𝐂𝐚𝐩𝐢𝐭𝐮𝐥𝐨 - 𝟏𝟗

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Quando cheguei ao tribunal, vi Will Cash de relance. A nuca aqui, o braço do terno ali, um perfil fugaz. No início, foi frustrante e me deixou ainda mais nervosa, mas conforme a hora em que eu seria chamada foi se aproximando, comecei a achar que era uma coisa boa. Peças e partes eram sempre mais fáceis de processar. A imagem toda, a história inteira, era outra coisa. Mas nunca se sabe. Às vezes as pessoas podem nos surpreender.

Contar à minha família tinha sido mais difícil do que contar ao Jung-kook. Mas eu conseguira. Mesmo nas partes mais difíceis, quando ouvia minha mãe perder o ar, via os olhos do meu pai se contraindo, sentia Kirsten tremer ao meu lado, segui em frente. E, quando achava que ia fraquejar, focava em Whitney, que não recuou nem uma vez. Era a mais forte de nós, e mantive os olhos nela até o fim.

Mas minha mãe foi quem mais me surpreendeu. Ela não desmoronou ou fraquejou, embora eu soubesse que ouvir o que tinha acontecido comigo não podia ser fácil para ela. Enquanto Kirsten chorava e Whitney ajudava meu pai a encontrar o cartão de Andrea Thomlinson no meu quarto para que pudesse ligar para ela e saber mais detalhes, minha mãe sentou ao meu lado, pôs o braço em volta do meu ombro e ficou passando a mão na minha cabeça, de novo e de novo.

Naquela manhã, a caminho do tribunal, sentei no banco de trás entre minhas irmãs, olhando para meus pais. De vez em quando, o ombro da minha mãe se mexia, e eu sabia que ela estava estendendo a mão para acariciar a do meu pai, como ele tinha feito com ela outro dia, quando segredos começaram a ser revelados, pouco tempo antes.

Toda a minha vida eu tinha visto meus pais de uma única forma, como se eles só pudessem ser daquele jeito. Um fraco, o outro forte. Um assustado, o outro corajoso. Mas eu estava começando a entender que nada era absoluto, nem na vida nem nas pessoas. Como Jung-kook dissera, era preciso viver um dia de cada vez, senão um momento de cada vez. Tudo o que podíamos fazer era pegar o maior peso que éramos capazes de carregar. E, se tivéssemos sorte, alguém estaria perto o suficiente para ajudar com o resto.

Quando chegamos ao tribunal, eram quase quinze para as nove. Examinei a multidão na praça da fonte procurando por Jung-kook. Ele não estava lá. Não naquele momento, nem depois que minha mãe e eu encontramos Andrea Thomlinson em um escritório ali perto para repassar minha história mais uma vez. Nem mesmo quando o tribunal abriu e entramos, tomando nossos lugares atrás da Momo e da mãe dela. Continuei procurando por Jung-kook, achando que ele chegaria no último minuto, bem na hora, o que não aconteceu. Não era do feitio dele, e fiquei preocupada.

Uma hora e meia depois, o promotor chamou meu nome. Levantei, passando pelas minhas irmãs até chegar ao fim do banco. Então saí sozinha para o corredor.

Quando avancei, finalmente tive uma visão clara de tudo — a multidão, o juiz, os promotores e advogados de defesa —, e procurei me concentrar no oficial de justiça, que estava esperando por mim lá na frente. Tomei meu lugar, sentindo o coração bater mais rápido quando respondi suas perguntas e o juiz virou e me cumprimentou. Só depois que o promotor levantou e veio na minha direção finalmente me permiti olhar para Will Cash.

Não foi o terno elegante que percebi primeiro. Nem o novo corte de cabelo, bem curto, fazendo com que parecesse um garotinho inocente, o que provavelmente era intencional. Dei pouca atenção à expressão dele — olhos estreitos, lábios franzidos. A única coisa que vi foi o roxo em volta de seu olho esquerdo e o vermelho na bochecha embaixo. Alguém tinha tentado cobrir com maquiagem, mas ainda estavam ali. Claro como o dia.

— Por favor, diga seu nome completo — o promotor pediu.

— Annabel Greene — eu disse, com a voz vacilante.

— Você conhece William Cash?

— Sim.

— Pode apontá-lo, por favor?

𝐒𝐨́ 𝐄𝐬𝐜𝐮𝐭𝐞... • 𝐋𝐢𝐳𝐤𝐨𝐨𝐤Onde histórias criam vida. Descubra agora