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Kyle

A aula de educação física era, na minha opinião, a melhor. Jogávamos quase sempre futebol, e eu acho que o facto de eu ser o capitão da equipa da escola já explicava o resto.

– Despacha-te, princesa! – Ouvi o William chamar-me e revirei os olhos. Ele era também da minha equipa de futebol, e ele e o resto do grupo eram o mais próximo que eu tinha de amigos. Então só me restava integrar-me.

– Estou a ir. – Respondi, arrumando os meus cabelos. – E mesmo que eu me despache, o resto do pessoal ainda não está pronto.

– Vocês são todos umas Cinderelas. Isso é que é. – Gozou o William, e eu ri.

– Tens razão. – Juntou-se o Harry à conversa. – Principalmente ali o Kyle.

– Eu? – Ergui uma sobrancelha. – As miúdas não costumam dizer isso.

– Opa! O leão está a sair da jaula.

– Está calado, William. Já comi quase todas daqui. – Disse irónico. – Já tu... Acho que a Cinderela aqui não sou eu.

Eles riram, e o Jacob juntou-se também ao grupo, enquanto calçava as sapatilhas.

– Consegui sentir o cheiro a aposta a quilómetros de distância. – Disse na brincadeira. – O que é desta vez?

– Aqui o Kyle está a dizer que já comeu quase todas. – O William cruzou os braços e ergueu uma sobrancelha. Eu revirei os olhos mentalmente, já prevendo que só ia sair merda daquela boca. – Mas... Eu digo que ele não consegue comer a Zoe Benson.

Fiquei espantado. Nunca tinha reparado na Zoe. Ela era da minha turma, mas era demasiado estranha. Andava sempre sozinha e usava roupas estranhas também.

– A da minha turma? – Perguntei, ainda surpreso.

– Yep. – Confirmou o William. – Aposto que essa não consegues comer.

– A sério, Will. Isso é só estúpido. Além disso eu nem falo com a miúda. Já para não falar que ela é muito estranha. – Arregalei os olhos só de pensar em falar com ela.

– Eu sabia que não eras capaz. – Picou o William, enquanto o Harry se ria e o Jacob sorria irónico para mim.

Bufei.

– Tudo bem. – Ergui uma sobrancelha e sorri. – O que é que eu ganho em troca?

Ele encolheu os ombros.

– Uma boa reputação dentro do grupo. Também te pago bebidas durante 2 meses. À tua escolha. Se perderes, para além de provares que eu tenho razão, tens que me pagar a mim as bebidas.

O Harry e o Jacob olharam esperançosos para mim, e eu encolhi os ombros, derrotado. Era uma idiotice. Mas precisava de reputação para manter o meu estatuto elevado. E, tal como disse, era a única forma de continuar com um bom status dentro do colégio e de ter amigos.

– Tudo bem. Apostado.

– Agora despachem-se! – Exigiu o Jacob. – Ainda quero ver as miúdas da claque a treinarem!

Zoe

Uma das coisas que eu mais gostava daquela escola era os espaços verdes. Era sempre agradável passar os intervalos debaixo da sombra das árvores.

Estava a adiantar trabalhos de matemática. Precisava de ter boas notas para continuar a ter direito à bolsa de estudos que me permitia estar naquele colégio tão caro. Eu morava apenas com a minha mãe e tínhamos que viver com o que tínhamos, e graças às minhas boas notas consegui uma bolsa para um dos colégios mais caros de Londres.

Estava a tentar focar-me nos exercícios quando ouvi gargalhadas masculinas. Ergui o olhar e vi o grupo maravilha descer as escadas do pavilhão de educação física: William, Jacob, Harry e Kyle. O Kyle era sem dúvida o que mais brilhava na escola. Capitão da equipa de futebol e bonito. Tinha todas as raparigas à sua volta.

Imediatamente baixei o olhar novamente para o meu caderno quando o olhar dele se encontrou com o meu, e corei. Sempre estive na turma dele, mas ele nunca reparou em mim, e eu também não fazia por isso.

Preferia ficar sempre no meu canto. Sozinha. Os adolescentes dali achavam-me estranha, e sempre fui posta de lado por causa de não ser tão economicamente priveligiada como eles. Nunca me importei muito com isso.

Rapidamente despertei do meu devaneio com o toque de entrada. Arrumei os meus cadernos na minha mochila e dirigi-me para a sala.

Senti um encontrão no ombro e suspirei, já sabendo quem tinha batido contra mim de propósito.

– Vê por onde andas, estranha. – Madison. Talvez a pessoa mais irritante à face da terra.

– Tu é que devias de ver por onde andas. – Respondi, sorrindo. – Qualquer dia ainda tropeças. E olha que ainda é uma queda boa. – Disse, referindo-me ao tacão agulha dos saltos dela. Não sabia como é que ela conseguia aguentar o dia todo em cima daquilo.

Ela gargalhou.

– Tu afinal falas! – Gozou ela.

– Uaaau! Tu afinal pensas! – Sorri mais, ironicamente. – Não canses muito o cérebro, Madison! Ainda é de manhã!

Virei-lhe as costas, deixando-a a falar sozinha e segui para o meu lugar. Normalmente sentava-me na fila da frente porque se tornava mais fácil tirar apontamentos, uma vez que no fundo da sala era festa todo o dia.

– Ora muito bem! Bom dia! – Cumprimentou a professora de biologia, que entrou seguida do Kyle. Ele era o único do grupo de amigos dele que era da minha turma. – Hoje preciso que estejam muito atentos porque no fim da aula vou propor um trabalho de pares sobre este assunto.

Eu já sabia que o faria sozinha. Os professores sabiam que eu era muito solitária, e como nunca ninguém se voluntariava para ficar comigo, eles acabavam sempre por me arranjarem uma exceção.

Apontei tudo o que pude no caderno. A matéria era muito fácil, portanto o trabalho seria simples.

– Muito bem! – Terminou a professora. – Vou deixar que formem os vossos pares livremente. Podem sentar-se com o vosso parceiro para que eu possa anotar os nomes. Lembrando que são grupos de 2 elementos!

Suspirei e comecei a ler a matéria no manual, sublinhando e comparando com o que tinha anotado para começar o trabalho. Congelei quando ouvi o som da cadeira ao meu lado arrastar.

– Hey. – Fiquei pasma ao ver o Kyle ao meu lado. – Não tenho par... Fazes comigo?

Franzi o sobrolho, estranhando a atitude dele.

– Tu não tens par? Tu tens sempre par.

Ele encolheu os ombros e encostou-se na cadeira.

– São grupos de 2. E sei lá... Gostava de fazer contigo. Pareces simpática!

– Ok... – Concluí, tentando não dar muita importância. Era só um trabalho. Estava quase na hora do toque, então comecei a arrumar o meu material. – Se quiseres podemos fazer amanhã. Podes vir até minha casa depois das aulas.

– Combinado! – Ele estendeu-me um papel com um número. – É o meu número de telemóvel. Depois manda-me a morada!

Assenti apenas com a cabeça e saí da sala, deixando-o para trás. Ainda achava estranho a aproximação repentina dele.

À porta a Madison lançou-me um olhar de ódio, ao qual eu retribuí. Ela sempre teve uma paixão platónica pelo Kyle, e não fazia questão de o esconder de ninguém.

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