisão à pouco tempo sobre isso. Até mostraram um vídeo a matarem um cristão e um judeu. Essa gente mal sabe viver e ainda estragam a vida das outras pessoas a imporem os seus costumes aos outros!-exclamou.
-Espera, esse vídeo tem a ver com isto?-perguntei.
-Sim, são os mesmos.-respondeu.-Não se percebe o que esta gente quer quando se põem a matar gente a torto e a direito!-exclamou indignado.
-Harold James Santos Amorim!-exclamou a minha avó até chegar ao pé de nós.-Isso são coisas de se dizer à frente dos teus netos?-exclamou indignada.
-Eles têm de saber em que mundo é que vivem.-respondeu pousando o jornal.
-É para isso que serve a escola!-exclamou.
-Não, a escola serve para lhes pôr na cabeça coisas que não servem para nada.-respondeu.
-Não digas disparates!-exclamou ela. Sempre foi uma mulher de costumes e tradições. Nunca na infância ou adolescência dela alguém podia falar mal da escola ou do mundo como se faz agora. Para ela continua a não ser algo que se deva fazer.
-Avô?-chamou o Peter levantando-se.-Isso quer dizer que não tenho de ir à escola?-perguntou ele. Eu e ele desatámo-nos a rir enquanto a minha avó levou a mão à cabeça.
-O que tu fazes homem!-exclamou ela.
-Vem cá, Pete.-disse fazendo-o sentar ao colo dele.-Quando eu disse aquilo não quis dizer que a escola não servisse para nada.-disse.-A escola é muito importante. Se não fosse a escola não aprendias tudo tão depressa. Daqui a uns tempos vais aprender a ler e escrever, depois vais aprender muitas coisas sobre animais e o nosso mundo, depois vais aprender outras línguas e vais chegar a um sítio onde tens de escolher o que queres fazer como a tua irmã. Ela decidiu estudar para puder ajudar as outras pessoas que estão doentes, o teu irmão ajuda a apagar os fogos e ajuda a salvar pessoas e um dia tu vais escolher o que gostares mais. Mas enquanto aprendes muita coisa, também te vão ensinar coisas que não vais precisar quando fores escolher mas vais ter de as estudar na mesma porque és avaliado mas tu só tens de estudar e depois esqueces, como eu, a avó, ou os teus irmão fizeram.
-Como é que eu sei quais é que são essas coisas?-perguntou.
-Vais perceber, não te preocupes.-disse sorrindo-lhe.
-O que é que tu escolheste, avô?-perguntou ele. Ele fez uma cara desiludida e abatida. Não queria responder.
-O avô não teve essa oportunidade para escolher.-respondi por ele.-Quando ele era da minha idade havia uma guerra e todos os rapazes fortes e saudáveis eram levados para lutar pelo país deles.
-Tu foste com eles?-perguntou ele.
-Sim.-respondeu ele. Eu sei o que lhe custa falar sobre os tempos de guerra. Ninguém devia sofrer o que ele sofreu.
-Então quer dizer que salvaste muitas pessoas!-disse com um grande sorriso.-És uma espécie de herói!-disse olhando para o boneco dele, o Iron Man.
-Eu tive ajuda de muita gente como eu.-respondeu.
-Ninguém pode salvar o mundo sozinho!-disse ele.-O Iron Man teve a ajuda da Miss Potts! O spiderman teve a ajuda do melhor amigo, e o quarteto fantástico e os incríveis são os melhores grupos de super heróis porque estão todos juntos.-respondeu. Não consegui evitar o sorriso. Nem o meu avô. Nem dei pelo crescimento dele. Eu tenho a certeza que não pensava como ele quando tinha a idade dele. Nenhum de nós pensava. É mesmo esperto.
-Tens razão.-disse o meu avô.-Corre sempre tudo melhor quando estamos em grupo.-disse sorrindo.
-Por falar em ajuda, venham pôr a mesa.-disse a minha avó virando-se.
-Boa, tou cheio de fome!-exclamou o Pete saltando do colo do meu avô.
-Desde quando é que este miúdo está tão esperto?-perguntou-me o meu avô quando o Peter já estava na cozinha.
-Não sei, nós temos notado nisso. Acho que esta mudança fez com que as pessoas se esquecessem dele e teve de se habituar a crescer sozinho.-respondi.-Tenho pensado muito nisso e ele foi o mais prejudicado. Teve um ano da vida dele completamente ignorado. Ninguém se apercebeu do crescimento dele, agora que temos de tomar conta dele é que damos pela diferença.-respondi levantando-me.
-Olha quem fala, também estás crescidinha com essas palavras todas importantes.-disse rindo-se. Levantou-se, pousando os óculos e o jornal.-Nunca deixes de ser assim.-disse sorrindo-me. Fomos ambos para a cozinha, onde a mesa estava praticamente posta.
-Chama os teus irmãos.-disse-me a minha avó.
-Ok.-respondi saindo da cozinha. Fui até à sala, espreitei para o corredor e certifiquei-me que a minha avó não me via.-Para a mesa!!-exclamei para o corredor. Não me apetecia ter de os ir chamara para depois não virem. Assim sabem que têm de vir para a mesa. Mas ninguém apareceu. Irritou-me.-Keith! Anda para a mesa!-exclamei batendo na porta dele.
-Epá, mas qual é o teu problema?-perguntou ele abrindo a porta com o telemóvel encostado à orelha direita.
-Nenhum, a avó está a chamar.-respondi.
-E não podes vir dizer como uma pessoa normal?-perguntou irritado.
-Não vinhas se te chamasse assim!-exclamei encaminhando-me para a porta do meu quarto.
-Vai-te lixar, pareces mesmo a mãe...-murmurou entrando no quarto.-Não, era a minha irmã...-ouvi-o dizer ao telemóvel até fechar a porta. Fui até ao meu quarto.
-Vans!-exclamei batendo à porta. Ninguém veio abrir. Quero lá saber, é o meu quarto eu vou entrar visto que tenho razão para estar irritada. Abri a porta.-Mas olha lá tu não me ouviste a...-calei-me ao ver que ela não estava no quarto. Fui até à casa de banho mas também não estava.-Vans?-exclamei para toda a casa ouvir. Fui até ao quarto do Keith.-Keith?-exclamei batendo na porta.-Abre a porta a sério!-exclamei.
-Epá, já te disse para esperares!-exclamou irritado ao abrir a porta. Vi a expressão de irritado dele mudar para preocupado.-O que é que foi?-perguntou.
-Não encontro a Savannah.-respondi assustada.
-O quê?-perguntou arregalando os olhos levando o telemóvel ao ouvido.-Olha eu já te ligo. Até já.-disse isto e desligou o telemóvel.-O que é que isso quer dizer?-perguntou.
-Não sei...ela não está no quarto, nem na casa de banho e não responde se a chamar.-respondi.
-Não está na garagem.-disse a minha avó aparecendo.
-Nem no jardim.-disse o meu avô.
-Onde é que ela se meteu?-perguntou o Keith.
Fui até à sala e sentei-me no sofá. Onde é que ela foi? A casa não é suficientemente grande para estarmos desencontrados. Ela respondia se a chamássemos. E se alguém a raptou? Pode ter acontecido, somos muitos, fazemos barulho. Mas ninguém podia ter entrado em casa sem ser visto. Só pode ter fugido. É a única e mais provável opção.
Levantei-me e fui até ao meu quarto. Olhei pela janela. Estava fechada, trancada até. Fui até ao quarto dela puxei a janela mas também estava trancada. O Keith estava no quarto dele e a janela do quarto do Pete não dá para abrir. Por onde é que ela saiu?
-Vals, o que é que foi?-perguntou-me o Keith segurando-me o braço.
-Ela fugiu.-respondi.
-Já deu para perceber.-respondeu.
-Não, ela fugiu mas com ajuda.-respondi.
-Hã?-perguntou confuso.
-Então, ela queria sair mas se deixasse a janela destrancada sabíamos logo que ela tinha fugido. Mas se todas as janelas ficassem trancadas, íamos ficar montes de tempo a pensar no que lhe tinha acontecido e ela acabava por ter tempo de voltar e dizer que estava no jardim.
-Como é que sabes?-perguntou-me a minha avó.
-Porque era o que eu fazia...-respondi.
-E como é que ela trancou a janela?-perguntou o Keith.
-Com ajuda...-respondi olhando para o Peter desiludida. Olharam todos surpreendidos para ele.
-Eu não...ela...ela disse que ia só comprar uma coisa.-respondeu assustado.
-O que é que ela te deu?-perguntei.
-Disse que me comprava um super herói novo.-respondeu.
-Muito esperta...-murmurou o meu avô com um pequeno sorriso.
-Fui mesmo um bom exemplo para ela...-murmurei sentando-me no sofá. Ninguém disse nada. Claro que não, era verdade. Tudo o que ela fez aprendeu comigo. Sou mesmo o exemplo a seguir...
-O que é que lhe costumavas dar para ela não contar nada?-perguntou a minha avó.
-Cinco euros...-respondi.-Mas ela foi crescendo e aprendeu a negociar e fui arranjando asneiras que ela fazia e dizia que ia contar aos pais...-respondi envergonhada.
-Nunca te apanharam?-perguntou ela.
-Nunca...-respondi.-Pelo menos dessa maneira.-suspirei e sentaram-se todos no sofá. O meu avô tirou o som da televisão e o Pete sentou-se no chão à minha frente.
-Bem, o que é que fazemos agora?-perguntou o Keith.
-Nada.-respondi.


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