Capítulo 18

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Logo ao alvorecer nós duas nos dirigimos a uma pequena capela no claustro, as duas de túnica de noviça. Lá deveríamos passar o dia todo em reclusão e oração silenciosa.

Não existiam mais palavras a serem trocadas, nosso vínculo estava estabelecido. Após a cerimônia seríamos realmente irmãs para todo o sempre. Eu me sentia extremamente grata por ela ter me escolhido.

Segundo eu tinha lido no libreto escrito pela irmã Brígida, durante a reclusão eu deveria avaliar o meu caminho até aquele momento, assumir as minhas falhas e pedir perdão com sinceridade por cada uma delas.

Deveria também despir-me definitivamente de tudo o que me ligasse ao meu passado fora do convento e buscar a paz no entendimento de que a partir daquele momento eu seria outra pessoa.

O dia transcorreu sem sobressaltos na pequena capela isolada de tudo. Nem mesmo os cânticos das orações, que normalmente faziam o convento inteiro vibrar, eram audíveis naquele lugar.

Ao entardecer, as anciãs que tinham feito a inspeção da minha virtude vieram à capela acompanhadas da Matriarca.

Dessa vez não teria espanto nem resistência, eu sabia o que devia ser feito. No canto da capela, havia uma cadeira cerimonial com apoios para as pernas. Me dirigi até a cadeira e me sentei, aguardando que a Matriarca me desse a ordem para prosseguir.

- Abra as pernas.

Abri as pernas e apoiei nos suportes, inclinando o corpo para trás e deixando o caminho livre para que as anciãs fizessem o serviço.

Uma a uma, elas inspecionaram a minha virtude novamente para garantir que eu me mantinha intacta. Depois da última, a Matriarca veio completar a inspeção e dar o veredito final sobre a minha virtude.

- Está intacta.

Todas as irmãs presentes concordaram e eu fui declarada apta para ser ordenada.

Seguimos todas para uma porta nos fundos da capela. A Matriarca na frente, eu e a irmã Brígida lado a lado de mãos dadas e as anciãs em fila atrás. Eu levava na mão o libreto onde meu novo nome seria escrito.

Seguimos por um longo corredor até chegar a um vestíbulo com grandes portas de madeira ricamente entalhadas. Do outro lado daquelas portas ficava a cripta, Um grande salão abobadado que só era usado nas cerimônias de ordenação.

Antes de entrarmos, todas deveríamos deixar as roupas no vestíbulo e desfazer as tranças. Na cripta só deveria entrar a essência mais pura de cada uma, despida de tudo inclusive de roupas.

Eu sabia que entraríamos nuas, mas fui pega de surpresa pela descoberta de que todas as irmãs tinham o corpo coberto de desenhos.

A cripta era um aposento abobadado sem colunas que tinha duas fileiras inclinadas de bancos em um dos lados, com uma pesada mesa de madeira e duas cadeiras entre elas. Fora isso era um grande espaço livre.

Eu e minha madrinha nos ajoelhamos lado a lado, ainda de mãos dadas, de frente para a mesa. As anciãs tomaram seus lugares no coro e a Matriarca sentou em uma das cadeiras.

Uma a uma, todas as irmãs ordenadas do convento entraram na cripta e foram tomando seus lugares no coro. Todas nuas e com os cabelos soltos, todas com o corpo coberto de desenhos, umas mais e outras menos, mas todas tinham pelo menos alguns.

A última a entrar foi a Senhora das Iluminuras, coberta de desenhos até no rosto e na cabeça raspada. Ela se posicionou de pé, ao lado da irmã Brígida.

Meu coração estava a ponto de explodir. Nem se eu tivesse feito uma semana de vigília orando e refletindo eu seria capaz de controlar a minha emoção naquele momento.

Eu iria passar pela maior de todas as provações. Mesmo sabendo que tinha uma irmã disposta a compartilhá-la comigo, eu não sabia se seria capaz de ir até o fim.

Seguiram momentos de silêncio que pareceram intermináveis, até que a voz, que vibrava dentro de mim desde o primeiro dia que eu ouvi, levantou-se para dar inicio a cerimônia.

- Quem se apresenta para conduzir a noviça pelo caminho da ordenação?

- Eu, irmã Brígida.

Apertei mais forte a mão da mulher que estava disposta a fazer o caminho comigo e senti um aperto de volta. Irmãs agora, mais do que nunca.

A Matriarca levantou-se da mesa e veio em minha direção. Cada passo dela parecia ressoar dentro de mim.

- A senhorita está ciente do caminho que deve trilhar e do compromisso vitalício que está prestes a assumir?

- Sim Senhora.

- É de livre e espontânea vontade que a senhorita trilha esse caminho?

- Sim Senhora.

- Entregue seu libreto.

Ao entregar o libreto eu definitivamente coloquei nas mãos da Matriarca o poder de me transformar em outra pessoa. Ao fim da cerimônia, eu seria rebatizada com o nome que ela escolhesse e teria esse nome registrado no libreto e marcado no meu pulso.

A Guardiã da VirtudeOnde histórias criam vida. Descubra agora